Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 25 de outubro de 2023

Denise Levertov - O poema não escrito

Poemas que se detêm sobre os óbices à sua não escrita já há alguns neste blog, a exemplo de “Resenha de um poema não escrito”, da polonesa Wisława Szymborska, ou “O poema não escrito”, de Robert Graves, cada qual a declinar os contratempos, objetivos ou subjetivos, que levaram ao esforço baldado do poeta (pelo menos por determinado momento ou período de tempo, quando não para sempre).

 

Com este poema de Levertov, perpassado por uma conotação erótica e, ao mesmo tempo, sacralizada, retorno ao tema, o qual se estenderá ainda por mais três postagens – até o sábado vindouro, portanto.

 

A poetisa compara o resvalar das mãos da amante sobre o corpo do parceiro a uma forma de ritual, cuja oração resulta não escrita, provável paralelo para uma relação sexual não consumada: de um poema erótico retido “por semanas” na mente da falante, a uma celebração verbal dos atributos sacrossantos do corpo, esse espaço geográfico do desejo, templo sagrado devotado à veneração do deus do amor.

 

J.A.R. – H.C.

 

Denise Levertov

(1923-1997)

 

The poem unwritten

 

For weeks the poem of your body,

of my hands upon your body

stroking, sweeping, in the rite of

worship, going

their way of wonder down

from neck-pulse to breast-hair to level

belly to cock –

for weeks that poem, that prayer,

unwritten.

The poem unwritten, the act

left in the mind, undone. The years

a forest of giant stones, of fossil stumps,

blocking the altar.

 

Saudades do Verão

(Hell Winter: artista russa)

 

O poema não escrito

 

Por semanas o poema do teu corpo,

de minhas mãos sobre o teu corpo,

acariciando-o, perscrutando-o, como num ritual

de adoração, percorrendo para baixo

o seu caminho de encantos,

desde o pulsar da garganta aos pelos do peito,

ao ventre uniforme, ao pênis –

por semanas aquele poema, aquela oração

não escrita.

O poema não escrito, o ato

deixado na mente, por realizar. Os anos,

um bosque de pedras gigantes, de troncos fósseis,

bloqueando o altar.

 

Referência:

 

LEVERTOV, Denise. The poem unwritten. In: DOVE, Rita (Ed.). The penguin anthology of 20th century american poetry. 1st publ. New York, NY: Penguin Books, 2011. p. 219.

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