Alpes Literários

Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 31 de agosto de 2020

Paul Éluard - Coragem

Percebe-se neste poema de Éluard – a menos que este intérprete esteja a aferir as palavras por uma situação-limite não tencionada pelo autor − certa espécie de chamamento a uma agitação que poderia se assemelhar, de algum modo, à Comuna de Paris (18.3 a 28.5.1871): um levante dos pobres da cidade contra as forças que impõem tal estado de coisas à maioria oprimida nas ruas e logradouros da urbe.

Ou então, o que representaria a evocação de que os “escravos vão se levantar”, caso compreendam as razões de seu estado de pobreza – desalienação, decerto, formularia qualquer hermeneuta marxista! A propósito, uma oportuna inflexão: aqui em Pindorama, aos olhos dos que aportaram no poder federal, há comunistas à mancheia – uma forma loquaz, verborrágica para se adjetivar qualquer um que se lhes expila as verdades mais cristalinas na cara!

J.A.R. – H.C.

Paul Éluard
(1895-1952)

Courage

Paris a froid Paris a faim
Paris ne mange plus de marrons dans la rue
Paris a mis de vieux vêtements de vieille
Paris dort tout debout sans air dans le métro
Plus de malheur encore est imposé aux pauvres
Et la sagesse et la folie
De Paris malheureux
C’est l’air pur c’est le feu
C’est la beauté c’est la bonté
De ses travailleurs affamés
Ne crie pas au secours Paris
Tu es vivant d’une vie sans égale
Et derrière la nudité
De ta pâleur de ta maigreur
Tout ce qui est humain se révèle en tes yeux
Paris ma belle ville
Fine comme une aiguille forte comme une épée
Ingénue et savante
Tu ne supportes pas l’injustice
Pour toi c’est le seul désordre
Tu vas te libérer Paris

Paris tremblant comme une étoile
Notre espoir survivant
Tu vas te libérer de la fatigue et de la boue
Frères ayons du courage
Nous qui ne sommes pas casqués
Ni bottés ni gantés ni bien élevés
Un rayon s’allume en nos veines
Notre lumière nous revient
Les meilleurs d’entre nous sont morts pour nous
Et voici que leur sang retrouve notre coeur

Et c’est de nouveau le matin un matin de Paris
La pointe de la délivrance
L’espace du printemps naissant
La force idiote a le dessous
Ces esclaves nos ennemis
S’ils ont compris
S’ils sont capables de comprendre
Vont se lever.

Paris através da janela
(Marc Chagall: pintor russo-francês)

Coragem

Paris tem frio Paris tem fome
Paris já não come castanhas na rua
Paris se pôs roupas gastas de velha
Paris dorme de pé sem ar no metrô
Impõe-se ainda mais infortúnio aos pobres
E a sabedoria e a loucura
De Paris desafortunada
É o ar puro é o fogo
É a beleza é a bondade
Dos seus famintos trabalhadores
Não clames por ajuda Paris
Estás vivendo uma vida sem igual
E por trás da nudez
Da tua palidez da tua magreza
Tudo o que é humano se revela em teus olhos
Paris minha bela cidade
Afilada como uma agulha forte como uma espada
Ingênua e sábia
Não suportas a injustiça
Para ti essa é a única desordem
Tu vais te libertar Paris

Paris tremeluzente como uma estrela
Nossa sobrevivente esperança
Vais te libertar da fadiga e da lama
Irmãos tenhamos coragem
Nós que não temos capacetes
Nem botas nem luvas nem bons modos
Um raio se acende em nossas veias
Nossa luz nos retorna
Os melhores de nós morreram por nós
E eis que o sangue deles regressa ao nosso coração

E é manhã outra vez uma manhã de Paris
O despontar da libertação
O espaço da primavera que irrompe
A força bruta não é invulnerável
Esses escravos nossos inimigos
Se compreenderem
Se forem capazes de compreender
Vão se rebelar.

