Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Murilo Moreira Veras – Passagem de Ano

Com o oportuno nome de “Passagem de Ano”, o poema ora estampado retrata as desesperanças e, ao mesmo tempo, as expectativas que sempre se renovam ao longo desta época, pois, afinal, ser humano e expressar essa humanidade são um e somente um propósito, a manifestar-se pela busca do novo – ainda que muitas de nossas promessas de mudança efetivamente não se concretizem.

Contudo, isso pouco importa: sonhar de olhos abertos é o melhor dos mundos! E “sonhar não custa nada”, como afirma o lendário samba-enredo da Mocidade.

E pelo momento, desejo a todas as pessoas do Brasil e do Mundo, sem distinção de cor, raça, religião, sexo ou outras coisas que tenham o potencial para dividir-nos, um Ano Novo pleno de realizações. Que a humanidade mostre aptidão para viver em paz nas suas muitas diferenças.

Um grande abraço para todo(a)s. E muito obrigado aos internautas que nos deram a honra de suas visitas às páginas deste blog.

J.A.R. – H.C. 
Murilo Moreira Veras
(n.: 1933)

Passagem de Ano

Nos olhos, a perspectiva de um sonho,
enquanto a vida gira,
os últimos segundos se apagam
no palco iluminado
de efêmeras esperanças,
último amplexo,
sem nome,
sem destino,
a última função de um circo,
o louco circo
do viver.
Ao redor, os espectadores
estouram foguetes,
servem banquetes,
músicas golpeiam o espaço
e vozes polifônicas se erguem das bocas
dos comensais.
Corais anônimos entoam hinos,
ensaiam canções,
cançonetas populares,
tudo em ritmo ligeiro,
esfuziante,
retumbante,
como a própria vida,
o próprio sonho realizado,
a criança que sorri.
E a última função do pequeno-grande-circo
seus folguedos,
seus segredos,
muita alegria,
e brincadeira,
no minúsculo picadeiro,
da vida,
da alma,
dos corações:
– mercado de ilusões diárias
no balanço final do ano.

Hoje tem festa?
– tem, sim, senhor.
Hoje tem palhaçada?
– tem, sim, senhor.

E mais um dia se vai
no picadeiro do mundo,
– ilusões vividas,
– sonhos escondidos,
– lágrimas vertidas,
no seco vale da vida,
no revolto mar da lida.
Na curvatura do universo,
o tempo se perde
com o adeus à pessoa amada,
enquanto isso, o pequeno trem de nossos segredos
cruza a última volta
do caminho,
a fumaça some,
soluçando
um aceno
um beijo
de adeus.
Hoje é dia de festa?
– é, sim, senhor.
Hoje é o último dia do ano?
– também é, sim, senhor.
E o ladrão do circo-vida
onde está ele, meu senhor?

Fugiu
com a saudade
que restou.

New Year’s Eve Party
Samantha Smith: artista norte-americana 
Referência:

VERAS, Murilo Moreira. Passagem de ano. In: __________. Ventos vertentes. Brasília (DF): Itiquira / Círculo Literário de Brasília, 1981. p. 33-34.

terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Federico García Lorca - Nascimento de Cristo

O distanciamento entre o meramente terreno e o celestial constitui o substrato poético por trás do poema de Lorca, de que ora tratamos. Farta de imagens venais e desoladoras, a poesia, em associação com o seu título, parece sugerir que, no nascimento de Cristo, nada há de lustroso, e que, se o evento ocorresse em meio ao cenário das grandes cidades contemporâneas, teria tudo para passar despercebido.

Lorca faz referência depreciativa aos sacerdotes e querubins, que já não inspiram confiança no plano religioso, pois suas verdades espirituais são tão esvoaçantes quanto as forças da natureza que pressionam as placas de propaganda, vazias, contudo, em meio ao estado de pura graça em que a cidade fica imersa. Os atuais adeptos de Lutero, segundo ele, cruzam as esquinas da urbe, a apregoar um combinado de racionalidade e materialismo, no qual a mística, modicamente, assume perspectivas secundárias.

J.A.R. – H.C.

