Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 30 de junho de 2017

Brasileirão 2017 – 10ª Rodada – ‎Projeções do Modelo Esotérico-Matemático (MEM)‎

Abaixo apresento as projeções do MEM, conjuntamente a outras informações de ‘sites’ especializados no cálculo de probabilidades no futebol, depois de transcorridas as dez primeiras rodadas do Campeonato Brasileiro de 2017 (Série A).

Somente uma pergunta, sabe-se lá se oportuna: conseguirá o Corinthians manter o excepcional desempenho apresentado até aqui, pelo resto do certame? Sem querer desmerecer ninguém, é óbvio, mas muito me surpreende o Timão estar onde está, tão na frente dos outros, pois em seu elenco, como se pode ratificar, não constam jogadores excepcionais.

Ainda há muita água para passar debaixo da ponte: agora que transcorreu pouco mais de ¼ do número de rodadas e algumas equipes, notoriamente, ainda estão se ajustando. Contudo, parece-me que o título não deva mesmo ficar distante dos que, hoje, estão entre os quatro primeiros, quais sejam, Corinthians, Grêmio, Flamengo e Palmeiras.

Veremos...

J.A.R. – H.C.

Fontes:


Mário de Andrade - Vou-me Embora

Quem não haveria de se lembrar, depois de ler o poema abaixo, do famoso poema “Vou-me embora pra Pasárgada”, de Manuel Bandeira, esse imaginário idílico de prazer e bem-estar que o poeta concebeu em hipotéticas paragens?!

E observemos bem: Andrade espera escapar para Belém que, imagino, deva ser a capital do Pará, onde esteve em visita por volta da segunda metade dos anos 20 do século passado. Aliás, tal como o próprio Manuel Bandeira.

Outra nota: enquanto o poema de Bandeira apareceu em “Libertinagem”, de 1930, o de Andrade fez parte da obra “O Carro da Miséria”, de 1947. É possível, portanto, que este tenha sido influenciado por aquele. Ou ainda: seja um fenômeno mais ou menos explícito de intertextualidade.

J.A.R. – H.C.

Mário de Andrade
(1893-1945)

Vou-me Embora

Vou-me embora vou-me embora
Vou-me embora pra Belém
Vou colher cravos e rosas
Volto a semana que vem

Vou-me embora paz da terra
Paz da terra repartida
Uns têm terra muita terra
Outros nem pra uma dormida

Não tenho onde cair morto
Fiz gorar a inteligência
Vou reentrar no meu povo
Reprincipiar minha ciência

Vou-me embora vou-me embora
Volto a semana que vem
Quando eu voltar minha terra
Será dela ou de ninguém.

Em: “O Carro da Miséria” (1947)

Natureza-morta com tulipas, rosas e cravos
(Nicolaes van Veerendael: pintor flamengo)

Referência:

ANDRADE, Mário. Vou-me embora. In: RIEDEL, Dirce; LEMOS, Carlos; BARBIERI, Ivo; CASTRO, Therezinha (Orgs.). Literatura brasileira em curso. Rio de Janeiro, GB: Edições Bloch, 1968. p. 87.

quinta-feira, 29 de junho de 2017

John Ashbery - A Melhoria

As coisas mudam rápida e incessantemente, a vida aí considerada, tudo envolto num processo complexo, impenetrável e intrigante, com matizes negativos e positivos. Se é que a vida tem um sentido, qual seria ele? Até esse ponto o poema nos transporta, sem oferecer respostas infalíveis.

Mesmo que tudo pareça familiar, nada é tão trivial, e o poeta tenta assimilar o choque de acordar frente ao ordinário. Espera ele pela renovação do mundo, nem que, para tanto, tenha-se que retornar ao ponto de origem.

J.A.R. – H.C.

John Ashbery
(n. 1927)

The Improvement

Is that where it happens?
Only yesterday when I came back, I had this
diaphanous disaffection for this room, for spaces,
for the whole sky and whatever lies beyond.
I felt the eggplant, then the rhubarb.
Nothing seems strong enough for
this life to manage, that sees beyond
into particles forming some kind of entity –
so we get dressed kindly, crazy at the moment.
A life of afterwords begins.

We never live long enough in our lives
to know what today is like.
Shards, smiling beaches,
abandon us somehow even as we converse with them.
And the leopard is transparent, like iced tea.

I wake up, my face pressed
in the dewy mess of a dream. It mattered,
because of the dream, and because dreams are by nature sad
even when there’s a lot of exclaiming and beating
as there was in this one. I want the openness
of the dream turned inside out, exploded
into pieces of meaning by its own unasked questions,
beyond the calculations of heaven. Then the larkspur
would don its own disproportionate weight,
and trees return to the starting gate.
See, our lips bend.

