A seção abaixo é a
primeira das quatro que compõem o poema completo intitulado “Tercetos sobre a Efemeridade”,
de Hofmannsthal: reflete o poeta sobre a transitoriedade das coisas deste mundo
de aparências, movediço e muitas vezes ilógico, numa espiral que se satisfaz em
replicar os genes entre sequentes gerações.
Nessa moldagem de
impermanência, o falante percebe a sua própria existência em seus falecidos
antepassados, estando com eles sem ainda ser, no sentido pleno do termo. E nisto
consiste a constância da vida: perceber em si próprio, mesmo em seu corpo – como
num fio de cabelo –, o liame que prende cada um à sua estirpe, elo resistente
que lança reptos ao transitório, pretextando eternidades.
J.A.R. – H.C.
Hugo von Hofmannsthal
(1874-1929)
Terzinen über
Vergänglichkeit
Noch spür ich ihren
Atem auf den Wangen:
Wie kann das sein,
daß diese nahen Tage
Fort sind, für immer
fort, und ganz vergangen?
Dies ist ein Ding,
das keiner voll aussinnt,
Und viel zu
grauenvoll, als daß man klage:
Daß alles gleitet und
vorüberrinnt.
Und daß mein eignes Ich,
durch nichts gehemmt,
Herüberglitt aus
einem kleinen Kind
Mir wie ein Hund
unheimlich stumm und fremd.
Dann: daß ich auch
vor hundert Jahren war
Und meine Ahnen, die
im Totenhemd,
Mit mir verwandt sind
wie mein eignes Haar,
So eins mit mir als
wie mein eignes Haar.
O Cemitério de Pronoia
às proximidades de Náuplia
(Carl Rottmann:
pintor alemão)
Tercetos sobre a
Efemeridade
Ainda sinto o seu
alento em minha face:
Como é possível crer
que tenha já passado
O dia que passou e
para sempre passe?
É algo que entender
não pode a nossa mente
E é terrível demais
para ser lamentado:
Que tudo flua em vão
e acabe de repente,
E que o meu próprio
ego seja a projeção
De uma criança que
houve em mim anteriormente
Tão muda para mim, e
alheia, como um cão.
E que eu já estava
ali, há um século, sem sê-Io,
E os meus
antepassados, nos sepulcros, são
Comigo tão unidos
como o meu cabelo,
Tão parte de mim
mesmo como o meu cabelo.
Referência:
HOFMANNSTHAL, Hugo
von. Terzinen über vergänglichkeit / Tercetos sobre a efemeridade. Tradução de
Augusto de Campos. In: CAMPOS, Augusto de (Seleção, tradução e introdução). Irmãos
germanos: poemas de diversos autores. Florianópolis, SC: Noa Noa, 1992. Em
alemão e em português: p. 24.
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