Snow Falling, Times Square, N.Y.
Kay Crain: artista norte-americana

Nacimiento de Cristo

Un pastor pide teta por la nieve que ondula
blancos perros tendidos entre linternas sordas.
El Cristo de barro se ha partido los dedos
en los filos eternos de la madera rota.

¡Ya vienen las hormigas y los pies ateridos!
Dos hilillos de sangre quiebran el cielo duro.
Los vientres del demónio resuenan por los valles
golpes y resonancias de carne de molusco.

Lobos y sapos cantan en las hogueras verdes
coronadas por vivos hormigueros del alba.
La luna tiene un sueño de grandes abanicos
y el toro sueña un toro de agujeros y de agua.

El niño llora y mira con un três en la frente.
San José ve en el heno tres espinas de bronce.
Los pañales exhalan un rumor de desierto
con cítaras sin cuerdas y degolladas voces.

La nieve de Manhattan empuja los anúncios
y lleva gracia pura por las falsas ojivas.
Sacerdotes idiotas y querubes de pluma
van detrás de Lutero por las altas esquinas.

Snow Falling, The Bronx, N.Y.
(Kay Crain)

Nascimento de Cristo

Um pastor pede teta pela neve que ondula
brancos cães estendidos entre lanternas surdas.
O Cristo de barro partiu os dedos
nos fios eternos da madeira rota.

Já vêm as formigas e os pés regelados!
Dois filetes de sangue quebram o céu duro.
Os ventos do demônio ressoam pelos vales
golpes e ressonâncias de carne de molusco.

Lobos e sapos cantam nas fogueiras verdes
coroadas por vivos formigueiros de aurora.
A lua tem um sonho de grandes leques
e o touro sonha um touro de buracos e de água.

O menino chora e olha com um três na frente.
São José vê no feno três espinhas de bronze.
Os cueiros exalam um rumor de deserto
com cítaras sem cordas e degoladas vozes.

A neve de Manhattan empurra os anúncios
e leva graça pura pelas falsas ogivas.
Sacerdotes idiotas e querubins de pena
vão atrás de Lutero pelas altas esquinas.

Referência:

LORCA, Federico García. Nacimiento de Cristo; Nascimento de Cristo. In: __________. Obra poética completa. Edição bilíngue. Tradução de William Agel de Melo. Brasília: Ed. da UnB; São Paulo: Martins Fontes, 1989. p. 450-451.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Carlos de Lazerme - Natal

De Carlos de Lazerme (1873-1936), poeta e escritor de origem francesa, quase nada ou muito pouco sabemos: trata-se do autor da obra “Les Jours Passés”, a que pertence o poema abaixo, traduzido por Almansur Haddad, poema que também foi incluído na recolha “La Poésie Religieuse”, de Maurice Allem (HADDAD, 1960, p. 231). Dele, sequer conseguimos obter o original em francês. Ficamos, portanto, a dever aos internautas interessados.

J.A.R. – H.C.

Anjos do Natal
Greg Olsen: artista norte-americano

Natal

Magi venient de Saba...
Assim nestas prosas latinas,
Vozes cantavam nas matinas,
Como elas ninguém cantará...
Expande-se a fragrância aérea
De incenso e de mirra sagrada:
Há uma esperança ora espalhada
No ouro dos astros sobre a terra.
Voltai de novo para o Sul,
De vosso esforço sois bem pagos,
Acordo e vou convosco, magos.
Reis que vindes de manto azul.
Todos os meus velhos Natais
Voltam agora em teoria;
E eu choro enfim, mas de alegria,
Sombras antigas retornais.
Doçuras dos Natais passados!
Com vossos vestidos sem fim
Como um bíblico serafim
Para mim sois todos voltados!
No campo é noite a negrejar...
Para onde vais, ó Criatura?
Vou a rezar, vou a cantar
Como os pastores da escritura.
Escutais a frauta sonora?
Dos corações é esta voz!
São vozes de anjo como outrora
E que vão passando por nós.
Missa de Meia-Noite... O Sino...
Quem para a Igreja não iria
Se lá sentada está Maria,
A acalentar o seu Menino?
E na nave que nos imanta.
Por entre os círios acendidos,
Entre os amores consumidos
Há um sonho milenar que canta.
Pois o presépio é sempre lá...
Velhos Natais de minha infância,
Minha alma tem velha fragrância,
Magi venient de Saba.

