Alpes Literários

Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 30 de junho de 2014

Curtas & Rápidas: 30 de Junho de 2014

Cheguei há pouco do Estádio Mané Garrincha, onde assisti ao jogo França 2 x 0 Nigéria, uma vitória merecida da seleção francesa, ainda que não tenha chegado a apresentar um brilho que a coloque, indiscutivelmente, como uma das pretendentes maiores ao título. Obviamente que, pela lógica – ou seria pela falta de lógica? – do futebol, isso não significa que não possa vir a ser a campeã! Mas ainda tenho a Holanda como franco-favorita, apesar do aperto por que passou ontem para vencer, por 2 x 1, da aguerrida equipe do México.
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Quanto à seleção da Nigéria, tal como as outras seleções africanas, à exceção da Argélia – pelo enorme esforço apresentado na partida contra a Grécia – parecia não pretender alguma coisa a mais na Copa. Além disso, suspeito que, pela relativa fragilidade ofensiva por ela apresentada, a Argentina deva mesmo ter algum problema defensivo, já que levou dois gols de um ataque que, de fato, se evidencia pouco eficaz.
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Em tempo: a Alemanha acabou de vencer a Argélia, também por placar apertado, 2 x 1 – e na prorrogação! Enfrentará a França na próxima fase, numa partidas das quartas de final, no estádio do Maracanã. Por outro lado, a julgar pelos adversários mais fracos que enfrentarão, é quase certo que Argentina e Holanda farão uma das semifinais – a de São Paulo. Afinal, a Holanda, nas quartas, enfrentará a Costa Rica. E a Argentina, passando pela Suíça – como julgo que passará facilmente amanhã –, enfrentará o vencedor de Bélgica e EUA, a quem, qualquer que seja ele, deverá também superar.
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Quanto à outra semifinal, poderá dar qualquer coisa entre as quatro seleções ora nomeadas: Colômbia e Brasil, de um lado, França e Alemanha, de outro. Estas duas últimas, pelo futebol que apresentaram no primeiro tempo de suas partidas de hoje, colocaram-me um ponto de interrogação na cabeça. Seja como for, não apostaria que o vencedor da Copa venha a sair desse lado. Vejamos...
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No que concerne ao jogo da próxima sexta-feira, entre Brasil e Colômbia, ouvi um comentário do ex-jogador Júnior, no sentido de que, ao enfrentar a Colômbia, muito possivelmente o futebol do time brasileiro se encaixaria melhor, porque a seleção andina joga e deixa jogar. Muito bem: perguntaria eu, ao ex-craque do Flamengo, se o Chile, em algum momento, chegou a fazer marcação por pressão ou homem a homem contra o time brasileiro, ou terá sido mesmo a inoperância do meio de campo da seleção que levou o time  a “sofrer” com o toque de bola chileno?
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Fato é que nenhum time se sustenta sem meio de campo! Além do mais, o elenco só conta com um jogador criativo, o Neymar, porque outros que poderiam ajudá-lo, como o Oscar, vêm exibindo enorme oscilação no futebol jogado. Ademais, eis aqui mais um erro de convocação do Felipão, que repete o equívoco perpetrado por Dunga em 2010: deveria ter convocado, notoriamente, um dos três jogadores a saber, Ronaldinho, Kaká ou Ganso, para tentar variar o jogo em situações mais penosas.
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Assim como está, não há alternativas, pois, mesmo entre os titulares, há jogadores que não têm a menor condição técnica de compor os quadros da Canarinho – Hulk é um exemplo notório! Imagine-se o que há de ser o banco de reservas! Nesse contexto, que o Felipão conte muito com a sorte – tal como no jogo contra o Chile –, porque o problema maior, mesmo, é que o futebol nacional passa por um momento de entressafra, com poucos jogadores de singular capacidade técnica!

J.A.R. – H.C.
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domingo, 29 de junho de 2014

Giacomo Leopardi – A Si Mesmo

Giacomo Leopardi, o grande poeta italiano, destila todo o seu desencanto e melancolia no poema a seguir, “A Se Stesso” (“A Si Mesmo”). Com desapego em relação à maior de todas as forças – a do amor –, como que se despede do mundo, onde já não vê quaisquer esperanças, senão pura “lama”, dado que a vida, para ele, passou a denotar apenas “nojo e tédio”.

