Enquanto colhe
cebolas num horto, para preparar uma refeição, o ente lírico lembra-se
enternecidamente do falecido pai e de alguns eventos que se lhe associam,
passados nos interstícios dessa vida bucólica, junto à natureza, colhendo de
seus frutos, vivendo de suas dádivas: a solidão, nesse meio- tempo, é o elemento
voraz a ser deduzido das palavras do poeta.
Como dizem os estoicos,
o que devemos buscar não é a superação da morte, mas a maneira como pensamos a
respeito dela. E não só de repastos há de viver o ser humano, porque muito mais
está à espera de um jovem como o falante: ilimitáveis são as circunstâncias,
idem as atividades mentais. Em todo caso, em vez de se olhar para o que já
passou, melhor seria perseguir aquilo que está no porvir.
J.A.R. – H.C.
Li-Young Lee
(n. 1957)
Eating Alone
I’ve pulled the last
of the year’s young onions.
The garden is bare
now. The ground is cold,
brown and old. What
is left of the day flames
in the maples at the
corner of my
eye. I turn, a
cardinal vanishes.
By the cellar door, I
wash the onions,
then drink from the
icy metal spigot.
Once, years back, I
walked beside my father
among the windfall
pears. I can’t recall
our words. We may
have strolled in silence. But
I still see him bend
that way-left hand braced
on knee, creaky-to
lift and hold to my
eye a rotten pear. In
it, a hornet
spun crazily, glazed
in slow, glistening juice.
It was my father I
saw this morning
waving to me from the
trees. I almost
called to him, until
I came close enough
to see the shovel,
leaning where I had
left it, in the
flickering, deep green shade.
White rice steaming,
almost done. Sweet green peas
fried in onions.
Shrimp braised in sesame
oil and garlic. And
my own loneliness.
What more could I, a
young man, want.
Mesa para um
(Joseph Lorusso:
artista norte-americano)
Comendo Sozinho
Extraí as últimas
cebolas do ano ainda tenras.
O jardim está agora
despido. Frio está o solo,
pardo e envelhecido.
O que resta do dia flameja
nos bordos pelo canto
de meu
olho. Viro-me, um
cardeal desaparece.
Junto à porta do
porão, lavo as cebolas,
depois bebo da gelada
bica de metal.
Certa vez, anos atrás,
caminhei ao lado de meu pai
entre as peras caídas
das árvores. Não consigo me lembrar
de nossas palavras.
Podemos ter caminhado em silêncio. Mas
ainda o vejo
inclinado assim, com a mão esquerda apoiada
no joelho, estalando para
levantar e manter
diante de meus olhos
uma pera apodrecida. Nela, uma vespa
girava loucamente, cristalizada
em sumo moroso e reluzente.
Era o meu pai que
avistei esta manhã,
acenando para mim das
árvores. Quase o
chamei, até que
cheguei perto o suficiente
para ver a pá,
encostada onde eu a havia
deixado, na sombra tremulante
e de intenso verde.
Arroz branco
fumegante, quase pronto. Doces ervilhas verdes
fritas com cebolas.
Camarão refogado em óleo
de gergelim e alho. E
minha própria solidão.
O que mais eu, um
jovem, poderia querer?!
Referência:
LEE, Li-Young. Eating
alone. In: BAYM, Nina (Ed.). The norton anthology: american literature.
Vol. E: literature since 1945. 8th edition. New York, NY; London, EN: W. W. Norton
& Company, 2012. p. 1169.
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