Fazendo a Lista
Greg Olsen

Referência:

LAZERME, Carlos de. Natal. In: HADDAD, Jamil Almansur (seleção, tradução e notas). Noite santa: antologia de poemas de Natal. São Paulo: Autores Reunidos, 1960. p. 233-234.

domingo, 28 de dezembro de 2014

Thomas Hardy – Os Bois

O poema “The Oxen” (“Os Bois”), do poeta inglês Thomas Hardy, é uma criação já hoje clássica para esta época do ano. A poesia, escrita em 1917, revela, a um só tempo, o lado das tradições incorporadas ao imaginário do Natal – quando um idoso reprisa a lenda de que os animais, à meia noite do dia 24 para 25 de dezembro, flexionam os joelhos a reverenciar o nascimento de Cristo –, e a total descrença em tal narrativa nos tempos hodiernos.

Mas a voz poética não se satisfaz no ceticismo: ela vivencia a potencialidade de que uma lenda tenha o seu lado real ou que seja capaz de alimentar experiências proveitosas de sonhos, estes sim, conversíveis em algo mais tangível. É como se o ceticismo padecesse de alguma dúvida sobre as suas próprias convicções!
     
J.A.R. – H.C. 
A Natividade
(Federico Barocci: 1535-1612)

The Oxen

Christmas Eve, and twelve of the clock.
“Now they are all on their knees”,
An elder said as we sat in a flock
By the embers in hearthside ease.

We pictured the meek mild creatures where
They dwelt in their strawy pen,
Nor did it occur to one of us there
To doubt they were kneeling then.

So fair a fancy few would weave
In these years! Yet, I feel,
If someone said on Christmas Eve,
“Come; see the oxen kneel

In the lonely barton by yonder coomb
Our childhood used to know”,
I should go with him in the gloom,
Hoping it might be so. 



Os Bois

Véspera de Natal, e meia noite no relógio.
“Agora todos se põem de joelhos”,
Disse um idoso quando nos sentamos em grupo
Bem acomodados à volta da lareira.

Imaginamos os mansos e humildes animais
Alojados em seu aprisco com leito de palhas,
E a ninguém ali ocorreu duvidar
Que então estivessem mesmo ajoelhados.

Tão bela fantasia poucos ousariam expressar
nestes anos! Ainda assim, sinto que
se alguém dissesse na véspera de Natal:
“Venham ver os bois de joelhos

No solitário estábulo além do vale
Que amiúde a nossa infância conheceu”,
Partiria com ele na escuridão,
Esperando que de fato assim o fosse.

Referência:

HARDY, Thomas. The oxen. In: BLACK, Joseph Laurence et al. (eds.). The broadview anthology of british literature: concise edition. Volume B: The Age of Romanticism; The Victorian Era; The Twentieth Century and Beyond. 1. ed. Toronto (CA): Broadview Press, 2007. p. 867.

sábado, 27 de dezembro de 2014

Federico García Lorca - Natal no Hudson

Num dia como hoje, 27 de dezembro, no já distante ano de 1929 – coincidência das coincidências, o mesmo ano em que ocorreu a quebra da Bolsa de Nova York, dando início ao pior momento econômico da história dos EUA, a “Grande Depressão” –, o poeta espanhol García Lorca, em passagem por aquela megalópole, escreveu o poema que ora postamos: “Navidad en el Hudson”.

Não se trata de um poema nitidamente relacionado ao Natal. Tampouco o Rio Hudson nele aparece como um cenário geográfico muito bem definido, senão metaforizado na figura da morte.

Note-se que nem mesmo a morte do marinheiro recém-degolado possui um sentido denotativo explícito, a configurar uma tragédia porventura ali ocorrida, pois a voz poética subjacente continua a falar, e mesmo o marinheiro degolado põe-se a cantar na terceira estrofe do poema.

