Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 22 de março de 2013

Alta Literatura - Goethe - "Proémio"

                           
                                   

                       Proémio

Em nome daquele que a si mesmo se criou!
De toda eternidade em ofício criador;
Em nome daquele que toda a fé formou,
Confiança, atividade, amor, vigor;
Em nome daquele que, tantas vezes nomeado,
Ficou sempre em essência imperscrutado:

Até onde o ouvido e o olhar alcançam,
A ele se assemelha tudo o que conheces,
E ao mais alto e ardente voo do teu spírito
Já basta esta parábola, esta imagem;
Sentes-te atraído, arrastado alegremente,
E, onde quer que vás, tudo se enfeita em flor:
Já nada contas, nem calculas já o tempo,
E cada passo teu é já imensidade.

Que Deus seria esse então que só de fora impelisse,
E o mundo preso ao dedo em volta conduzisse!
Que Ele, dentro do mundo, faça o mundo move-se,
Manter Natureza em Si, e em Natureza manter-Se,
De modo que ao que nele viva e teça e exista
A sua força e o seu gênio assista.

Dentro de nós há também um Universo;
Daqui nasceu nos povos o louvável costume
De cada qual chamar Deus, mesmo o seu Deus,
A tudo aquilo que ele de melhor em si conhece,
Deixar à Sua guarda céu e terra.
Ter-lhe temor, e talvez mesmo – amor.

Referência:

GOETHE, J. W. Proémio. In: __________. Poemas - Antologia. Versão Portuguesa, Notas e Comentários: Paulo Quintela; 4. ed. Coimbra: Centelha – Promoção do Livro, SARL, 1986. Poesia / Autores Universais - 1. p. 227 e 229.

H.C./J.A.R.

Ivan Goncharov - Simbirsk (Nome Atual: Ulyanovsk)


ULYANOVSK - RÚSSIA

"Um amante da comodidade, que fosse, talvez tivesse dado de ombros depois de olhar aquela aparente confusão de móveis, pinturas antigas, estátuas sem braços e pernas, estampas e bijuterias, frequentemente de nenhum valor, mas que constituíam caras recordações. Talvez, inúmeras vezes, os olhos de um especialista se iluminassem pela cobiça sob a visão da imagem disto ou daquilo, deste ou daquele livro amarelado pelo tempo, uma porcelana antiga, uma pedra, uma moeda. Mas, entre os móveis e as fotos de diferentes épocas, incluindo aqueles de má qualidade que não significavam nada para ninguém, mas que, para eles, sublinhavam a lembrança de momentos felizes, instantes memoráveis no oceano de livros e partituras, pairava o ar de uma respiração morna da vida, algo que estimulava o intelecto e o sentido estético; onde quer que fosse sentia-se um pensamento de vigília ou a beleza resplandecente da atividade humana, bem como em redor brilhava o eterno encanto da natureza".

('Oblomov' - Ivan Goncharov - Escritor Russo)

quarta-feira, 20 de março de 2013

Criação Vernacular



O Poder da Palavra


Mundo sem livros,

orbe sem palavras?...


O que restaria

senão o céu exposto ao vácuo;

se tudo veio do vernáculo,

do imperativo verbal?


A luz,

para iluminar o plano das páginas.


O texto inteligível e indelével,

para impressionar a mente.


A beleza,

a suportar o prazer

do espírito que perscruta

os quatro cantos do universo.


Tragam-me aqui

todas as obras concebidas pelo

sopro criador da pena,

que lhes mostrarei

como uma vida significativa

pode comparar-se à felicidade

sem embaraços!