Nota-se na poesia certo lirismo destrutivo, originário, provavelmente, da mesma fonte onde se saciaram nossos poetas românticos da fase do “Mal do Século”, como Álvares de Azevedo e Casimiro de Abreu.

Mas o desencanto de Leopardi, que se predica mais latamente pelo vocábulo “vacuidade”, poderia ser associado a um precedente muito mais vetusto, vale dizer, ao Livro do Eclesiastes, onde se traduziria como “vaidade”, no famoso versículo (Ecl 1,2): “Vaidade das vaidades – diz Coélet - tudo é vaidade”.

Para pacientes avançados em idade, até se poderia compreender os motivos de tanto cansaço com a vida. Mas para pessoas jovens, tanto niilismo se reputa incompreensível. Afinal, a vida tem belezas incontáveis!

J.A.R. – H.C. 
Giacomo Leopardi
(1798-1837)

A Se Stesso

Or poserai per sempre,
stanco mio cor. Peri l’inganno estremo,
ch’eterno io mi credei. Perì. Ben sento,
in noi di cari inganni,
non che la speme, il desiderio è spento.
Posa per sempre. Assai
palpitasti. Non val cosa nessuna
i moti tuoi, né di sospiri è degna
la terra. Amaro e noia
la vita, altro mai nulla; e fango è il mondo.
T’acqueta omai. Dispera
l’ultima volta. Al gener nostro il fato
non donò che il morire. Omai disprezza
te, la natura, il brutto
poter che, ascoso, a comun danno impera,
e l’infinita vanità del tutto.

Melancholy
(Domenico Feti: 1589-1623)

A Si Mesmo
(Giacomo Leopardi)

Enfim repousas sempre
Meu lasso coração. Findo é o engano.
Que perpétuo julguei. Findou. Bem sinto
Quem em nós dos caros erros
Mais que a esperança, o próprio anelo é extinto.
Repousa sempre. Muito
Palpitaste. Nenhuma coisa vale
Teus impulsos, nem digna é de suspiros
A terra. Nojo e tédio
É a vida, nada mais, e lama é o mundo.
Repousa. E desespera
A última vez. À nossa espécie o fado
Não deu mais que o morrer. Enfim despreza
A natureza, o rudo
Poder que, oculto, o comum dano gera
E a vacuidade sem final de tudo.

Referência:

LEOPARDI, Giacomo. A si mesmo. Poesia – Cantos – XXVIII.  Tradução de Alexei Bueno. In: __________. Poesia e prosa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1996. p. 268.