Ocorre, de fato, uma identificação do estado mental do poeta com o ambiente que o circunda: as anáforas da primeira estrofe – os ‘esses’ e ‘essas’ reiterados, como a configurar realidades alheias a si próprio –, são subtraídas na copla derradeira, quando ocorre a transformação dos elementos da descrição original em profundas internalizações, enunciadas agora sob um estado de posse:  “Oh! esponja minha cinzenta!”.

O poema, ademais, flui em esquivas imagens, como na abordagem panorâmica de Nova York, constante na segunda estrofe, conjugadas a outras nas quais se pode intuir certa solidão e alheamento, como quando se aborda a luta vã de centenas de marinheiros sob o céu, num mundo à parte.

Mesmo o componente erótico não pode ser descartado, enquanto hipótese presente em sua última estrofe: se o poeta for o marinheiro degolado, o que se poderia afirmar sobre o extremo verso do poema, a grafar a “lâmina de meu amor, lâmina cortante”?!

A reportar, com mais nitidez, o nascimento de Cristo, apenas o início da última estrofe, momento em que se identifica a fábula religiosa – “inerte” segundo o poeta – e se manifesta a pouca importância do nascimento de um novo menino, ante o quadro desolador apresentado pela “desembocadura” do rio, a alegoria de um mundo em frenesi.

J.A.R. – H.C.

García Lorca
(1898-1936)

Navidad en el Hudson

¡Esa esponja gris!
Ese marinero recién degollado.
Ese rio grande.
Esa brisa de limites osctiros.
Ese filo, amor, ese filo.
Estaban los cuatro marineros luchando con el mundo,
con el mundo de aristas que ven todos los ojos,
con el mundo que no se puede recorrer sin caballos.
Estaban uno, cien, mil marineros,
luchando con el mundo de las agudas velocidades,
sin enterarse de que el mundo
estaba solo por el cielo.

El mundo solo por el cielo solo.
Son las colinas de martillos y el triunfo de la hierba espesa.
Son los vivísimos hormigueros y las monedas en el fango.
El mundo solo por el cielo solo
y el aire a la salida de todas las aldeãs.

Cantaba la lombriz el terror de la rueda
y el marinero degollado
cantaba el oso de agua que lo había de estrechar;
y todos cantaban aleluya,
aleluya. Cielo desierto.
Es lo mismo, ¡lo mismo!, aleluya.

He pasado toda la noche en los andamios de los arrabales
dejándome la sangre por la escayola de los proyectos,
ayudando a los marineros a recoger las velas desgarradas.
Y estoy con las manos vacías en el rumor de la desembocadura.

No importa que cada minuto
un nino nuevo agite sus ramitos de venas,
ni que el parto de la víbora, desatado bajo las ramas,
calme la sed de sangre de los que miran el desnudo.
Lo que importa es esto: hueco. Mundo solo. Desembocadura.
Alba no. Fábula inerte.
Solo esto: Desembocadura.
¡Oh esponja mia gris!
¡Oh cuello mio recién degollado!
¡Oh rio grande mio!
¡Oh brisa mia de limites que no son mios!
¡Oh filo de mi amor, oh hiriente filo!

New York, 27 de diciembre de 1929.

Christmas Eve along the Hudson
with the Palisades across the River
(Samuel Carr: 1837-1908)

Natal no Hudson

Essa esponja cinzenta!
Esse marinheiro recém-degolado.
Esse rio grande.
Essa brisa de limites escuros.
Esse fio, amor, esse fio.
Estavam os quatro marinheiros lutando com o mundo,
com o mundo de arestas que todos os olhos veem,
com o mundo que não se pode percorrer sem cavalos.
Estavam um, cem, mil marinheiros,
lutando com o mundo das agudas velocidades,
sem inteirar-se de que o mundo
estava só pelo céu.

O mundo sozinho pelo céu sozinho.
São as colinas de martelos e o triunfo da erva espessa.
São os vivíssimos formigueiros e as moedas no lodo.
O mundo sozinho pelo céu sozinho
e o ar à saída de todas as aldeias.

Cantava a lombriga o terror da roda,
e o marinheiro degolado
cantava o urso de água que o havia de estreitar;
e todos cantavam aleluia,
aleluia. Céu deserto.
É o mesmo, o mesmo!, aleluia.