Referência:

ÉLUARD, Paul. Courage. In: SCOTT, Clive (Ed.). Anthologie Éluard. Methuen’s Twentieth Century French Texts. London, EN: Methuen Educational, 1983. p. 55-56.

domingo, 30 de agosto de 2020

Li Bai - Canto antigo (do alto contemplar os quatro mares...)

Pelo meu absoluto desconhecimento do idioma chinês, com os seus inúmeros logogramas, muitas vezes bastante parecidos, embora com sentidos bem diversos, sou capaz de compreender as razões pelas quais as versões a um outro idioma, como o inglês ou o português, possam resultar em algumas diferenças, como as que se notam nas traduções abaixo transcritas.

Salvo engano, Jerome P. Seaton, um especialista em literatura zen e conhecido tradutor do chinês ao inglês, propôs-se verter o texto a um sentido que, ainda que não seja literal em relação ao original, permitisse percutir de um modo mais amistoso, digamos assim, aos olhos de um leitor ocidental. O que diria, você, internauta?

Às vezes é suficiente escalar uma montanha próxima para ver todos os assuntos humanos literalmente a partir de cima, como o faz este grande poeta da dinastia Tang, a Era de Ouro da poesia chinesa. (MILOSZ, 1998, p. 84)

J.A.R. – H.C.

Li Bai
(701 d.C. – 762 d.C.)

·登高望四海

登高望四海
天地何漫漫
霜被群物秋
风飘大荒寒
华东流水
万事皆波
白日掩徂
浮云无定端
梧桐巢燕雀
枳棘栖鸳鸾
且复去来
歌行路

Cena para “O último dos moicanos”
Cora ajoelhada aos pés de Tanemund
(Thomas Cole: pintor anglo-americano)

Ancient Air

Climbed high, to gaze upon the sea,
Heaven and Earth, so vast, so vast.
Frost clothes all things in Autumn,
Winds waft, the broad wastes cold.
Glory, splendor; eastward flowing stream,
This world’s affairs, just waves.
White sun covered, its dying rays,
The floating clouds, no resting place.
In lofty Wu-t’ung trees nest lowly finches.
Down among the thorny brush the Phoenix perches.
All that’s left, to go home again,
Hand on my sword I sing, “The Going’s Hard.”

(Translated from the Chinese by J. P. Seaton) 

Canto antigo (do alto contemplar os quatro mares...)

do alto contemplar os quatro mares
céu-terra o mundo inteiro vasto o vasto
lençol de gelo o outono este tecido
lufar do vento ao mais deserto frio
riquezas águas rumo ao leste fluem
os dez mil seres pulsam tremeluzem
o branco sol recobre-se em radiâncias
as baças nuvens de impreciso alcance
pardais e andorinhas em seus ninhos
preciosos raros pássaros e espinhos
porém voltar mais uma vez preparar-se
a espada cante e ampare à dura estrada

Referências:

Em Chinês e em Português

BAI, Li.·登高望四海 / Canto antigo (do alto contemplar os quatro mares...). Tradução de Ricardo Primo Portugal e Tan Xiao. In: PORTUGAL, Ricardo Primo; XIAO, Tan (Tradução, organização, notas e introdução). Antologia da poesia clássica chinesa: dinastia Tang. São Paulo, SP: Editora da Unesp, 2013. Em chinês e em português: p. 94.

Em Inglês

PO, Li. Ancient air. Translated from the Chinese from English by J. P. Seaton. In: MILOSZ, Czeslaw (Ed.). A book of luminous things: an international anthology of poetry. 1st. ed. New York, NY: Houghton Mifflin Harcourt, 1998. p. 84.

sábado, 29 de agosto de 2020

Menotti del Picchia - Sugestões de um Jardim Público (A Vigília)

A seção “A Vigília”, aqui transcrita, é a terceira e última parte do poema “Sugestões de um Jardim Público”, de Picchia, antecedida, por conseguinte, pelas seções intituladas “Costureirinha” e “O Carrossel”, todas a abordar distintas visões sobre o correr da vida: a perspectiva de um amor pelo qual ansiosamente se espera, os prazeres infantis e a angústia da morte circunvizinha.

