Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 31 de outubro de 2023

Alceu Brito Corrêa - O Poema

A voz lírica, nestes versos, é a do próprio poema, às voltas com o dilema de se autoidentificar, de se nomear, de dizer em que consiste. Explico-me melhor: parece-me menos que seja a fala do poema em si, do elemento gráfico sobre a folha, senão o que se incorpora às linhas, a “substância” de que é composto, vale dizer, a poesia.

 

A “máscara” a que alude o poeta possui infinitas feições – das clássicas às modernistas, das mais atreladas a regras às desamarradas de quaisquer estatutos. E claro: nem sempre o poema surge espargindo pelos ares o vermelho do estrôncio – como “a Rosa de Hiroshima, vermelha e fatal” –, sendo este apenas um dos muitos teores do poema de “n” faces.

 

J.A.R. – H.C.

 

Alceu Brito Corrêa

(n. 1946)

 

O Poema

 

a Mário Quintana

a Manuel Bandeira

a Fernando Pessoa

 

Quem és tu?

– Eu?, sou a ânsia de saber quem sou;

o esgar de minha boca

não é meu.

Herdei não sei bem de quem.

 

– Eu?, vim com a chuva de Stroncio,

sou a Rosa de Hiroshima,

vermelha e fatal.

 

Quem és tu, afinal?

– Eu?, não tenho face,

uso essa estranha máscara,

mais verdadeira e real

do que minha própria face,

se a tivesse...

 

A Máscara

(Krzysztof Iwin: artista polonês)

 

Referência:

 

CORRÊA, Alceu Brito. O poema. In: __________. Epiciclo. Rio de Janeiro, RJ: Blocos, 2002. p. 09.

segunda-feira, 30 de outubro de 2023

Brasileirão 2023: 30ª Rodada - Projeções do Modelo Esotérico-Matemático (MEM)

Aqui estão as novas projeções do MEM para o final do Brasileirão 2022 – Série “A” (para melhor visualização, dê um clique em cima de cada tabela): os números deixam claro que o título para o Botafogo está em perigo, haja vista a queda de aproveitamento (e também de rendimento) do time, na casa dos 40,74% nas últimas dez (10) rodadas.

 

Note-se que as métricas do Botafogo e do Palmeiras apresentam uma diferença de apenas 3,2 pontos ao final do certame, o que poderá resultar em completa imprevisibilidade ao final da próxima rodada, se, porventura, o Palmeiras tiver vencido o alvinegro, no Rio de Janeiro (RJ).

 

Levando-se em consideração tão apenas o aproveitamento de todos os times nas dez (10) últimos jogos, e tomando-se por hipótese que tal aproveitamento se mantenha nas próximas partidas, até o final do campeonato, chega-se ao seguinte resultado: 1. Bragantino (72,0 pontos); 2. Botafogo (70); 3. Atlético-MG (66,6); 4. Palmeiras (65,8); 5. Flamengo (65,0). Ou seja: são 7,0 pontos do Flamengo ao Bragantino, uma diferença quase igual à projetada pelo MEM (6,9), embora a ordem de colocação dos times seja bem diferente (à exceção do Flamengo, em quinto (5º) em ambos os cálculos).

 

Na parte de baixo da tabela, a luta é ainda mais acirrada, com Bahia, Santos, Vasco e Goiás na disputa para não participar do grupo de duas vagas em disputa no Z4: veja-se que a diferença de pontos projetados pelo MEM, entre o Bahia e o Goiás, é de apenas 2,8 pontos, ou seja, uma rodada e tudo pode se alterar! Essa diferença sobe a 5,2 pontos quando se considera o aproveitamento dos times nas dez (10) últimas rodadas e se o projeta para o fim do torneio, sem que se alterem, nada obstante, a posição dos times: Bahia, Santos, Vasco e Goiás.

 

Voltaremos ao final da 32ª rodada, para novas projeções.

 

Um abraço a todo(a)s.

 

J.A.R. – H.C.

