Este poema, escrito
por Graves no limiar de sua derradeira década de vida, revela o poeta em
confronto às vicissitudes da idade, da vulnerabilidade e do perecimento, ponderando
sobre os dilemas de sua arte, a partir dos quais resultam apelos e vocativos à
razão e à rima para que venham ao seu encontro, insuflando-lhe ideias no outono
de sua existência.
A poesia flui
impregnada a motivos da vida sazonal junto à natureza, sendo ela, em última
instância, a destinatária cardeal de seus versos, versos estes sobre os quais
Graves aspira a que suas intuições e inspirações se decantem, arquitetando um painel
para além do meramente racional, ou melhor, não integralmente assente em
verdades, pois que a outra metade submete-se ao comando de uma linguagem
supralógica.
J.A.R. – H.C.
Robert Graves
(1895-1985)
The unpenned poem
Should I wander with
no frown, these idle days,
My dark hair
trespassing on its pale brow –
If so, without
companionship or praise,
Must I revisit
marshes where frogs croak
Like me, mimicking
penitential ways?
Are you still
anchored to my slow, warm heart
After long years of
drawing nightly nearer
And visiting our
haunted room, timely
Ruffling its corners
with love’s hidden mop?
And still must we not
part?
What is a poem if as
yet unpenned
Though truthful and
emancipated still
From what may never
yet appear,
From the flowery
riches of still silent song
From golden hours of
a wakeful Spring?
Approach me, Rhyme;
advise me, Reason!
The wind blows gently
from the mountain top.
Let me display three
penetrative wounds
White and smooth in
this wrinkled skin of mine,
Still unacknowledged
by the flesh beneath.
A poem may be trapped
here suddenly,
Thrusting its adder’s
head among the leaves,
Without reason or
rhyme, dumb –
Or if not dumb, then
with a single voice
Robbed of its chorus.
Here looms November.
When last did I approach
Paper with ink, pen,
and the half truth?
Advise me, Reason!
Novembro
(Emile Noirot: pintor
francês)
O poema não escrito
Devo vagar sem
franzir o cenho, nestes dias ociosos,
Meu cabelo escuro a
invadir a pálida fronte.
Se assim for, sem companhia
ou louvores,
Devo revisitar
pântanos onde as rãs, tal como eu,
Coaxam imitando formas de penitência?
Ainda estás ainda
ancorada ao meu lento e tépido coração
Depois de longos anos
acercando-se mais e mais a cada noite
E visitando nossa
assombrada alcova, revolvendo
oportunamente os seus
recessos com a furtiva bucha do amor?
E ainda assim, não havemos
de nos separar?
O que é um poema se
ainda não foi escrito,
Mesmo que verdadeiro e,
de resto, emancipado
Do que talvez nunca venha
à luz,
Das riquezas floridas
de um canto ainda silencioso,
Das horas douradas de
uma Primavera em vigília?
Aproxima-te de mim,
Rima; aconselha-me, Razão!
O vento sopra
suavemente do cimo da montanha.
Permita-me mostrar
três feridas penetrantes,
Brancas e tersas,
nesta minha enrugada pele,
Pela carne sob ela
ainda desconhecidas.
Um poema pode ficar
aqui sitiado de repente,
Projetando a sua
cabeça de víbora entre as folhas,
Sem razão nem rima,
emudecido –
Ou se não mudo, então
com uma única voz
roubada ao seu
refrão.
Novembro assoma por
aqui. Quando foi a última vez que
Me aproximei do papel
com tinta, caneta e a meia verdade?
Aconselha-me, Razão!
Referência:
GRAVES, Robert. The
unpenned poem. The New Yorker, New York, NY, v. 51, n. 13, p. 40, may
19, 1975.
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