A esperança é um
ingrediente da resiliência, e o poeta, com o seu dom visionário, mostra-se destro
a pressagiá-la, não como uma utopia inalcançável, senão como um futuro
exequível, no qual o egoísmo, a hipocrisia, a insensatez e outros infortúnios não
tenham assento no corpo social, com o que se fomentaria um estado saudável de
equilíbrio e de fraternidade entre os pares.
Sob tais auspícios, a
poesia, que ora palmilha as sendas confrangida pelas forças de opressão, poderá
sair “à noite sem escolta”, difundindo a alegria de um voo de pássaro longe do
cativeiro, até que chegue a aurora de um novo dia, com a sua luz nutriz de
renovadas primaveras, a estreitar o almejado futuro às conjunções dos dias
presentes.
J.A.R. – H.C.
René Depestre
(n. 1926)
Tout l’espoir du monde
Poète blessé à chaque porte où tu frappes
blessé de tous les malheurs qu’il y a au monde
il te reste la joie de voir au loin le temps
où dans chaque pays l’égoïsme n’aura
plus une seule griffe où dans chaque maison
dans chaque rue l’hypocrisie sera domptée
l’humaine sottise aura du plomb à ses ailes
la poésie sortira la nuit sans escorte
vers un orient vital frère à suivre partout.
Dans: “En état de poésie” (1980)
Esperança para o futuro
(Cecile Pardigon: artista francesa)
Toda a esperança do mundo
Poeta ferido em cada porta a que bate
ferido por todo o infortúnio do mundo
a ti resta a alegria de ver ao longe o tempo
em que em cada país
o egoísmo não terá uma só garra
em que em cada casa em cada rua
a hipocrisia será dominada
a humana insensatez terá chumbo em suas asas
e a poesia sairá à noite sem escolta
para um oriente vital
irmão a ser seguido por toda parte.
Em: “Em estado de poesia” (1980)
Referência:
DEPESTRE, René. Tout l’espoir du monde / Toda a esperança do mundo. Tradução de Idelma Ribeiro de Faria. In: FARIA, Idelma Ribeiro de (Tradução e ensaios). T. S. Eliot, Emily Dickinson e René Depestre: seleção. São Paulo, SP: Hucitec, 1992. Em francês: p. 170; em português: p. 171. (Coleção ‘Literatura Estrangeira’; v. 1)
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