sábado, 28 de junho de 2014

Curtas & Rápidas: 28 de Junho de 2014

Finalizado o jogo Brasil 1 x 1 Chile, e consequente passagem da seleção à fase das quartas de final, depois dos 3 x 2 nos pênaltis, é possível afirmar que o Brasil contou com toda a sorte do mundo, pois jamais, em mais de 40 anos assistindo a partidas da Canarinho, vi um cotejo tão mal jogado pelo time. Não preciso falar a contrário senso, afinal se me expressei de um modo, em sentido inverso a avaliação é a mesma: a seleção do Chile merecia melhor sorte e, é claro, deveria ter avançado às quartas.
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Quanto ao time brasileiro, está jogando muito aquém daquele futebol que apresentou na Copa das Confederações do ano passado. Não que ali tenha se apresentado de forma exuberante, mas pelo menos havia um sentido de conjunto um pouco mais apurado, sentido que, neste momento, não se sabe por que cargas d’água desapareceu.
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A coisa se torna ainda mais preocupante em razão de o próximo jogo ser em Fortaleza, sob temperatura considerável, ainda que às 17h, certamente debaixo de um calor quase à mesma escala do de Belo Horizonte, onde a seleção atuou hoje. A propósito, foi em Fortaleza que o Brasil não passou de 0 x 0 contra o México, naquela que foi a segunda pior partida do elenco nesta Copa do Mundo. Não seria o caso de se perguntar qual terá sido a melhor partida que o time fez neste ano? (rs).
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Se alguém merece algum elogio por ora, indiscutivelmente, é o goleiro Júlio César, em especial depois das críticas que todos os comentaristas lhe reservaram após a falha no primeiro gol da Holanda, quando a seleção foi eliminada nas quartas, por 2 x 1, na Copa de 2010, na África do Sul.
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Mudando um pouco de assunto: avaliei como exagerada a pena de suspensão de nove jogos imposta pela Fifa ao jogador uruguaio Luisito Suárez, pela mordida em Chiellini, da Itália. Mesmo que seja reincidente na prática – o jogador seria um “garoto propaganda” de primeira mão para aqueles que, na Semana de Arte Moderna, desfraldaram a bandeira do Movimento Antropofágico! (rs) –, talvez a metade disso estaria bem demais como punição.
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Finalizo a passar um vaticínio do que possa vir a ocorrer pela frente: se a Colômbia eliminar o Uruguay daqui a pouco, como julgo que vá acontecer – palpito que se a seleção Cisplatina passar às quartas, tal hipótese somente se concretizará na prorrogação ou nos pênaltis, como no caso do Brasil –, este não terá melhor sorte e verá suas pretensões encerradas prematuramente. Quem viver verá! Meu nome é Tirésias! (rs).

J.A.R. – H.C.
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sexta-feira, 27 de junho de 2014

Tim DeMay: um enlace da Física com a Poesia

Encontrei, a compor uma antologia de poemas recentes considerados já clássicos, o soneto que transcrevo a seguir em seu original, com subsequente versão própria em português. Garanto que procurei saber mais sobre o seu autor, Tim DeMay, com o emprego da internet. Mas não estou seguro de que se trata daquele cujo nome mais aparece nas pesquisas do Google: um professor assistente na Universidade de Maryland (EUA).

Em todo caso, não deixo de expressar a minha surpresa pelo tema inusitado do soneto: fez-me lembrar das aulas de Física no segundo grau, no pré-vestibular e na universidade, com aqueles exercícios maravilhosos dos livros do engenheiro Tore Nils Olof Folmer-Johnson – e suas soluções a empregar vetores em abundância –; dos tomos da série “Fundamentos da Física”, de Ramalho, Ivan, Nicolau e Toledo; assim como de outras obras que ainda hoje estão no mercado, como as de Halliday & Resnick, Tipler etc.

Outra coletânea fantástica era a que exibia exercícios propostos, com suas respostas, elaborada pelos físicos Rozenberg e Gevertz, a açambarcar todos os ramos da Física. Idem, a série de Testes Orientados de Física (TOF).

Bons tempos: ficava enlevado com algumas resoluções. Claro está, bem mais com o próprio cálculo envolvido nas teorias do que com os fenômenos naturais que os modelos procuravam representar, os quais me pareciam de certo modo prosaicos.

Basta de passadismo por ora. Arrematando: perceba o leitor como o vate norte-americano retrata bem alguns arquétipos topológicos da Física, numa mixagem poética de hipóteses e conceitos entre os mais difundidos ao grande público.

J.A.R. – H.C. 

Sonnet nº 6
(Tim DeMay)

“So esoteric!” cried the dismayed child,
A student learning physics formulas.
The teacher turned with chalk in hand and smiled,
“I know you know who Albert Einstein was,

And Schrödinger, and vectors, force and mass,
But look again and give its grace a chance.
See standards, absolutes since eons past,
See stars and planets caught in cosmic dance,

And space is not a stage but moving cloth,
A fabric warped and twisted, stretched and spry,
Each warp concordant with known physics laws,

Each twist a wonder to the learned eye”.
The student left the class with flooded mind,
Stark beauty shown when once he stumbled blind. 



