Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 1 de novembro de 2023

Robinson Jeffers - Credo

O falante expressa a ideia – o seu “Credo” – de que a beleza da natureza existe para além da percepção da humanidade, pois que ela remanesce em seu território mesmo quando o elemento humano, mental ou consciencial, houver se esgotado, ou seja – fazendo menção às suas próprias palavras –, o oceano pertence a si mesmo, independentemente de como o apreendamos.

 

Esse ponto de vista, decerto, contrasta com as interpretações, sobre o mesmo tema, dos transcendentalistas norte-americanos – como Henry David Thoreau (1817-1862) ou Ralph Waldo Emerson (1803-1882) – os quais foram sobejamente influenciados pelos textos hinduístas sobre a filosofia da mente e a espiritualidade. Para estes, a beleza da natureza apenas existiria a partir de nossas percepções, ou melhor, o real consistiria somente naquilo “a que emprestamos realidade”: seríamos “um” com a natureza e sua beleza, na medida em que a valoramos segundo nossos parâmetros cognitivos.

 

J.A.R. – H.C.

 

Robinson Jeffers

(1887-1962)

 

Credo

 

My friend from Asia has powers and magic,

he plucks a blue leaf from the young blue-gum

And gazing upon it gathering and quieting

The God in his mind, creates an ocean more real

than the ocean, the salt, the actual

Appalling presence, the power of the waters.

He believes that nothing is real except as we make it.

I humbler have found in my blood

Bred west of Caucasus a harder mysticism.

Multitude stands in my mind but I think that the ocean

in the bone vault is only

The bone vault’s ocean: out there is the ocean’s;

The water is the water, the cliff is the rock,

come shocks and flashes of reality. The mind

Passes, the eye closes, the spirit is a passage;

The beauty of things was born before eyes

and sufficient to itself; the heart-breaking beauty

Will remain when there is no heart to break for it.

 

Em meio à Serra Nevada, Califórnia

(Albert Bierstadt: pintor germano-americano)

 

Credo

 

Meu amigo da Ásia tem poderes de mágica,

tira uma folha azul da tenra goma-guta

E olhando-a fixamente, atraindo e acalmando

Deus em seu espírito, cria um oceano mais real

do que o oceano, com o sal, com o seu verdadeiro

Aspecto apavorante, todo o poder das águas.

Ele acredita que só é real aquilo a que emprestamos

realidade.

Em minha modéstia encontrei em meu temperamento

Educado no Ocidente do Cáucaso um misticismo

mais severo.

A multidão existe em minha mente, mas eu penso

que o oceano na ossatura da abóbada é apenas

O oceano dessa ossatura: além está a abóbada

do oceano;

A água é a água, o penhasco é o rochedo; vêm abalos

e relâmpagos dessa realidade. A mente

Passa, os olhos se fecham, o espírito é um caminho;

A beleza das coisas nasceu antes dos olhos e basta

a si mesma; a dolorosa beleza

Permanecerá quando não existir mais um coração

que sofra por sua causa.

 

(Tradução em ‘A Manhã’: Rio de Janeiro, 5.5.1946)

 

Referências:

 

Em Inglês

 

JEFFERS, Robinson. Credo. In: __________. The wild god of the world: an anthology of Robinson Jeffers. Selected, with an introduction, by Albert Gelpi. Stanford (CA): Stanford University Press, 2003. p. 48.

 

Em Português

 

JEFFERS, Robinson. Credo. Tradução de Jorge de Lima. In: LIMA, Jorge de. Poesia completa: volume único. Organização de Alexei Bueno. Rio de Janeiro, RJ: Nova Aguilar, 1997. p. 869. (Biblioteca luso-brasileira; Série brasileira)

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