Na seção em tela se recordam as passagens bíblicas da Paixão de Cristo, em especial, a noite tormentosa, anterior à sua crucificação, que Ele teria passado em Getsêmani – um horto ou jardim localizado ao sopé do Monte das Oliveiras −, com os seus discípulos (Mateus 26:36): o arrepio de horror impregnado no espaço permite que a noite imensa verta luz pelos poros das estrelas e, numa nuvem à parte, como no Calvário, “sangram as cinco chagas do Cruzeiro”.

J.A.R. – H.C.

Menotti del Picchia
(1892-1988)

Sugestões de um Jardim Público
(A Vigília)

Percorro as alamedas solitárias
como um Poeta antigo...
Um cisne parsifalesco voga na água do lago
que parece o lenço da Verônica
enxugando a face pálida da lua...

Os salgueiros, cheios de lágrimas verdes,
têm a atitude piedosa de José d’Arimateia
quando cobria de bálsamo o corpo do Cordeiro...
O jardim evoca o horto de Getsêmani
onde o Senhor suou sangue...

As árvores dormem, ao luar, como os Discípulos.
O vento viola as rosas
sacrilegamente, e há um ciclo de beijos
como na noite das Angústias Supremas...

Mãos invisíveis de memórias ofertam
aos meus lábios túmidos de mágoa
o cálice do meu Horto...

Todos nós temos a Vigília
nessa insônia ambulante
dos passeios sem rumo em parques solitários.
Um arrepio de horror percorre a noite imensa,
que sua (*) luz pelos poros das estrelas...

No Calvário de uma nuvem
sangram as cinco chagas do Cruzeiro.

Jardim Público em Arles
(Vincent van Gogh: pintor holandês)

Nota:

(*) Apenas uma advertência: “sua” não diz respeito, aqui, ao pronome possessivo, senão à conjugação do verbo “suar”, tendo por sujeito a “noite imensa”: esclareço que a grafia original do poema apresentava a grafia “su’a”, junção de “sua” (do verbo suar) + “a”.

Referência:

PICCHIA, Menotti del. Sugestões de um jardim público (a vigília). In: FIGUEIREDO, José Valle de (Compilador). Antologia da poesia brasileira. Lisboa, PT: Editorial Verbo, s/d [197?]. p. 124.

sexta-feira, 28 de agosto de 2020

Óscar Alfaro - O pássaro revolucionário

O poeta boliviano conta-nos uma hipotética historinha que se passou com uma ave adjetivada como “revolucionária”, ao confrontar o poder de um porco que, tal como na novela satírica “A Revolução dos Bichos” (“Animal Farm”), de 1945, de George Orwell (1903-1950), tomou para si o poder sobre a granja, impondo ali as regras de modo nada equânime.

Resultado: diante da afronta e da tamanha petulância em dizer a verdade da espoliação a que estava ele próprio e outros animais submetidos, o suíno não contou duas vezes em ordenar que o pássaro fosse detonado. Qualquer semelhança com histórias reais acontecidas também em Pindorama não terá sido mera coincidência!

J.A.R. – H.C.

Óscar Alfaro
(1921-1963)

El pájaro revolucionario

Ordena el cerdo granjero:
¡Fusilen a todo pájaro!
Y suelta por los trigales su policía de gatos.

Al poco rato le traen
Un pajarillo aterrado
Que aún tiene dentro del pico
Un grano que no ha tragado.

¡Vas a morir por ratero!...
¡Si soy pájaro honrado,
De profesión carpintero, que vivo de mi trabajo!
¿Y por qué robas mi trigo?
– Lo cobro de mi salario.
Que Ud. se negó a pagarme.
Y aún me debe muchos granos.