Soneto nº 6
(Tim DeMay)

“Tão esotérico!” exclamou o desalentado petiz,
Um estudante em contato com as fórmulas da Física.
O professor voltou-se com o giz na mão e sorriu,
“Percebo que você conhece quem foram Einstein

E Schrödinger, assim os vetores, a força e a massa,
Mas veja novamente e se dê a graça de uma chance.
Note os padrões, absolutos desde éons transatos,
Veja estrelas e planetas flagrados na dança cósmica,

E o espaço não como paragem, mas urdidura dinâmica,
Um construto túrbido e distorcido, retesado e ágil,
Cada trama de acordo com leis físicas conhecidas,

Cada distorção um portento para olhos versados”.
O estudante deixou a classe com a mente farta,
A impassível beleza se mostrara à sua visão turbada.

Referência:

DeMAY, Tim. Sonnet nº 6. In: McALISTER, Neil Harding (ed.). New classic poems: contemporary verse that rhymes. Illustrated by Jonathan Day. Ontario, CA: Published by Neil Harding  McAlister, 2005. p. 23.

quinta-feira, 26 de junho de 2014

Curtas & Rápidas: 26 de Junho de 2014

Ontem, 25/6/14, o Pleno do STF, retificando a interpretação monocrática anterior de seu Ministro-Presidente, Joaquim Barbosa, à Seção III “ Do Trabalho Externo” da Lei nº 7.210/84 (LEP – Lei de Execuções Penais), deferiu, por 9 x 1 – saindo vencido o Ministro Celso de Mello –, o benefício ao ex-deputado José Dirceu, envolvido no escândalo do Mensalão. A decisão veio sanar um grave defeito no juízo anterior, pois que aquele confere, aparentemente, independência à aplicação do artigo 37 da mencionada LEP, alheadamente ao quanto consta no caput do artigo anterior 36, ambos a compor a Seção III em questão.

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Com efeito, a precitada Seção III não deixa margens de dúvidas de que está tratando, em sua literalidade, de condenados a regime fechado, o que não é caso em questão, assim como de alguns outros mensaleiros que, uma vez absolvidos do delito de “formação de quadrilha” após o julgamento dos embargos infringentes interpostos, tiveram totais de pena enquadráveis no regime semiaberto.

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Para que se possa ratificar a informação, transcrevemos a seção, em seguida, em sua integralidade:

 

SEÇÃO III

 

Do Trabalho Externo

 

Art. 36. O trabalho externo será admissível para os presos em regime fechado somente em serviço ou obras públicas realizadas por órgãos da Administração Direta ou Indireta, ou entidades privadas, desde que tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina.

 

§ 1º O limite máximo do número de presos será de 10% (dez por cento) do total de empregados na obra.

 

§ 2º Caberá ao órgão da administração, à entidade ou à empresa empreiteira a remuneração desse trabalho.

 

§ 3º A prestação de trabalho à entidade privada depende do consentimento expresso do preso.

 

Art. 37. A prestação de trabalho externo, a ser autorizada pela direção do estabelecimento, dependerá de aptidão, disciplina e responsabilidade, além do cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena.

 

Parágrafo único. Revogar-se-á a autorização de trabalho externo ao preso que vier a praticar fato definido como crime, for punido por falta grave, ou tiver comportamento contrário aos requisitos estabelecidos neste artigo.

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Aliás, penso eu, que a interpretação de Barbosa, canhestra como foi para a situação, acabou por deixar os demais ministros do STF numa chicana, pois parte de uma imprensa irresponsável – a que aqui já me referi como prestando um desserviço aos cidadãos deste País, uma vez que mais desinforma que informa, em conformidade a seus interesses mais escusos – tratará de denegrir a imagem dos que, no STF, ficaram, por ora, com a aplicação da lei do modo mais correto e em linha com a pacífica jurisprudência de quem mais convive com ilícitos penais, vale dizer, o STJ.

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Se não for desnecessário afirmar, o STJ parece haver ignorado peremptoriamente a decisão em apreço de Barbosa, haja vista que se estimava que um contingente entre 70 e 100 mil presos deveria, com ela, ser recolhido à prisão. Por aí se vê que a perigosa sanha persecutória de Barbosa, atropelando a lei, em nenhuma medida poderá se alinhar a uma proposta que se pretenda deontológica, a prescrever, como se costuma dizer no Direito, “Fiat Justitia, Pereat Mundus” (“Faça-se justiça, ainda que o mundo pereça”). Ela é, antes de tudo, um Não-Direito!

