Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 3 de novembro de 2023

Vinicius de Moraes - O Efêmero

Aquilo que é beleza e encantamento também se exaure no precário, no efêmero, levantando-nos dúvidas sobre os nossos pressupostos que avançam para além do limite da morte: o incognoscível é matéria de especulação, mas preferimos manter, pelo sim pelo não, a expectativa de que as nossas vozes hão de reverberar, ‘ad infinitum’, no tempo e no espaço, sem o inquietante efeito atenuador.

 

Afligimo-nos com a morte, tanto mais que a experiência pessoal da morte é uma impossibilidade: se nela incorremos, não temos como retroceder para contar aos vivos como ela se dá. Não há experiências de morte em primeiro grau no mundo dos vivos. Quando muito, há “voos de reconhecimento” levados a efeito por pessoas que estiveram a um passo do fecho.

 

J.A.R. – H.C.

 

Vinicius de Moraes

(1913-1980)

 

O Efêmero

 

O efêmero. Ora, um pássaro no vale

Cantou por um momento, outrora, mas

O vale escuta ainda envolto em paz

Para que a voz do pássaro não cale.

 

E uma fonte futura, hoje primária

No seio da montanha, irromperá

Fatal, da pedra ardente, e levará

À voz a melodia necessária.

 

O efêmero. E mais tarde, quando antigas

Se fizerem as flores, e as cantigas

A uma nova emoção morrerem, cedo

 

Quem conhecer o vale e o seu segredo

Nem sequer pensará na fonte, a sós...

Porém o vale há de escutar a voz.

 

O efêmero na vida

(Otelea Lavinia: artista romena)

 

Referência:

 

MORAES, Vinicius de. O efêmero. In: __________. Livro de sonetos. Rio de Janeiro, RJ: Livros de Portugal, jan.1957. p. 27-28. (Coleção ‘Poesia Sempre’; v. 4)

 

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