Passei a noite toda nos andaimes dos arrabaldes
deixando o meu sangue pelo estuque dos projetos,
ajudando os marinheiros a recolher as velas desgarradas.
E estou com as mãos vazias no rumor da desembocadura.

Não importa que cada minuto
um menino novo agite seus raminhos de veias,
nem que o parto da víbora, desfeito sob as ramas,
acalme a sede de sangue dos que olham o nu.
O que importa é isto: vazio. Mundo só. Desembocadura.
Aurora não. Fábula inerte.
Só isto: Desembocadura.
Oh! esponja minha cinzenta!
Oh! pescoço meu recém-degolado!
Oh! rio grande meu!
Oh! brisa minha de limites que não são meus!
Oh! fio de meu amor, oh!, fio feridor!

Nova York, 27 de dezembro de 1929. 

Referência:

LORCA, Federico García. Navidad en el Hudson; Natal no Hudson. In: __________. Obra poética completa. Edição bilíngue. Tradução de William Agel de Melo. Brasília: Ed. da UnB; São Paulo: Martins Fontes, 1989. p. 442-445.

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Théophile Gautier – Natal

Temos nesta postagem um soneto de Théophile Gautier sobre a cena bíblica do nascimento de Jesus, cuja tradução extraímos da seleta de poemas natalinos elaborada por Jamil Haddad, o consagrado tradutor ao português de “As Flores do Mal”, de Baudelaire – neste blog inúmeras vezes mencionado.

 

J.A.R. – H.C.

 

Théophile Gautier

(1811-1872)

 

“Partindo do Romantismo acaba arribando a “Émaux et Camées”, um dos livros-base do parnasianismo. Considerava-se romântico, mas o seu cuidadoso apuro da forma coloca-o melhor dentro da tendência parnasiana, onde a história literária acabou por situá-lo definitivamente. Orgulhava-se de se haver feito o seu livro principal durante as perturbações da Comuna, o que é evidência por outro lado de um dos traços que também ficou marcando o parnasianismo: a arte pela arte, a afrontosa indiferença pelo mundo e seus possíveis conflitos. Também foi crítico de arte e de teatro. Outros livros seus: Poèmes antiquasPoèmes et PoésiesPoésies barbaresPoèmes tragiques.” (HADDAD, 1960, p. 153)

 

Noël

 

Le ciel est noir, la terre est blanche.   

Cloches, carillonnez gaîment!   

Jésus est né; la Vierge penche   

Sur lui son visage charmant.

 

Pas de courtines festonnées

Pour préserver l’enfant du froid;        

Rien que les toiles d’araignées  

Qui Pendent des poutres du toit.       

 

Il tremble sur la paille fraîche,  

Ce cher petit enfant Jésus,

Et pour l’échauffer dans sa crèche      

L’âne et le bœuf soufflent dessus.       

 

La neige au chaume pend ses franges,

Mais sur le toit s’ouvre le Ciel,  

Et, tout en blanc, le chœur des anges

Chante aux bergers: “Noël! Noël!”

 

Adoração dos Pastores

(Bartolomé Esteban Murillo: 1650-1655)

 

Natal

 

O céu é negro, é branca a terra;

Carrilhonai, ó voz do sino!

Jesus nasceu e já descera

Nossa Senhora o olhar divino.

 

Não há cortina de Bretanha

Para no frio dar socorro,

Não há mais que teias de aranha

Pendentes das pranchas do forro.

 

E treme na palha que doura,

O Deus de olhos angelicais,

E dão calor à manjedoura

O hálito a arder dos animais.

 

Sobre a cabana brilha a neve

Em cima há um céu onde há um coral

De anjos que canta a canção leve

Para os pastores: “É Natal!”

                                                     

Referências:

 

GAUTIER, Théophile. Noël. In: __________. Selected lyrics. Translated into English by Norman R. Shapiro. New Haven (CT): Yale University Press, 2011. p. 194. (The Margellos World Republic of Letters)

 

HADDAD, Jamil Almansur (seleção, tradução e notas). Noite santa: antologia de poemas de Natal. São Paulo: Autores Reunidos, 1960. p. 155.