 

Fontes:

 

Chance de Gol

Infobola

UFMG Matemática

  

Nora Didier de Iungman - Imobilidade do Cativeiro

Aludindo a enredos míticos, como os confrontos entre Aquiles e Heitor ou entre Teseu e o Minotauro, ou mesmo históricos, a exemplo do campo de extermínio de Treblinka, na Polônia, a poetisa e professora argentina discorre sobre a própria história da humanidade, a manar feito uma sucessão inalterável de resgates dos mortais ao cativeiro, mas que não logra mantê-los em estado de plena lucidez, porque há aqueles que sempre optam por retornar ao interior da platônica caverna do ilusório (ou mesmo se recusam a sair de lá).

 

Ora veja o internauta o quanto o tema do poema se correlaciona à replicada máxima do pensador genebrino Rousseau (1712-1778) – “O homem nasce livre e por toda parte encontra-se a ferros.” –, ou mesmo ao escopo de obras seminais, como o “Discurso da Servidão Voluntária”, do francês Étienne de La Boétie (1530-1563), e “O Medo à Liberdade”, do alemão Erich Fromm (1900-1980)! Como diria Sartre (1905-1980), estamos “condenados” à liberdade, mas parece que preferimos abrir mão da reponsabilidade que a ela se concatena.

 

J.A.R. – H.C.

 

Nora D. de Iungman

(n. 1948)

 

Inmovilidad del Cautiverio

 

Toda la noche

hemos estado habitando

una ingenuidad en luz

definitivamente oblicua.

 

Allí surgió la cólera

de Aquiles

la lección de Teseo

los campos de Treblimka

o el cadáver de Héctor

por las murallas de Troya.

 

Toda la noche

hemos estado cubriendo

como un agua sutil

la libertad rescatada

del sueño.

Y aquí todavía los templos

acunan el canto

de los dioses.

 

Quizás nadie llore

la rectitud de los ojos

permitidos en piedra.

Pero hay un oído incierto

de voces

que percibe desde lejos

desde entonces

desde siempre

la inmovilidad

del cautiverio.

 

Escavações em Hissarlik

(William Simpson: artista escocês)

 

Imobilidade do Cativeiro

 

Toda a noite

temos habitado

uma ingenuidade em luz

definitivamente oblíqua.

 

Ali surgiu a cólera

de Aquiles

a lição de Teseu

os campos de Treblinka

ou o cadáver de Heitor

junto às muralhas de Troia.

 

Toda a noite

temos coberto

como uma água sutil

a liberdade resgatada

ao sono.

E aqui ainda os templos

embalam o canto

dos deuses.

 

Talvez ninguém chore

a retidão dos olhos

permitidos em pedra.

Porém há um ouvido incerto

de vozes

que percebe de longe

desde então

desde sempre

a imobilidade

do cativeiro.

 

Referência:

 

IUNGMAN, Nora Didier de. Inmovilidad del cautiverio. In: ABALO, Edgardo A. et alii. Luz inagotable: antología S.A.D.E. (Sociedad Argentina de Escritores). Santa Fe, AR: Imprenta de la Universidad Nacional del Litoral, oct. 1997. p. 95.

domingo, 29 de outubro de 2023

Cassiano Ricardo - A glória não está nas alturas

À glória etérea que se eterniza, enquanto mito, no azul remoto do firmamento, o poeta contrapõe os louros de uma vida de embates aqui embaixo, no “chão”, “na luta áspera da planície, da rua”, onde o corpo “sofre e se ensanguenta”, muitas vezes tombando frente à voracidade das tribulações quotidianas que tem de suportar.

 

Há um certo contraponto hierático no título do poema, definindo um fundo perante o qual o autor rumina acerca do processo “catártico” de ter que se viver e sofrer os tormentos terrenos, do labor para se obter o pão com suor no rosto, sendo pó integrado em carne  e retornando ao pó primordial ao final da lida: a vida não é mais que um combate!

 

J.A.R. – H.C.

 

Cassiano Ricardo

(1895-1974)

 

A glória não está nas alturas

 

A glória não está nas alturas.

Está no chão, está na luta áspera

da planície, da rua.

