A voz lírica, neste
poema, é a de um crítico que, em sua resenha, faz terra arrasada de um poema redigido
por certa autora – Wisława Szymborska, por que não?! –, em razão de sua alegada
superficialidade, raciocínios imprecisos e sentidos equivocados atribuídos à
existência humana: para ele, diante de estimativas probabilísticas avançadas, quem
acreditaria que “estejamos mesmo sós sob o sol, sob todos os sóis do universo”?
Nos versos do poema,
como em muitos outros de Szymborska, sempre aquela verve irônica por trás do
discurso poético (com efeito, distante de qualquer pretenso rigor científico), conduzindo
o leitor pela mão até o relicário de suas ilações, neste caso, infensas à ideia
de uma caminhada às estrelas com o objetivo de solução para dilemas humanos ou
de participação espiritual na “mente cósmica”.
Os argumentos
declinados no poema objeto de crítica – o qual, afinal, não se conhece – aparecem
aqui entremeados na exposição do falante, a exemplo das lucubrações de Pascal sobre
o homem (“média entre tudo e nada”, perdido num universo infinito e
desencantado, cujo centro está em toda parte e a circunferência em parte alguma),
mas que ao crítico parecem vetustas, haja vista que suscitadas em meados do
século XVII –, além de outras incursões filosóficas que teriam um desarrazoado
propósito moral.
J.A.R. – H.C.
Wisława Szymborska
(1923-2012)
Recenzja z
nienapisanego wiersza
W pierwszych słowach
utworu
autorka stwierdza, że Ziemia jest mała,
niebo natomiast duże do przesady,
a gwiazd, cytuję: “więcej w nim niż trzeba”.
W opisie nieba czuć
pewną bezradność,
autorka gubi się w strasznym
przestworze,
uderza ją martwota wielu
planet
i wkrótce w jej umyśle (dodajmy: nieścisłym)
zaczyna rodzić się pytanie,
czy aby jednak nie
jesteśmy sami
pod słońcem, pod wszystkimi
na świecie słońcami?
Na przekór rachunkowi
prawdopodobieństwa!
I powszechnemu
dzisiaj przekonaniu!
Wbrew niezbitym
dowodom, które lada dzień
mogą wpaść w ludzkie ręce! Ach, poezja.
Tymczasem nasza
wieszczka powraca na Ziemię,
planetę, która może “toczy się bez świadków”,
jedyną “science fiction, na jaką stać kosmos”.
Rozpacz Pascala
(1623-1662, przyp. nasz)
wydaje się autorce nie mieć konkurencji
na żadnej Andromedzie ani
Kasjopei.
Wyłączność wyolbrzymia i zobowiązuje,
wyłania się więc problem jak żyć et cetera,
albowiem “pustka tego
za nas nie rozstrzygnie”.
“Mój Boże, woła człowiek do Samego Siebie,
ulituj się nade mną, oświeć mnie”…
Autorkę gnębi myśl o życiu trwonionym tak
lekko,
jakby go było w
zapasie bez dna.
O wojnach, które –
jej przekornym zdaniem –
przegrywane są zawsze po obydwu
stronach.
O “państwieniu się” (sic!) ludzi nad ludźmi.
Przez utwór prześwituje intencja
moralna.
Pod mniej naiwnym piórem
rozbłysłaby może.
Niestety, cóż. Ta z gruntu
ryzykowna teza
(czy aby jednak nie
jesteśmy sami
pod słońcem, pod wszystkimi
na świecie słońcami)
i rozwinięcie jej w
niefrasobliwym stylu
(mieszanina wzniosłości z mową pospolitą)
sprawiają, że któż temu wiarę da?
Z pewnością nikt. No właśnie.
In: “Wielka Liczba” (1976)
Fantasia Espacial
(Composição de
autoria desconhecida)
Resenha de um poema
não escrito
Nas primeiras
palavras do poema
a autora afirma que a
Terra é pequena,
o céu, por sua vez,
grande até o exagero
e há nele, cito:
“mais estrelas do que o necessário”.
Na descrição do céu
dá para sentir certa impotência,
a autora se perde na
horrível imensidão,
assusta-a a ausência
de vida em tantos planetas
e logo na sua mente
(acrescentemos: não exata)
começa a surgir uma
pergunta,
será que afinal não
estamos sós
sob o sol, sob todos
os sóis do universo?
A despeito da teoria
das probabilidades!
E da convicção hoje
universal!
Malgrado as provas
irrefutáveis que em breve
podem cair em mãos humanas!
Ah, poesia.
Enquanto isso nossa
profetisa volta à Terra,
planeta que talvez
“gire sem testemunhas”,
única “ficção
científica que o cosmo pode se permitir”.
O desespero de Pascal
(1623-1662, nota nossa)
parece à autora não
ter rival
em nenhuma Andrômeda
ou Cassiopeia.
A exclusividade é
destaque e compromisso;
surge então o
problema: como viver et cetera,
já que “o vazio não o
resolverá para nós”.
“Meu Deus, clama o
homem para Si Mesmo,
tem piedade de mim,
me ilumina”…
Aflige à autora a
ideia da vida desperdiçada à toa
como se dela houvesse
uma fonte inesgotável.
E das guerras que –
na sua opinião contestadora –
são sempre perdidas
pelos dois lados.
E do homem que
“autoritormenta” (sic!) o homem.
Na obra transparece
uma intenção moral.
Fosse uma escrita
menos ingênua talvez brilhasse mais.
Mas enfim. Essa tese
em essência arriscada
(de que talvez estejamos mesmo sós
sob o sol, sob todos os sóis do universo)
e seu desenvolvimento
num estilo ligeiro
(uma mistura de
solenidade e fala comum)
levam à pergunta:
quem é que vai acreditar?
Com certeza ninguém.
Pois é.
Em: “Um Grande
Número” (1976)
Referência:
SZYMBORSKA, Wisława. Recenzja
z nienapisanego wiersza / Resenha de um poema não escrito. Tradução de Regina
Przybycien e Gabriel Borowski. In: __________. Para o meu coração num
domingo. Seleção, tradução e prefácio de Regina Przybycien e Gabriel
Borowski. 1. ed. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2020. Em polonês: p. 150-151;
em português: p. 152-153.
P.s.: Uma pequena retificação na referência, a saber: em polonês (p. 150 e 152); em português (p. 151 e 153). J.A.R.
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