 

J.A.R. – H.C.

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quarta-feira, 25 de junho de 2014

Curtas & Rápidas: 25 de Junho de 2014

Ainda em complemento às observações de ontem sobre o jogo Brasil 4 x 1 Camarões, faço um comentário mais detido em relação ao jogador Ramires: parece-me que o ex-cruzeirense joga apenas com os pés, sem raciocínio a circular pela cabeça. Já próximo ao final da partida em apreço, quando o placar estava 4 x 1, ele deu um tranco inadjetivável, no setor esquerdo de ataque brasileiro, num defensor de Camarões. Uma coisa absurda, pelos números do jogo e o avançado do cotejo. Confesso que torci para que o juiz lhe desse um amarelo, para ele ficar de fora do próximo embate do Brasil e para ver se tem a capacidade de aprender com a história. Afinal, foi nesse mesmo padrão que, em 2010, ele tomou um segundo amarelo contra o Chile, lá pelos 30 do segundo tempo, numa jogada pela direita, um pouco além do meio de campo brasileiro, quando o placar exibia 3 x 0 – e, por isso, não jogou a partida subsequente contra a Holanda, na qual a seleção foi eliminada.
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Como se vê, trata-se de um jogador perigoso para o treinador: na partida contra o México, todos os observadores notaram que o jogador a substituir seria o Paulinho. Contudo, o Felipão optou por trocá-lo, pois já havia pegado um amarelo e poderia ser expulso. Conclusão: uma substituição não por motivos técnicos, mas por razão bem diversa, que não corrigiu a ineficiência do meio de campo da seleção. O que fazer então com o Ramires? Pelo que vejo, não há solução no domínio do futebol. Afinal, tratar um jogador que, há muito, se mostra desnecessariamente agressivo em campo – quem não se lembra da cotovelada dele no rosto do Verón, na primeira partida das finais da Libertadores de 2009? –, não é tarefa de treinador de futebol, mas de psicólogo!
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Com a derrota da Itália, por 1 x 0, para o Uruguay, já são cinco as seleções europeias matematicamente eliminadas da Copa do Mundo ainda na fase de grupos: Espanha, Inglaterra, Itália, Croácia e Bósnia-Herzegovina. E na “boquinha da garrafa” (rs) ainda estão Portugal e Rússia, que podem elevar a sete esse contingente. Ou seja: sete de treze (53,8%) seleções, se considerarmos a Rússia integralmente na Europa.
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Não obstante, depois de haver presenciado todas as grandes seleções em campo, reputo a Holanda como a mais favorita das favoritas para levar o título. Um futebol sólido e envolvente. Vejamos se o México será capaz de enfrentá-la de igual para igual: será, obviamente, uma partida dura para ambos, pois a seleção mexicana já mostrou a que veio. Venderá excessivamente caro qualquer derrota para quem quer que seja. Com um esquema seguro que povoa excessivamente o meio de campo, muito provavelmente não se lançará a esmo no ataque, oferecendo o contra-ataque à Holanda. Será, penso eu, um jogo de poucos gols e a ser definido nos detalhes.

Ramires em Ação

J.A.R. – H.C.
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terça-feira, 24 de junho de 2014