H.C. – J.A.R.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Milan Kundera - Brno


BRNO - REPÚBLICA TCHECA

“A vida humana é composta como uma partitura musical. O ser humano, guiado pelo sentido da beleza, transpõe o acontecimento fortuito (uma música de Beethoven, a morte numa estação) para fazer disso um tema que, em seguida, fará parte da partitura de sua vida. Voltará ao tema, repetindo-o, modificando-o, desenvolvendo-o e transpondo-o, como faz um compositor com os temas de sua sonata. Anna poderia ter posto fim a seus dias de outra maneira. Mas o tema da estação e da morte, esse tema inesquecível associado ao nascimento do amor, atraiu-a no momento do desespero por sua sombria beleza. O homem inconscientemente compõe sua vida segundo as leis da beleza mesmo nos instantes do mais profundo desespero.
O romance não pode, portanto, ser censurado por seu fascínio pelos encontros misteriosos dos acasos (como o encontro de Vronsky, de Anna, da estação e da morte, ou o encontro de Beethoven, de Tomas, de Tereza e do copo de conhaque), mas podemos, com razão, censurar o homem por ser cego a esses acasos na vida quotidiana, privando assim a vida da sua dimensão de beleza”.

('A Insustentável Leveza do Ser' - Milan Kundera - Escritor Tcheco)

P.s.: A seleção do excerto acima ilustra um fato até certo modo recorrente na escrita de Kundera, a saber, a metalinguagem, a literatura em volta ao próprio umbigo, a referência explícita ao drama vivido por Anna Karenina no romance de Tolstói, e por fim, para não cumprir a regra, a própria realidade histórica - e portanto não romanesca - da morte deste último numa estação de trem.

H.C. - J.A.R.

terça-feira, 12 de março de 2013

Robert Musil - Klagenfurt



KLAGENFURT - ÁUSTRIA

“A corrente e pulsação que fluem sem cessar através de todas as coisas que nos rodeiam parará por um momento. Eu sou apenas casual, troçava a Necessidade; não pareço essencialmente diferente do rosto de um doente de lúpus, quando me contemplam sem preconceito, admitiu a Beleza. No fundo, não era preciso muita coisa; um verniz caíra, uma ilusão caíra, um traço de hábito, expectativa e tensão se rasgara, um equilíbrio fluido e secreto entre sentimento e mundo inquietara-se por um segundo. Tudo o que sentimos e fazemos acontece de certa forma ‘na direção da vida’, e o menor movimento para fora dessa direção é difícil ou assustador. É assim até quando caminhamos: erguemos o centro de gravidade, empurramo-lo para diante e o deixamos cair; mas uma diminuta mudança, um pouco de receio desse lançar-se-no-futuro,ou simplesmente o espanto por fazermos isso, e já não podemos ficar em pé! É melhor não refletir”.

(O Homem Sem Qualidades - Robert Musil - Escritor Austríaco)

quinta-feira, 7 de março de 2013

Pichações com Algo Mais

Tenho visto nos últimos meses algumas pichações, especialmente em tapumes de obras e em entradas ou saídas de passarelas a atravessarem o Eixo Norte-Sul de Brasília (DF), em que os autores não se limitam a rabiscar paredes ou fachadas de edifícios, mas procuram expor algo mais ao público, como a mensagem que capturei na câmera fotográfica de meu celular e que ora lhes apresento:


"As Jóias da Coroa de Édipo Rei São os Olhos da Cara"

Claro está que o autor conhece o enredo da peça Édipo Rei, de Sófocles. Por trás do trocadilho mais explícito quanto ao caráter excessivamente oneroso da coroa que Édipo ostenta em sua cabeça, encontra-se, evidentemente, a nota singular de que Édipo, ao tornar-se consciente do cumprimento dos vaticínios de Tirésias, perfura os próprios olhos ao reconhecer haver praticado os interditos do incesto e do parricídio.

E esse é o lado mais pungente do enredo para aquele que tudo decidiu pensando que o seu destino somente a si próprio pertencia. Ou seja: a vetusta antinomia Destino x Livre Arbítrio!

J.A.R. - H.C.

terça-feira, 5 de março de 2013

Goethe - Frankfurt am Main - "Testamento"



FRANKFURT AM MAIN - ALEMANHA

Testamento

Ser algum pode em nada desfazer-se!
Em todos eles se agita sempre o Eterno.
Confia, alegre e feliz, sempre no Ser!
Que o Ser é eterno: – existem leis
Para conservar vivos os tesouros
Dos quais o Universo se adornou.