Jardim de delfínios róseos e azuis
(Laurie Rohner: pintora norte-americana)

A Melhoria

Aí é onde acontece?
Somente ontem, quando retornei, tive essa
diáfana insatisfação por este cômodo, pelos espaços,
pelo céu inteiro e tudo o que se encontre mais além.
Senti a berinjela, logo depois o ruibarbo.
Nada parece forte o bastante para que
esta vida seja bem-sucedida, para que alcance o interior
das partículas a compor um certo tipo de entidade
então nos vestimos amavelmente, loucos pelo momento.
E uma vida de epílogos começa.

Nunca vivemos o suficiente em nossas vidas
para saber como é o dia de hoje.
Estilhaços, praias risonhas,
abandonam-nos de alguma forma, mesmo quando com eles
conversamos.
E o leopardo é transparente, como um chá gelado.

Desperto, meu rosto premido
pela desordem orvalhada de um sonho. Era algo importante,
quer pelo próprio sonho, quer porque os sonhos são tristes
por natureza,
mesmo quando há um monte de exclamações e batidas,
tal como ocorrera neste. Espero que a compreensão
do sonho ocorra de dentro para fora, detonada
em nacos de significados por suas próprias perguntas não
formuladas,
para além dos cálculos celestes. Então o delfínio
se envolveria em seu próprio peso desproporcional,
e as árvores retornariam ao ponto de partida.
Veja, nossos lábios se dobram.

Referência:

ASHBERY, John. The improvement. In: PINSKY, Robert; DIETZ, Maggie (Eds.). American’s favorite poems: the favorite poem project anthology. New York, NY: W. W. Norton, 2000. p. 11.

quarta-feira, 28 de junho de 2017

José Martí - Homens de Mármore

Vamos a um passeio por um sonho, ou a uma visão que sobreveio nalgum momento da noite ao poeta e político cubano, contendo manifesto discurso onírico sobre o heroico, eis que o sujeito lírico imagina-se em frente a esculturas de mármore de protagonistas importantes da história nacional.

O poeta não apenas desperta aos poucos as figuras de pedra, como também lhes serve como um mensageiro, um intermediário que volta a narrar o que já outros têm dito sobre fatos do percurso pátrio, culminando com a incisiva declaração de que não há heróis entre os vivos, haja vista que envoltos em negócios abjetos.

J.A.R. – H.C.

José Martí
(1853-1895)

Hombres de Mármol

Sueño con claustros de mármol
donde en silencio divino
los héroes, de pie, reposan:
¡de noche, a la luz del alma,
hablo con ellos: de noche!
Están en fila: paseo
entre las filas: las manos
de piedra les beso: abren
los ojos de piedra: mueven
los labios de piedra: tiemblan
las barbas de piedra: empuñan
la espada de piedra: lloran:
¡Vibra la espada en la vaina!
¡Mudo, les beso la mano!

¡Hablo con ellos, de noche!
Están en fila: paseo
entre las filas: lloroso
me abrazo a un mármol: ¡Oh mármol,
dicen que beben tus hijos
su propia sangre en las copas
venenosas de sus dueños!
¡Que hablan la lengua podrida
de sus rufianes! ¡Que comen
juntos el pan del oprobio
en la mesa ensangrentada!
¡Que pierden en lengua inútil
el último fuego! ¡Dicen,
oh mármol, mármol dormido,
Que ya se ha muerto tu raza!

Échame en tierra de un bote
el héroe que abrazo: me ase
del cuello: barre la tierra
con mi cabeza: levanta
el brazo, ¡el brazo le luce
lo mismo que un sol!: resuena
la piedra: buscan el cinto
las manos blancas: ¡del soclo
saltan los hombres de mármol!

(Versos Sencillos, XLV)

Sarcófago Romano
(Detalhe)

Homens de Mármore

Sonho com claustros de mármore
onde em silêncio divino
repousam heróis, de pé.
De noite, aos fulgores da alma,
falo com eles, de noite.
Estão em fila; passeio
Por entre as filas; as mãos
de pedra lhes beijo; entreabrem
os olhos de pedra; movem
os lábios de pedra; tremem
as barbas de pedra; choram;
vibra a espada na bainha!
Calada lhes beijo as mãos.

Falo com eles, de noite.
Estão em fila; passeio
por entre as filas; choroso
me abraço a um mármore. – “Ó mármore,
dizem que bebem teus filhos
o próprio sangue nas taças
envenenadas dos déspotas!
Que falam a língua torpe
dos libertinos! Que comem
reunidos o pão do opróbrio
na mesa tinta de sangue!
Que gastam em parolagem
as últimas fibras! Dizem,
ó mármore adormecido,
que tua raça está morta!”