Curtas & Rápidas: 24 de Junho de 2014

O jogo de ontem entre Brasil 4 x 1 Camarões, pela terceira rodada da Copa do Mundo, evidenciou, com mais nitidez, a má fase do meia Paulinho, que não atuou bem em nenhuma das três partidas da seleção nacional. Substituído por Fernandinho, deu azar, pois este se mostrou bem mais efetivo, marcando, inclusive, o quarto gol do Brasil e quinto do cotejo. Conclusão: ou melhora ou sai definitivamente do time. Fosse eu o treinador, já o teria sacado.
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Outro problema grave do time é a deficiência patente dos dois laterais em marcar bem os adversários; afinal, os laterais são, primeiramente, defensores, e só subsidiariamente apoiadores. Com efeito, a deficiência de ambos, Daniel Alves e Marcelo, compromete o miolo da zaga, que se vê, com frequência, exposto ao embate direto com os atacantes. Para ilustrar: os dois gols tomados pelo Brasil, até aqui, saíram ambos pela direita, onde o lateral Daniel Alves revela toda a sua incapacidade para marcar bem. Ontem, do modo como ele retornou para o segundo tempo, muito provavelmente levou “uma chamada geral” do técnico Felipão, com o que se mostrou mais concentrado no seu primeiro ofício. Para jogos mais sérios, doravante, talvez fosse melhor se pensar em substituí-lo por Maicon, mais marcador.
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A revista Veja, há décadas um reduto contrário ao Partido dos Trabalhadores, abusa em sua renhida luta contra a própria lógica dos fatos, como que a julgar os leitores incapazes de validar o discurso ante o que se vê na realidade. Esta é a manchete de capa desta semana (25.6.14): “Só Alegria Até Agora – Um festival de gols nos gramados, menos pessimismo nas pesquisas, mais consumo, visitantes em festa e o melhor é aproveitar, pois legado duradouro, esqueça”. Tal é o tom com que a parte mais conservadora (um adjetivo eufemístico, é claro!) da imprensa, meses atrás, tentou desconstruir o evento, em busca de angariar explícitos dividendos políticos. Como não o conseguiu, projeta inflexões futuras no mínimo duvidosas. Pergunte-se à grande massa de torcedores corintianos se o legado do Itaquerão não veio para ficar! O mesmo se poderá dizer da Arena da Baixada, do Beira-Rio e das outras nove praças que tiveram seus estádios construídos ou reconstruídos para a Copa. E mais: o que se dirá das reformas dos aeroportos do país? O de Brasília não ficou nada a dever aos melhores aeroportos do mundo. Os turistas vão mesmo levar isso consigo? Menos, Veja, menos...
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Uma última rapidinha para rir um bocado: ainda há pouco, um colega veio até mim, dando-me a certeza de que o Brasil será mesmo hexacampeão de futebol. Disse-me ele que nenhuma seleção, exceto a Canarinho, possui três super-heróis em seus quadros: temos o Hulk, o Super-Homem – claro, o Neymar Jr. – e o Homem Invisível – nada menos que o Fred! Informei-lhe que o Paulinho seria mais merecedor da metáfora do Homem Invisível: não se vê o futebol do rapaz! Parece que desaprendeu lá pelas terras inglesas.


Os Nossos Super-Heróis

J.A.R. – H.C.
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segunda-feira, 23 de junho de 2014

Edgar Allan Poe – Silêncio

Transcrevemos nesta postagem mais um poema de Edgar Allan Poe, o poeta tantas vezes apresentado em daguerreótipos e, em décadas mais recentes, em “tattoos” padronizados, como o que abaixo expomos.

Em soneto atípico, com um verso além dos quatorze padronizados, Poe parece sublinhar as propriedades de determinadas realidades, como a luz, que, tal qual sabemos das abordagens teóricas da física quântica, ora se manifesta como “partículas” ou “pacotes” de matéria (quanta) ora como onda eletromagnética pura.

Poderíamos, sob esse contexto, ir um pouco mais além do campo de inferências do próprio autor: o das hipóteses gestálticas, para as quais o todo é maior que a soma das partes, com singularidades e particularidades que lhe são ontologicamente inerentes.

Fala-nos ele de como a vida se organiza pela junção de pequenas coisas que se associam e formam esse “puzzle” que é o universo inteiro, recheado de dualidades, como as luzes e as sombras, a que tanto recorre o poeta em suas criações: corpo e alma, mar e terra, vida e morte!

Há o silêncio que sobrevém à morte e é a ele que Poe se reporta em seus versos finais, quando comenta sobre a recordação dos finados e a erva recente que a tudo recobre  um “silêncio corpóreo” que a mais ninguém amedronta.