O verdadeiro foi há muito achado,
Uniu em aliança nobres spíritos,
O velho verdadeiro – a ele te agarra!
Por ele sê grato, filho da Terra, ao Sábio
Que em torno ao Sol o caminho mostrou
A ela e aos outros seus irmãos.

A seguir volta os olhos para dentro,
É lá que o centro encontrarás
De que nobre algum poderá duvidar.
Nenhuma regra ali te falhará:
Pois a consciência independente
É o sol do teu dia moral.

Nos sentidos tens depois de confiar;
Nada de falso eles te fazem ver
Se a tua razão te conservar desperto.
Com vivo olhar observa alegremente,
E percorre, a passo firme e dúctil,
Os espaços de um mundo repleto de riquezas.

Modrado goza abundância e bênçãos;
Seja a Razão presente em toda a parte
Onde a Vida se alegra de ser Vida.
Então é o passado duradouro,
O futuro antecipadamente vivo,
E o momento presente é Eternidade.

E se enfim assim o conseguires
E stiveres repassado do sentir: –
Só o que é fecundo é que é verdade –
Vês e pesas então o agir da turba,
Terá ela de andar à sua moda,
Tu, vai juntar-te ao mais pequeno número.

E como desde sempre, em seu secreto,
O Filósofo criou e o Poeta
Obra de amor que eles elegeram,
Assim alcanças tu o bem supremo:
Pois pré-sentir às almas nobres
É o mais desejável dos ofícios.

Referência:

GOETHE, J. W. Testamento. In: __________. Poemas - Antologia. Versão Portuguesa, Notas e Comentários: Paulo Quintela; 4. ed. Coimbra: Centelha – Promoção do Livro, SARL, 1986. Poesia / Autores Universais - 1. p. 233 e 235.

segunda-feira, 4 de março de 2013

Túnel do Tempo - Lá Pelos Fins dos Anos 60

Olha eu aí quando era pequeno! Deu um trabalho imenso recuperar essa foto, porque já estava amarelecida e com muitas manchas. Mas o resultado foi compensador, imagino!



Olhando-a, perguntei-me sobre o que poderia estar pensando durante essa fase da vida: quase nada de importante, não é mesmo?!

J.A.R./H.C.

sexta-feira, 1 de março de 2013

Octavio Paz - México (DF)



MÉXICO (DF) - MÉXICO

"Analogia: o poema é um caracol onde ressoa a música do mundo; métricas e rima mais não são do que correspondências, ecos, da harmonia universal. Ensinamento, moral, exemplo, revelação, dança, diálogo, monólogo. Voz do povo, língua dos escolhidos, palavra do solitário. Pura e impura, sagrada e maldita, popular e minoritária, coletiva e pessoal, nua e vestida, falada, pintada, escrita, ostenta todos os rostos, porém há quem afirme que não possui nenhum: o poema é uma máscara que oculta o vazio, formosa prova da supérflua grandeza de toda obra humana!".

('Poesia e Poema', em 'O Arco e a Lira' - Octavio Paz - Escritor Mexicano)

Virginia Woolf - Londres



LONDRES - INGLATERRA

“Foi um sentimento assim de integração que talvez a tenha feito dizer, há dez anos, de pé quase exatamente no mesmo lugar em que estava agora, que deveria estar enamorada do lugar. Esse sentimento poderia expressar-se sob milhares de formas. Talvez houvesse amantes cujo dom era relacionar os elementos da realidade e uni-los, dando-lhes uma completude que não haviam possuído na vida, transformando uma paisagem ou um encontro entre pessoas (que agora eram parte do passado, totalmente desconexas) numa dessas coisas globais e compactas nas quais o pensamento se detém e com as quais o amor brinca”.

('Rumo ao Farol' - Virginia Woolf - Escritora Inglesa)