O poeta descreve um
sentimento algo edipiano que alimentava em relação à sua mãe – caracterizado
como uma “luxúria dos olhos” –, quando se punha a espreitar, à altura de seus “onze
ou doze anos”, os momentos em que esta, provavelmente desnuda, se banhava em um
dos banheiros da casa.
Naquele tom
confessional que lhe é peculiar, Lowell atém-se a fatos passados, transcorridos
na casa dos pais e, mais tarde, durante a sua vida conjugal – o autor casou-se
três vezes –, em decorrência dos quais experimentou o poder “aflitivo da sedução”:
mas agora prefere manter uma temperatura “ártica” em seu leito, em vez de
manter o sangue sob uma lasciva efervescência.
J.A.R. – H.C.
Robert Lowell
(1917-1977)
Art of the Possible
“Your profession of making what
can’t be done
the one thing you can do...”
In my parents’ townhouse,
a small skylight-covered
courtyard,
six feet by nine,
lit two floors of bathrooms –
their wanton windows clear glass
above,
and modestly glazed below.
There for a winter or so,
when eleven or twelve,
one year short
of the catastrophic brink of
adolescence,
I nightly enjoyed my mother
bathing –
not lust, but the lust of the
eye.
We sit drinking and forking
clams,
a man and a woman three years
younger,
table companions for twenty
years,
raking over the roster of our
acquaintance –
grateful our student euphemisms
hide
our trembling hands afraid to
lift a fork in public.
“Father Freud brainwashed you to
hate your mother.”
We stand to leave,
your breasts touch my chest;
under our clothes, our bodies
are hut as bodies are.
On the thin ice of our hard age
malignant with surprises,
everything inside us stings, yet
chills
knowing the affliction of
seduction...
Tomorrow
the unbecoming oneness of our
ravished body
melts in the light of day.
No engagement, I go...
darkness straightens the limping
hand,
insomnia finds a hundred
justifications
for the inexcusable phrase.
After many lives in marriage,
bedrooms blood-temperature,
my joy in making this room arctic
–
a solitary barrenness
finds the cold spots in the bed,
and cherishes their expiring
chill.
A gratificação de um
pai
(Joseph Clark: pintor
inglês)
A Arte do Possível
“Teu empenho em fazer
o que não pode ser feito,
o único de que és
capaz de fazer...”
Na casa geminada de
meus pais,
um pequeno pátio
coberto por uma claraboia,
seis pés por nove,
iluminava dois
banheiros em pisos distintos –
suas janelas
devassadas de vidro transparente acima
e modestamente
envidraçadas abaixo.
Ali, durante mais ou
menos um inverno,
quando tinha onze ou
doze anos,
a um ano de distância
da catastrófica borda
da adolescência,
todas as noites eu
desfrutava do banho de minha mãe –
não a luxúria em si,
senão a luxúria dos olhos.
Estávamos sentados a
beber e a bipartir mexilhões,
um homem e uma mulher
três anos mais jovem,
companheiros de mesa
durante vinte anos,
repassando o
inventário de nosso relacionamento –
gratos por nossos
estudantis eufemismos ocultarem
o tremor de nossas
mãos receosas de alçar um garfo em público.
“Papai Freud lavou-te
o cérebro para que odeies tua mãe.”
Levantamo-nos para
sair,
teus seios tocaram o
meu peito;
sob nossas roupas, nossos
corpos
não são mais que
choupanas.
Sobre o fino gelo de
nossa idade fatigante,
maligna em suas
surpresas,
tudo dentro de nós aguilhoa,
embora se arrefeça
por conhecermos a
aflição da sedução...
Amanhã,
a unidade indecorosa
de nossos corpos extasiados
há de se derreter à
luz do dia.
Sem compromissos eu
sigo...
a escuridão apruma a
sua mão claudicante,
a insônia encontra
cem justificativas
para a frase
inescusável.
Depois de muito viver
em conúbios,
em quartos de lascivas
temperaturas,
alegro-me em tornar
esta alcova ártica –
uma esterilidade
solitária
encontra os pontos
frios do leito
e acalenta o seu frescor
expirante.
Referência:
LOWELL, Robert. Art
of the possible. In: __________. Day by day. 1st. print. New York, NY:
Farrar, Straus and Giroux, 1977. p. 36-37.
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