Poe, em contraste à morte, enquanto força a não ser temida, opõe a dor da solidão e do isolamento, esta sim com poder para produzir um silêncio bem mais devastador, como consequência da fatalidade de um destino para o qual se recomenda, desde logo, encomendar a alma a Deus!

Um final de poema bem ao gosto saturnino do norte-americano!

J.A.R. – H.C. 
Edgar Allan Poe
(Tattoo Design)

Silence

There are some qualities − some incorporate things,
That have a double life, which thus is made
A type of that twin entity which springs
From matter and light, evinced in solid and shade.

There is a two-fold Silence − sea and shore −
Body and soul. One dwells in lonely places,
Newly with grass o’ergrown; some solemn graces,
Some human memories and tearful lore,

Render him terrorless: his name’s “No More”.
He is the corporate Silence: dread him not!
No power hath he of evil in himself;

But should some urgent fate (untimely lot!)
Bring thee to meet his shadow (nameless elf,
That haunteth the lone regions where hath trod

No foot of man), commend thyself to God!

Le Silence
(Odilon Redon: 1840-1916)

Silêncio

Há qualidades incorpóreas, de existência
dupla, nas quais segunda vida se produz,
como a entidade dual da matéria e da luz,
de que o sólido e a sombra espelham a evidência.

Há pois, duplo silêncio; o do mar e o da praia,
do corpo e da alma; um, mora em deserta região
que erva recente cubra e onde, solene, o atraia
lastimoso saber; onde a recordação

o dispa de terror; seu nome é “nunca mais”;
é o silêncio corpóreo. A esse, não temais!
Nenhum poder do mal ele tem. Mas, se uma hora

um destino precoce (oh, destinos fatais!)
vos levar às regiões soturnas, que apavora
sua sombra, elfo sem nome, ali onde humana palma

jamais pisou, a Deus recomendai vossa alma!

Referência:

POE, Edgar Allan. Silêncio. In: __________. Poemas e Ensaios. Tradução de Osmar Mendes e Milton Amado. 3. ed. São Paulo: Globo, 1999. p. 48.

domingo, 22 de junho de 2014

Um Saco de Gatos: Poesia, Ciência, Filosofia e Teologia

Num interessante poema do novelista italiano Ennio Flaiano, tem-se a caracterização do que se seriam, em grandes linhas, os padrões de método e de raciocínio da Ciência, da Filosofia e da Teologia, três instâncias do humano que, inúmeras vezes, acabam por divergir sobre o mesmo tema.

No caso, o assunto é um simples gato num compartimento escuro: o cientista, segundo Flaiano, por meio de experimentos e empregando um método dedutivo, infere que, sendo o quarto escuro, o gato também o é, talvez querendo o poeta, dessa maneira, aludir ao caráter precário das teorias científicas, válidas até que refutáveis por um caso concreto que as contraria, tal como o propôs o teórico vienense Karl Popper por meio de sua “tese da falseabilidade”, na linha do positivismo lógico.

O filósofo, por sua vez, emprega a lógica nos raciocínios para perseguir o mesmo gato, felino que, para Flaiano, não existe, o que denuncia níveis de elucubrações para além do mundo tangível, ou como se diz no próprio ramo da Filosofia, na esfera da Metafísica.

Já o teólogo, também “navegando” na imaterialidade da Metafísica, busca alcançar o mesmo gato, e afirma que o encontrou mesmo que não o tenha avistado, ou melhor, lhe posto as mãos sobre o torso: trata-se de uma questão de fé, pela adoção de propostas dogmáticas.

Vamos ao poema...

Ennio Flaiano
(1910-1972)

Il Gatto

Lo Scienziato cerca un gatto,
un gatto nascosto
in una stanza buia.
Non lo trova ma…
ma ne deduce che è nero.

Il Filosofo cerca un gatto,
un gatto che non c’è
in una stanza buia.
Non lo trova ma…
ma continua a cercare.

Il Teologo, oh il Teologo
cerca lo stesso gatto.
Non lo trova ma…
ma dice di averlo trovato.



