Janeiro já se encerra
e deixa marcas profundas no corpo de uma Democracia que padece amordaçada
nestas plagas, memórias inglórias de um país sublevado por tribos que
desconhecem o que seja o agir civilizado!
Mas nem só de
lembranças funestas vive o homem, como também de toda a jubilosa reminiscência que,
sob a mirada reversa de um Jano, restou esculpida na face da terra, fazendo
eclodir eflúvios poéticos no talhe de um soneto com versos juncados por toda a
amplidão da página, a celebrarem a linguagem pela via de rodeios lúbricos
direcionados à imaginação do leitor.
Num arranjo encantatório
suscitado pela aura de uma “deusa” – como Afrodite ou Vênus –, o poeta junge a trama
da palavra à textura dos elementos naturais à volta, de onde, pela apreensão do
ingênito e do indômito que a tudo abarca, põe-nos a conjecturar sobre os reflexos
palpáveis do que se suspeita projetar ao espelho: beleza, sedução, desejo e volúpia.
J.A.R. – H.C.
Geraldo Reis
(n. 1949)
Naquele Janeiro
Naquele janeiro as
centopeias seriam silenciadas pela chuva
E carreadas até o
primitivo desenho de teu corpo na pedra.
Naquele janeiro, as
águas repetiriam teu nome no tropel dos cavalos
E o relâmpago
recortaria nas grotas o caminho de teu seio.
Naquele janeiro
habitarias para sempre o coração das águas
Entre musgo, lianas,
serpentes e beijos.
Naquele janeiro
dariam teu corpo como desterrado para sempre
E o barulho de teu
sono anunciaria a instalação do caos na paisagem.
Naquele janeiro as
vinhas seriam pisoteadas pelo gado
E as uvas encurtariam
a embriaguez antiga
Do vinho derramado
pela mão que repetiu teu gesto.
Naquele janeiro,
deusa, tendo-se por dissipado na bruma o estampido
Seríamos
surpreendidos pelo teu nome na velha folha de malva
E boiaríamos para
sempre, órfãos de tua boca, de tua face, mãos e atropelos.
Perseverança
(Jennifer Healy: ilustradora
norte-americana)
Referência:
REIS, Geraldo.
Naquele janeiro. Disponível neste endereço. Acesso em: 31 jan. 2023.
❁
São 23:14 minutos do dia seis de fevereiro de 2023. Acabo de fazer acesso ao BLOG DO CARTORP e depois de ler os registros críticos inseridos no blog sobre a MONTANHA MÁGICA, de Tomas Mann, e do poema a ele dedicado (belíssimo poema, aliás), tenho a noção de que nem tudo está perdido. Há uma esperança de melhores dias para o homem enquanto SER SENSÍVEL. Depois, passeando pelo blog, eu, "irmão menor das águas, irmão menor de todos os rios do mundo", encontro, como desejava, meu presente de Natal e Ano Novo, a publicação no blog do poema NAQUELE JANEIRO. Vou dormir como a criança que recebe um presente de Natal. João A. Rodrigues, sob o signo da emoção é que agradeço o destaque. A nota de leitura vai além, abre os horizontes de uma interpretação que dilacera as entranhas do poema e suscita "novos encantamentos". Registro a emoção desse instante! Depois de ler três ou quatro vezes a nota, estou me sentindo eternizado. Estou à deriva nesse mar de encantamento! Um brinde à vida, irmão! Com esse prêmio e com esse destaque, tenho a impressão de ter contribuído de alguma forma para aplacar a ira dos deuses. Haverá, sem dúvida, melhores dias para a Poesia e para o Homem enquanto Ser Sensível. Em verdade, resta a certeza de tenho muito a aprender. "Pra frente é que se anda", SIM, ainda chego lá. O meu sincero e emocionado muito obrigado. Deus lhe pague esse carinho e essa emoção!
ResponderExcluirFaltou dizer, com PERSEVERANÇA ainda chego lá(refiro-me à belíssima ilustração de Jennifer Healy) . Enfim, é isso. "Pra frente é que se anda"... É áspero, é longo, e é espinhoso o caminho da Poesia.
ResponderExcluirLinda poesía Parabens que Deus te abencoe e proteja sempre abracos
ResponderExcluirMeu primo de coração, mui querido, parabéns, pelo belo poema! Como sempre você muito nos enriquece com seus belos poemas. Naquele janeiro, muito me encantou. Obrigada pela rica poesia.
ResponderExcluirPoesia vem do fundo do coração, talvez individual, talvez ilumine poucos de uma grande nação . Abrcs Tio Gê de J.
ResponderExcluirEis-me aqui, primo, a deliciar-me com seus versos, com sua poesia, que sempre me deixaram encantado, desde o nosso tempo de Rua Barão de Camargos (Rua dos Cortes) e Rua do Campinho (Rua Bicentenário até hoje. Abraços!.
ResponderExcluirPoeta excepcional, um alquimista das palavras. Mistura o cotidiano com o trancedental, o concreto com o etéreo. Merece destaque! Geraldo Reis deve ser lembrado sempre que se falar da boa poesia mineira de ontem é de hoje. sua poesia temgenuínas raizes de Minas. Parabéns ao blog.
ResponderExcluirUai, lembraram de mim? Que coisa. Toda essa manifestação gratuita me dá força para prosseguir. A viagem não tem fim. Abraço poético e meu muito obrigado ao leito anônimo e ao autor do blog tão qualificado e campeão. Muita generosidade. Farei por merecer. Juro.
ExcluirParabéns Geraldo! Revi meu colega do ginasial, no Dom Frei Manoel da Cruz, não nos janeiros, mas nos fevereiros, início das aulas, na década de 60. Como imaginaria, no futuro ,tão sensível e grandioso poeta!
ResponderExcluirObrigado, amigo. Conclui o antigo ginasial do Dom Frei em 1966. Na época foram distribuídos exemplares poema A DESPEDIDA que falei aí, emocionado. O professor Cónego José Geraldo Vidigal de Carvalho, das Academias Marianense e da Mineira de Letras, mandou imprimir. Mas, deixa seu nome aí na mensagem, amigo. Inté!
ExcluirParabéns poeta pelo belo poema!
ResponderExcluirAh, os anônimos! Eu me delicio com todos os leitores e com os comentários. E esses "anônimos" me intrigam. Quem serão? De onde acessaram e leram?Que tradução tiveram da leitura? A eles, muito obrigado e o coração sensível. Ao qualificado sítio e ad destacado "criador de conteúdo", JOÃO A. RODRIGUES, com renovado apreço, nosso melhor abraço poético. (BH 27 AGOSTO 2024)
ExcluirParabéns amigo, onde o coração fala, a boca se cala, lindo amei sucesso sempre
ResponderExcluirPois é! Mas esse comentário anônimo é de quem mesmo? Os anônimos são meus irmãos de alma. Muito obrigado pela visita ao blog, essa página campeã!
ResponderExcluirCaro Geraldo Reis, nobilissimo poeta, meus aplausos pela sua, sempre notória, competência.
ResponderExcluirAbs
Aloísio, irmão de alma. Companheiro de muitas jornadas, "Comandante em Chefe", anos 80, Caixa Econômica Federal, Agência Padre Eustáquio, hoje em Araxá, curtindo merecida aposentadoria junto à família maravilhosa. Obrigado, amigo.
ResponderExcluir