Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

Li-Young Lee - Comendo Sozinho

Enquanto colhe cebolas num horto, para preparar uma refeição, o ente lírico lembra-se enternecidamente do falecido pai e de alguns eventos que se lhe associam, passados nos interstícios dessa vida bucólica, junto à natureza, colhendo de seus frutos, vivendo de suas dádivas: a solidão, nesse meio- tempo, é o elemento voraz a ser deduzido das palavras do poeta.

 

Como dizem os estoicos, o que devemos buscar não é a superação da morte, mas a maneira como pensamos a respeito dela. E não só de repastos há de viver o ser humano, porque muito mais está à espera de um jovem como o falante: ilimitáveis são as circunstâncias, idem as atividades mentais. Em todo caso, em vez de se olhar para o que já passou, melhor seria perseguir aquilo que está no porvir.

 

J.A.R. – H.C.

 

Li-Young Lee

(n. 1957)

 

Eating Alone

 

I’ve pulled the last of the year’s young onions.

The garden is bare now. The ground is cold,

brown and old. What is left of the day flames

in the maples at the corner of my

eye. I turn, a cardinal vanishes.

By the cellar door, I wash the onions,

then drink from the icy metal spigot.

 

Once, years back, I walked beside my father

among the windfall pears. I can’t recall

our words. We may have strolled in silence. But

I still see him bend that way-left hand braced

on knee, creaky-to lift and hold to my

eye a rotten pear. In it, a hornet

spun crazily, glazed in slow, glistening juice.

 

It was my father I saw this morning

waving to me from the trees. I almost

called to him, until I came close enough

to see the shovel, leaning where I had

left it, in the flickering, deep green shade.

 

White rice steaming, almost done. Sweet green peas

fried in onions. Shrimp braised in sesame

oil and garlic. And my own loneliness.

What more could I, a young man, want.

 

Mesa para um

(Joseph Lorusso: artista norte-americano)

 

Comendo Sozinho

 

Extraí as últimas cebolas do ano ainda tenras.

O jardim está agora despido. Frio está o solo,

pardo e envelhecido. O que resta do dia flameja

nos bordos pelo canto de meu

olho. Viro-me, um cardeal desaparece.

Junto à porta do porão, lavo as cebolas,

depois bebo da gelada bica de metal.

 

Certa vez, anos atrás, caminhei ao lado de meu pai

entre as peras caídas das árvores. Não consigo me lembrar

de nossas palavras. Podemos ter caminhado em silêncio. Mas

ainda o vejo inclinado assim, com a mão esquerda apoiada

no joelho, estalando para levantar e manter

diante de meus olhos uma pera apodrecida. Nela, uma vespa

girava loucamente, cristalizada em sumo moroso e reluzente.

 

Era o meu pai que avistei esta manhã,

acenando para mim das árvores. Quase o

chamei, até que cheguei perto o suficiente

para ver a pá, encostada onde eu a havia

deixado, na sombra tremulante e de intenso verde.

 

Arroz branco fumegante, quase pronto. Doces ervilhas verdes

fritas com cebolas. Camarão refogado em óleo

de gergelim e alho. E minha própria solidão.

O que mais eu, um jovem, poderia querer?!

 

Referência:

 

LEE, Li-Young. Eating alone. In: BAYM, Nina (Ed.). The norton anthology: american literature. Vol. E: literature since 1945. 8th edition. New York, NY; London, EN: W. W. Norton & Company, 2012. p. 1169.

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