O Gato

O Cientista procura por um gato,
um gato escondido
num quarto escuro.
Não o encontra, mas...
ainda assim deduz que é negro.

O Filósofo procura por um gato,
um gato que não existe
num quarto escuro.
Não o encontra, mas...
ainda assim continua a procurar.

O Teólogo, oh o Teólogo
procura pelo mesmo gato.
Não o encontra, mas...
ainda assim afirma que o encontrou.

Ainda há mais, contudo: Jorge Wagensberg vislumbra diferenças entre a Ciência, cuja fronteira se conforma ao dilema do que seja verdadeiro em contraposição ao falso, e a Ética, ramo da Filosofia, que busca separar o bom e o mau. E o que seria, então, a Ética Científica? Segundo o autor espanhol, uma “complexa combinação de verdadeiro, falso, bom e mau”:

A ciência é uma questão de fronteira, da fronteira que separa o verdadeiro do falso. A ética é uma questão de fronteira, mas da que separa o bom do mau. E a ética científica é uma questão de fronteira, da complexa combinação de verdadeiro, falso, bom e mau. Há conceitos simples com fronteiras nítidas (como as categorias no boxe olímpico: um peso-galo pode passar a peso-mosca só porque perde 1 grama de peso) e conceitos menos simples com fronteiras difusas (se arrancarmos os cabelos de um indivíduo um a um, a partir exatamente de qual pelo retirado ele se tornará calvo?). Para organizar nossa convivência cotidiana, precisamos de conceitos nítidos. A má notícia é que tudo o que afeta questões morais é complexo e difuso. Desmoralizamo-nos?

Talvez não, porque o grande desafio de uma ética científica não consiste em determinar com precisão onde estão suas fronteiras, mas sim em não as pisar. Quiçá seja a base da ética científica moderna: substituir as nunca bem conhecidas fronteiras difusas (reais) por algumas fronteiras nítidas (ideais) que sempre podem ser pactuadas. O compromisso é duplamente delicado porque, de um lado, ambas as fronteiras, as reais e as ideais, devem estar ao mesmo tempo perto o bastante e longe o bastante entre si. Longe o bastante para reduzir o risco de que alguém, por erro ou deslize, viole a difusa fronteira real. E perto o bastante para averiguar o conhecimento fronteiriço e seu possível benefício. Também é delicado porque as fronteiras do verdadeiro e do falso se movem muito mais rapidamente que as do bom e do mau. Como enfrentar tanta delicadeza? Habitando a fronteira (a fronteira não é terra de ninguém nem de nada, é terra de tudo). E por conversação, por delicada conversação massiva entre as investigações e as crenças que passeiam por elas (WAGENSBERG, 2009, p. 260-261).

O argumento de Wagensberg, aparentemente, passa por um consenso, em especial sobre os impasses da bioética, do emprego de células-tronco ou de outros que tais.

E noutra linha de embates, aparecem os assim chamados “Cavaleiros do Ateísmo” – Christopher Hitchens, Daniel Dennett, Richard Dawkins e Sam Harris, são os nomes dos que me lembro de imediato –, a rejeitarem quaisquer fundamentos de ordem religiosa nos métodos para o conhecimento do mundo,  pois julgam poder explicar o domínio fenomênico tão apenas por meio da Ciência.

Pergunto eu, em meus limitados conhecimentos: seriam eles – e os cientistas, por extensão – assim tão capazes? Para que o leitor tenha noção dos argumentos levantados por tais autores, posto o vídeo abaixo, que, a meu ver, padece contudo de contra-argumentação, pois são os “quatro cavaleiros” dialogando pacificamente por uma mesma linha de raciocínio, sem réplicas.

J.A.R. – H.C.
Os Quatro Cavaleiros do Ateísmo

Referência:

FLAIANO, Ennio. Opere scelte. A cura di Anna Longoni. 2. ed. Milano, IT:  Adelphi, 2010. p. 1127.

WAGENSBERG, Jorge. O gozo intelectual: teoria e prática sobre a inteligibilidade e a beleza. Tradução: Simone Mateos. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2009.
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