A versão em português, como de praxe para os casos em que não há indicação do tradutor, é de minha autoria – e por ela sou responsável pelos erros e acertos (rs).
Alpes Literários
Subtítulo
quarta-feira, 30 de abril de 2014
Hippolyte Taine – Memórias Felinas
A versão em português, como de praxe para os casos em que não há indicação do tradutor, é de minha autoria – e por ela sou responsável pelos erros e acertos (rs).
terça-feira, 29 de abril de 2014
Mensalão – Troço de Doido
segunda-feira, 28 de abril de 2014
Aldo Pellegrini – Um Gato Inexplicável
sábado, 26 de abril de 2014
Jacques Prévert e o Gato que Faz as Coisas pela Metade
sexta-feira, 25 de abril de 2014
Borges e o Domínio Interditado e Secreto do Gato
quinta-feira, 24 de abril de 2014
Vinicius de Moraes – O Tema do Gato em Três Poemas
quarta-feira, 23 de abril de 2014
Um Gato sem Conflitos Existenciais e um Gajo com um Eu Descentrado
Entre os poetas amantes de gatos, é óbvio, não
poderia faltar o lusitano Fernando Pessoa. E ora vejam: Pessoa vai buscar a
figura de um bichano para deixar transparecer a proverbial perda de identidade
que, de algum modo, vem a explicar a pluralidade de heterônomos em que ele
próprio se esvaiu.
Tal como interpreto o poema em apreço,
percebe-se que o gajo não vê como sejam possíveis conflitos ontológicos no
felino, pois não há como este se expressar verbalmente para explicar o que lhe
vai no íntimo, suas sensações, seus anseios e ansiedades [puxa!, expressei-me
aqui como se fosse detentor de uma prosa elegante como a do sociólogo Octavio
Ianni (rs)]. Sente o que sente, e isto lhe basta para externalizar o seu
interno por meio de seus instintos. Nisso consiste a sua “felicidade”!
Mas o íntimo do poeta é muito mais complexo:
nele, há um embate – e, em Fernando Pessoa, poder-se-ia dizer até mesmo uma
desconexão! – entre o ser e o conhecer, entre o imanente e o explicável, entre
o objeto de conhecimento e o sujeito da análise que, em última instância, é o
próprio ente que busca se conhecer. Eis aí o eterno problema da autorreferência
com que tanto se debatia outro grande sociólogo: o alemão Niklas Luhmann!
Mas, digam-me, por qual razão Fernando Pessoa
escolheu falar de um gato para referir-lhe a posse plena de um nada que é todo
seu, quando poderia ter optado, por exemplo, por um cão?! (rs).
J.A.R.
– H.C.
Fernando Pessoa
Poeta Português
(1888-1935)
Gato que Brincas na Rua
Gato que brincas na rua
Como se fosse na cama,
Invejo a sorte que é tua
Porque nem sorte se chama.
Bom servo das leis fatais
Que regem pedras e gentes,
Que tens instintos gerais
E sentes só o que sentes.
És feliz porque és assim,
Todo o nada que és é teu.
Eu vejo-me e estou sem mim,
Conheço-me e não sou eu.
Referência:
PESSOA, Fernando. Gato que brincas na rua. In:
__________. Obra poética. 8. ed. Rio de Janeiro, RJ: Nova Aguilar,
1994. p. 156.
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terça-feira, 22 de abril de 2014
Rilke – Gato Preto
Gatos para todos os gostos. Gatos
agraciados pela pena de inúmeros poetas, de ontem e de hoje, daqui e dali. E
muitas dessas criações vertidas ao português por grandes tradutores – como
Augusto de Campos, a quem, alhures, já declinamos elogios aos seus belos e
requintados trabalhos.
E aqui vai mais um poema: “Gato preto”, de Rilke, por meio do qual se parece sugerir que um bichano é capaz de recolher todos os olhares que lhe dirigimos, confiná-los dentro de si por dissimulação e, no retorno da mirada, fazer-nos ver, nesse mesmo olhar, nossa expressão reduzida à mera insignificância de um inseto – enquanto metáfora da pupila –, preso no âmbar amarelecido de seus olhos.
Ainda que um fantasma seja, existe algo suficientemente tangível, enquanto hipótese levantada pelo poema, com potencial para reproduzir um eco. Rilke projeta assim um clima inefável, misterioso, numinoso, sobrenatural até, para perscrutar o que acontece por trás da espessa pelagem de um gato negro.
Fantasmas levam-nos a suspenses e a temores do incerto que daí se propaga. E não há como deixar de associar tais referências à atmosfera das “Histórias Extraordinárias” de Allan Poe, especialmente à do conto com título similar ao da criação de Rilke: “O gato preto”.
J.A.R. – H.C.
Schwarze Katze
Ein Gespenst ist noch wie eine Stelle,
dran dein Blick mit einem Klange stößt;
aber da, an diesem schwarzen Felle
wird dein stärkstes Schauen aufgelöst:
wie ein Tobender, wenn er in vollster
Raserei ins Schwarze stampft,
jählings am benehmenden Gepolster
einer Zelle aufhört und verdampft.
Alle Blicke, die sie jemals trafen,
scheint sie also an sich zu verhehlen,
um darüber drohend und verdrossen
zuzuschauern und damit zu schlafen.
Doch auf einmal kehrt sie, wie geweckt,
ihr Gesicht und mitten in das deine:
und da triffst du deinen Blick im
geelen
Amber ihrer runden Augensteine
unerwartet wieder: eingeschlossen
wie ein ausgestorbenes Insekt.
Gato Preto
Mesmo um fantasma é ainda um lugar
em que teu olho com um som se choca;
mas nesse velo negro em que ele toca,
o olhar mais forte pode se apagar:
tal como um louco, quando em pleno
acesso,
a martelar na escuridão, possesso,
para ante o estofo surdo de uma cela
e de súbito cessa diante dela.
A todos os olhares ele oculta
como se lhes quisesse sobrepor
o seu; indolente e ameaçador,
dorme com eles e o sepulta.
Mas ei-lo, de improviso, ressurreto –
a sua face adentra a tua face
e de repente encontras teu olhar
no âmbar desse olho-pedra circular:
fechado em si, como se ele abrigasse
a
múmia seca de um inseto.
RILKE, Rainer Maria. Gato preto. In:
CAMPOS, Augusto de (Sel. e Trad.). Coisas e anjos de Rilke. 2. ed. São
Paulo: Perspectiva, 2013. p. 248-249. (Coleção ‘Signos’; n. 30)