Poemas que se detêm
sobre os óbices à sua não escrita já há alguns neste blog, a exemplo de “Resenha
de um poema não escrito”, da polonesa Wisława Szymborska, ou “O
poema não escrito”, de Robert Graves, cada qual a declinar os contratempos,
objetivos ou subjetivos, que levaram ao esforço baldado do poeta (pelo menos por
determinado momento ou período de tempo, quando não para sempre).
Com este poema de
Levertov, perpassado por uma conotação erótica e, ao mesmo tempo, sacralizada, retorno
ao tema, o qual se estenderá ainda por mais três postagens – até o sábado vindouro,
portanto.
A poetisa compara o
resvalar das mãos da amante sobre o corpo do parceiro a uma forma de ritual,
cuja oração resulta não escrita, provável paralelo para uma relação sexual não
consumada: de um poema erótico retido “por semanas” na mente da falante, a uma
celebração verbal dos atributos sacrossantos do corpo, esse espaço geográfico
do desejo, templo sagrado devotado à veneração do deus do amor.
J.A.R. – H.C.
Denise Levertov
(1923-1997)
The poem unwritten
For weeks the poem of
your body,
of my hands upon your
body
stroking, sweeping,
in the rite of
worship, going
their way of wonder
down
from neck-pulse to
breast-hair to level
belly to cock –
for weeks that poem,
that prayer,
unwritten.
The poem unwritten,
the act
left in the mind,
undone. The years
a forest of giant
stones, of fossil stumps,
blocking the altar.
Saudades do Verão
(Hell Winter: artista
russa)
O poema não escrito
Por semanas o poema do
teu corpo,
de minhas mãos sobre
o teu corpo,
acariciando-o, perscrutando-o,
como num ritual
de adoração, percorrendo
para baixo
o seu caminho de
encantos,
desde o pulsar da garganta
aos pelos do peito,
ao ventre uniforme,
ao pênis –
por semanas aquele
poema, aquela oração
não escrita.
O poema não escrito,
o ato
deixado na mente, por
realizar. Os anos,
um bosque de pedras
gigantes, de troncos fósseis,
bloqueando o altar.
Referência:
LEVERTOV, Denise. The
poem unwritten. In: DOVE, Rita (Ed.). The penguin anthology of 20th century
american poetry. 1st publ. New York, NY: Penguin Books, 2011. p. 219.
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