Está onde a matéria sofre

e se ensanguenta.

Está, não nas coisas que sobem,

mas nas coisas que caem.

 

A glória não está no céu lúcido,

que carrego nos ombros, desde

que nasci. Sou pequeno demais,

pra carregar estrelas

tão numerosas quanto indecifráveis.

O que posso fazer é dar um nome, a cada uma delas,

e inventar constelações.

 

Estou farto de azul e de outros mitos

que encontrei no mundo. A aurora

que se diz vir do além,

não me satisfaz, não é a aurora que eu sonho.

Doura-me as mãos, apenas por ser loura.

Não resolve, sequer, o meu terrível monólogo.

Antes, repete o erro imemorial.

 

Em: “Poemas murais” (1950)

 

Fluindo no profético

(Autoria não identificada)

 

Referência:

 

RICARDO, Cassiano. A glória não está nas alturas. In: JACOBBI, Ruggero (Sel. e Trad.). Lirici brasiliani: dal modernismo ad oggi. Prima edizione italiana. Milano, IT: Silva Editore, 1960. p. 142.

sábado, 28 de outubro de 2023

Louis Simpson - O poema não escrito

Simpson deplora o fato de ter que viver num estilo de vida insípido, carente de emoções saudáveis. Ainda assim, reconhece que o seu mister muito tem a ver em deixar aflorar o seu afeto pelas pessoas sobre as quais e para quem escreve os seus poemas, mesmo que tal estima não seja correspondida pela comunidade destinatária: “Amar e escrever, sem ser correspondido, é o destino do poeta”!

 

Percebam-se as inflexões impregnadas nos versos, a contraporem, de um lado, um pendor ao “ardor” e à “engenhosidade” – reportando-se, claro está, à sutileza e ao refinamento nas percepções e na escrita do poeta –, e, de outro, a platitude de um estilo de vida suburbano, bem à feição da cultura norte-americana, sob o qual as massas anônimas se consomem nas chamas de uma lida de agastamentos e de formalidades.

 

J.A.R. – H.C.

 

Louis Simpson

(1923-2012)

 

The unwritten poem

 

You will never write the poem about Italy.

What Socrates said about love

is true of poetry – where is it?

Not in beautiful faces and distant scenery

but the one who writes and loves.

 

In your life here, on this street

where the houses from the outside

are all alike, and so are the people.

Inside, the furniture is dreadful –

flock on the walls, and huge color television.

 

To love and write unrequited

is the poet's fate. Here you’ll need

all your ardor and ingenuity.

This is the front and these are the heroes –

a life beginning with “Hi!” and ending with “So long!”

 

You must rise to the sound of the alarm

and march to catch the 6:20 –

watch as they ascend the station platform

and, grasping briefcases, pass beyond your gaze

and hurl themselves into the flames.

 

Em uma varanda veneziana

(Antonio Paoletti: pintor italiano)

 

O poema não escrito

 

Nunca escreverás o poema sobre a Itália.

O que Sócrates afirmou sobre o amor

é válido para a poesia – onde ela se encontra?

Não em belos rostos e paisagens distantes,

senão naquele que escreve e ama.

 

Em tua vida aqui, nesta rua

onde as casas pelo lado de fora

são todas iguais, assim como as pessoas.

Por dentro, horrendos são os móveis –

amontoam-se junto às paredes, ao redor

de uma enorme televisão em cores.

 

Amar e escrever, sem ser correspondido,

é o destino do poeta. Aqui necessitarás

de todo o teu ardor e engenhosidade.

Este é o front e eis os heróis –

uma vida que começa com “Oi”

e termina com “Até mais!”

 

Deves te levantar ao som do alarme

e marchar para pegar o trem das 6h 20 –

observa como todos se dirigem à plataforma da estação

e, agarrando-se às pastas, transpõem o teu olhar

e se lançam às chamas.

 

Referência:

 

SIMPSON, Louis. The unwritten poem. In: __________. The owner of the house: new collected poems 1940-2001. Rochester, NY: BOA Editions, 2003. p. 342. (‘American Poets Continuum Series’; n. 78)