Y lo mismo está debiendo
A los sapos hortelanos,
A mi compadre el hornero
Y al minero escarabajo
A las abejas obreras
¡Y a todos los que ha estafado!
Usted hizo su riqueza
Robando a los proletarios…

¡Qué peligro!... ¡Un socialista!
¡A fusilarlo en el acto!
¡Preparen!... ¡Apunten!...
¡Fuego!
¡Demonio… si hasta los pájaros
En la América Latina
Se hacen revolucionarios!...

De Todas as Cidades do Sul Centenas
de Migrantes partiram Rumo ao Norte
Painel 3 da Série “A Migração”
(Jacob Lawrence: pintor norte-americano)

O pássaro revolucionário

Ordena o suíno fazendeiro:
− Fuzilem todos os pássaros!
E solta pelos trigais a sua polícia de gatos.

Daí a pouco lhe trazem
Um passarinho aterrorizado
Que ainda tem dentro do bico
Um grão que não engoliu.

− Vais morrer como um gatuno!...
− Como, se sou um pássaro honesto,
Carpinteiro de profissão, que vivo de meu trabalho!
− E por que roubas meu trigo?
− Ponho na conta de meu salário
Que Tu te negaste a me pagar.
E ainda me deves muitos grãos.

E o mesmo estás devendo
Aos sapos horticultores,
A meu compadre o joão-de-barro,
Ao escaravelho mineiro,
Às abelhas operárias
E a todos que extorquiste!
Fizeste a tua riqueza
Roubando os proletários!...

− Que perigo!... Um socialista!
A ser fuzilado no ato!
Preparem!... Apontem!...
Fogo!
Demônio... se até os pássaros
na América Latina
se tornam revolucionários!...

Referência:

ALFARO, Óscar. El pájaro revolucionario. In: LABRADOR, Elis; CHERICIÁN, David (Compiladores). Asalto al cielo: antologia poética. 2. ed. Caracas, VE: Fundación Editorial El perro y la rana, 2010. Disponível neste endereço. Acesso em: 4 jun. 2020. p. 397.

quinta-feira, 27 de agosto de 2020

Léon-Paul Fargue - Quiosques

As imagens que se expressam nos versos do poema levam-nos à beira-mar, onde um aparente contratempo na relação entre o falante e a sua musa pode ser identificado na amarga lágrima que um dia foi ele obrigado a “beber” − salgada como as águas do mar −, tudo porque ela não se deixa enredar pelo avanço das marés que lhe vêm bater nos pés.

E então surge uma oportuna medusa para desvendar as razões do choro da moça, a representar na areia os três casos de semelhança de triângulos, a saber, ângulo x ângulo; lado x lado x lado e lado x ângulo x lado. E o que haveria em conexão com o poema nessa referência matemática? Apesar de a musa pretender reforçar os padrões de sua parecença ao parceiro, encontra-se esta num equilíbrio instável, suscetível de ser passada a fio de espada pelas águas da vida...

J.A.R. – H.C.

Léon-Paul Fargue
(1876-1957)

Kiosques

En vain la mer fait le voyage
Du fond de l’horizon pour baiser tes pieds sages,
Tu les retires
Toujours à temps.

Tu te tais, je ne dis rien.
Nous n’en pensons pas plus, peut-être.
Mais les lucioles de proche en proche
Ont tiré leur lampe de poche
Tout exprès pour faire briller
Sur tes yeux calmes cette larme
Que je fus un jour obligé de boire.
La mer est bien assez salée.

Puis une méduse blonde et bleue
Qui veut s’instruire en s’attristant
Traverse les étages bondés de la mer,
Nette et claire comme un ascenseur,
Et décoiffe sa lampe à fleur d’eau
Pour te voir feindre sur le sable
Avec ton ombrelle, en pleurant,
Les trois cas d’égalité des triangles.

Vista do Parque Montsouris
(Henri Rousseau: pintor francês)

Quiosques

Em vão o mar faz a viagem
Do fundo do horizonte para beijar teus pés prudentes:
Tu os retiras
Sempre a tempo.