Atira-me à terra súbito,
esse herói que abraço; agarra-me
o pescoço; varre a terra
com meus cabelos; levanta
o braço; fulge-lhe o braço
semelhante a um sol; ressoa
a pedra; buscam a cinta
as mãos diáfanas; da peanha
saltam os homens de mármore!

(Versos Simples, XLV)

Referências:

Em Espanhol

MARTÍ, José. Hombres de mármol. In: __________. Versos sencillos. Obras completas: v. XI. La Habana, CU: Cultural, 1928. p. 105.

Em Português

MARTÍ, José. Homens de mármore. In: LISBOA, Henriqueta (Org.). Antologia escolar de poemas para a juventude. Rio de Janeiro, RJ: Ediouro - Tecnoprint, 1981. p. 113.

terça-feira, 27 de junho de 2017

Alphonsus de Guimaraens - Soneto

Tantas vezes intitulado em antologias como “Deus dentro de nós”, este poema do grande poeta simbolista mineiro resenha a ideia bíblica contida no Evangelho de Lucas, segundo a qual o “o reino de Deus está dentro de vós”, e não nas externalidades das coisas do mundo (Lc. 17: 20,21).

Segundo Guimaraens, mesmo o mais ímpio dos homens é capaz de pressentir o espírito divino que paira sobre a criação, esse portentoso engenho cujos mistérios ainda estamos muito longe de desvendar.

J.A.R. – H.C.

Alphonsus de Guimaraens
(1870-1921)

Soneto

Deus é a luz celestial que os astros unge e veste,
E dessa eterna luz nós todos fomos feitos.
Um fulgor de orações brilha nos nossos peitos:
É o reflexo estelar dessa origem celeste.

O homem mais louco e vil, cuja alma ímpia se creste
Aos fogos infernais dos mais torpes defeitos,
De vez em quando sente esplendores eleitos,
Que tombam nele como o luar sobre um cipreste.

Quem não sentiu no peito a carícia divina,
A enchê-lo de clarões na transparência hialina
De um astro que cintila em pleno azul sem véus?

Tudo é luz na nossa alma, e o mais vil, o mais louco,
Bem sabe que esta vida é um sol que dura pouco
E que Deus vive em nós como dentro dos céus...

As Cores da Vida
(Chuck Pinson: pintor norte-americano)

Referência:

GUIMARAENS, Alphonsus. Soneto. In: LISBOA, Henriqueta (Org.). Antologia escolar de poemas para a juventude. Rio de Janeiro, RJ: Ediouro - Tecnoprint, 1981. p. 53. (Coleção Prestígio)

segunda-feira, 26 de junho de 2017

Mary Oliver - O Dia de Verão

Num dia qualquer de verão, a poetisa percebe a naturalidade dos movimentos de um gafanhoto que emerge da grama, fazendo aflorar o colorido, o brilho e a beleza do mundo à sua volta. E quem terá concebido este mundo? – pergunta-se: cisne, urso negro, vida selvagem.

Deverá ele ser objeto de devoção, mesmo sabendo que tudo pode estar por um minuto apenas. Por conseguinte, sendo curta a vida, urge apreciar cada dia que nós é franqueado, desfrutando o sol de verão, um passeio pelos campos ou outro mister que nos gratifique, num modo de ser espiritualizado frente às circunstâncias tangíveis a que estamos expostos.

J.A.R. – H.C.

Mary Oliver
(n. 1935)

The Summer Day

Who made the world?
Who made the swan, and the black bear?
Who made the grasshopper?
This grasshopper, I mean –
the one who has flung herself out of the grass,
the one who is eating sugar out of my hand,
who is moving her jaws back and forth instead of up and down
who is gazing around with her enormous and complicated eyes.
Now she lifts her pale forearms and thoroughly washes her face.
Now she snaps her wings open, and floats away.
I don’t know exactly what a prayer is.
I do know how to pay attention, how to fall down
into the grass, how to kneel down in the grass,
how to be idle and blessed, how to stroll through the fields,
which is what I have been doing all day.
Tell me, what else should I have done?
Doesn’t everything die at last, and too soon?
Tell me, what is it you plan to do
with your one wild and precious life?

Caminhando no campo
por uma trilha iluminada pelo sol
(Andreas Schelfhout: pintor holandês)


O Dia de Verão

Quem criou o mundo?
Quem concebeu o cisne e o urso negro?
Quem idealizou o gafanhoto?
Explico-me melhor, este gafanhoto –
o que se arremessou para fora da grama,
o que está comendo açúcar de minha mão,
o que move suas maxilas para trás e para frente
em vez de para cima e para baixo
o que olha ao redor com seus enormes e complicados olhos.
Agora levanta seus antebraços pálidos e lava o rosto
completamente.
Logo agita suas asas e voa para longe.
Não sei exatamente o que é uma oração.
Sei como prestar atenção, como cair
sobre a grama, como ajoelhar-me sobre ela,
como ser indolente e abençoada, como passear pelos campos,
que é o que tenho estado a fazer todo o dia.
Diga-me, o que mais deveria eu ter feito?
Tudo não expira ao final, e tão prontamente?
Diga-me, o que você planeja fazer
com a sua preciosa, selvagem e única vida?

