Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

Carlos Ávila - Baudelaire sob o sol

O poeta mineiro lança mão de uma espécie de metonímia para criar este espirituoso poema: não é que esteja a refletir sobre a exposição de Baudelaire ao sol, em pessoa, senão de um exemplar da mais famosa obra do autor francês – “As flores do mal”, que, alojado em uma de suas estantes, ficou com a capa um tanto descorada diante da não cogitada exposição a inclementes raios solares.

 

Assim, pergunta-se o ente lírico, o que estaria Baudelaire – em “efígie gráfica” – fazendo na aridez do sertão (norte de Minas ou no sertão nordestino adentro?), ou de outra forma – em inflexão que consente até mesmo com um sentido mais literal ou denotativo das palavras –, se “as flores do mal”, molestadas pelo sol “implacável”, lograriam resistir “aos punhais do óxido e do sal” do terreno em que dispostas.

 

J.A.R. – H.C.

 

Carlos Ávila

(n. 1955)

 

Baudelaire sob o sol

 

o sol

(a ser adjetivado:

im-pla-cá-vel)

descorou a capa

de um volume de baudelaire

 

as flores do mal

(descubro)

não resistem à lenta

violência do sol

(sol de boca-de-sertão

que estorrica o solo?)

 

também

quem mandou

colocar a estante

nesta posição:

o que estaria baudelaire

(em efígie gráfica)

fazendo no sertão?

 

se as flores do mal

não suportam o sol

(répondez baudelaire)

resistiriam aos punhais

do óxido e do sal?

 

Retrato de Charles Baudelaire

(Gustave Courbet: pintor francês)

 

Referência:

 

ÁVILA, Carlos. Baudelaire sob o sol. In: DANIEL, Claudio; BARBOSA, Frederico (Organização, seleção e notas). Na virada do século: poesia de invenção no Brasil. São Paulo, SP: Landy, 2007. p. 91.

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