Calas-te, eu não digo nada.
Talvez nem pensemos mais nisso.
Mas os vagalumes, pouco a pouco,
Sacam suas lanternas de bolso
Expressamente para fazer brilhar
Em teus olhos calmos essa lágrima
Que fui um dia obrigado a beber.
E o mar se torna bem salgado.

Depois, certa medusa ouro e azul,
Que quer instruir-se entristecendo-se,
Corta as lojas abarrotadas do mar,
Clara e nítida como um elevador,
E destouca sua lâmpada à flor d’água,
Para te ver, com uma sombrinha,
Chorando, representar na areia
Os três casos de igualdade dos triângulos.

Referência:

FARGUE, Léon-Paul. Kiosques / Quiosques. Tradução de Carlos Drummond de Andrade. In: ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia traduzida. Organização e notas de Augusto Massi e Júlio Castañon Guimarães. Introdução de Júlio Castañon Guimarães. São Paulo, SP: Cosac Naify, 2011. Em francês: p. 146; em português: p. 147. (Coleção “Ás de colete”; 20)

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Mário Pederneiras - No Caminho da Vida

A metáfora do outono para a parte final de uma vida, quando já o “trade-off”, entre usufruir o agora para “pagar” depois ou o “poupar” agora para usufruir depois, há muito se atenuou, considerando que o usufruto dos anos vividos terá acelerado em muito a probabilidade da finitude: eis o que aqui paira nos pensamentos e divagações do poeta.

Ouve ele a “funérea canção da Folha Morta” e todo o cenário impressionista elaborado parece pulular na tela que se nos apresenta: suaves crepúsculos, névoas, bizarras impressões, velas, aromas e lágrimas; o lamento, a indolência, a lentidão e a calma de um homem grisalho; e, ao fundo, uma derradeira nota ao violino de não identificada composição de Schumann.

J.A.R. – H.C.

Mário Pederneiras
(1867-1915)

No Caminho da Vida

No caminho da vida
Ouço o Outono que chega, aromado e macio
E grisalho da luz dos crepúsculos suaves...

Entretanto, vão perto os rumores do Estio,
A vigorosa lida
E a estranha agudeza de impressões bizarras,
De som, de luz, de cor, de sonhos e de aves,
Com que o Sol movimenta Almas e Natureza,
No tempo em que se tem – Mocidade e Cigarras.

É o Outono que chega! Ouço-lhe o ritmo lento
No rumor do desgalho
E no humano lamento
Da aragem;
Vejo-o, calmo e grisalho
Na doçura da luz que amacia a paisagem.
Sinto-o bem, nesta espécie de afago
Que dele se erradia;
Ouço-o bem, na indolência do lago
De água morta que espelha o fim azul do dia.

O Outono recorda
Outro tempo, outra luz, outra terra, outra idade,
A asa alígera e branca
A quermesse do Estio
E outra vida mais franca
Em que o sonho melhor o sono borda.

O Outono é suave, é dolente, é macio,
Mas, o Outono é também uma grande saudade,
E agora
Assim,
Como o vejo lá fora,
Sinto-o, dentro de mim.

Uma folha que cai, um verso que soluça,
A névoa que a descer o alto de um cerro embuça.
Uma nota final de Schumann em violino,
Uma lágrima, um sino.
Uma vela que parte, ou uma asa que voa,
Folhas, velas ou névoa, lágrima ou rima.
Tudo quanto, afinal, represente ou exprima,
A indolência
De um gesto
Lento, vago, modesto.

A saudade, o Adeus, a distância, o abandono.
A minha vida chega e aos meus ouvidos soa.
Na suave cadência
Com que a vida acalenta a chegada do Outono.
É no Outono que a Terra à luz velhinha e boa
De um pôr de Sol que à cisma exorta
Entoa
A funérea canção da Folha Morta.

Velho na floresta
(Petar Meseldžija: ilustrador sérvio)

Referência:

PEDERNEIRAS, Mário. No caminho da vida. In: FIGUEIREDO, José Valle de (Compilador). Antologia da poesia brasileira. Lisboa, PT: Editorial Verbo, s/d [197?]. p. 93-94.