Referência:

OLIVER, Mary. The summer day. In: PINSKY, Robert; DIETZ, Maggie (Eds.). American’s favorite poems: the favorite poem project anthology. New York, NY: W. W. Norton, 2000. p. 207.

domingo, 25 de junho de 2017

Friedrich Hölderlin - Fantasia do Crepúsculo

Numa série de imagens fluidas, Hölderlin contempla os homens ao fim de sua lida diária, e vendo-se uma figura solitária entre os pares, percebe que os seus sonhos se dissipam ao transcorrer vertiginoso do crepúsculo.

O poeta vislumbra, de fato, o avançar da idade em meio à paz e serenidade que costumam abraçar aqueles que já cruzaram o “cabo da boa esperança”. Assim, nada melhor que a metáfora empregada: o fim de um dia, com as suas réstias de luz, como alegoria para o trânsito de uma vida inteira.

Para os internautas que apreciam cotejar criações poéticas, sugeriria que tecessem paralelos entre o conteúdo taciturno dos últimos versos de Hölderlin, neste poema, e as derradeiras linhas da ode “Musa Consolatrix”, de Machado de Assis.

J.A.R. – H.C.

Friedrich Hölderlin
(1770-1843)

Abendphantasie

Vor seiner Hütte ruhig im Schatten sizt
Der Pflüger, dem Genügsamen raucht sein Herd.
Gastfreundlich tönt dem Wanderer im
Friedlichen Dorfe die Abendglocke.

Wohl kehren izt die Schiffer zum Hafen auch,
In fernen Städten, fröhlich verrauscht des Markts
Geschäftger Lärm; in stiller Laube
Glänzt das gesellige Mahl den Freunden.

Wohin denn ich? Es leben die Sterblichen
Von Lohn und Arbeit; wechselnd in Müh und Ruh
Ist alles freudig; warum schläft denn
Nimmer nur mir in der Brust der Stachel?

Am Abendhimmel blühet ein Frühling auf;
Unzählig blühn die Rosen und ruhig scheint
Die goldne Welt; o dorthin nimmt mich,
Purpurne Wolken! und möge droben

In Licht und Luft zerrinnen mir Lieb und Leid! -
Doch, wie verscheucht von thöriger Bitte, flieht
Der Zauber; dunkel wirds und einsam
Unter dem Himmel, wie immer, bin ich –

Komm du nun, sanfter Schlummer! zu viel begehrt
Das Herz; doch endlich, Jugend! verglühst du ja,
Du ruhelose, träumerische!
Friedlich und heiter ist dann das Alter.

Vista de um Estuário ao Crepúsculo
(Emily Mary Osborn: pintora inglesa)

Fantasia do Crepúsculo

Descansa o lavrador sua porta
E vê o fumo do lar subir, contente.
Hospitaleiramente ao caminhante
Acolhem os sinos da aldeia.

Voltam os marinheiros para o porto.
Em longínquas cidades amortece
O ruído dos mercados; na latada
Brilha a mesa para os amigos.

Ai de mim! de trabalho e recompensa
Vivem os homens, alternando alegres
Lazer e esforço: por que só em meu peito
Então nunca dorme este espinho?

No céu da tarde cheira a primavera;
Rosas florescem; sossegado fulge
O mundo das estrelas. Oh! levai-me,
Purpúreas nuvens, e lá em cima

Em luz e ar se me esvaia amor e mágoa!
Mas, do insensato voto afugentado,
Vai-se o encanto; escurece, e, solitário
Como sempre, fico ao relento.

Vem suave sono! Por demais anseia
O coração; um dia enfim te apagas,
Ó mocidade inquieta e sonhadora!
E chega serena a velhice.

Referências:

Em Alemão

HÖLDERLIN, Friedrich. Abendphantasie. In: __________. Gedichte. Herausgegeben von Karl-Maria Guth. Berlin, DE: Contumax GmbH & Co. KG, ‎‎2015. s. 218-219.

Em Português

HÖLDERLIN, Friedrich. Fantasia do crepúsculo. Tradução de Manuel Bandeira. In: BANDEIRA, Manuel. Poemas traduzidos. 3. ed. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1956. p.126-127. (Coleção ‘Rubáiyát’)