Em versos curtos, Walker,
autora negra norte-americana, fala-nos sobre ações aviltantes que, muito provavelmente,
teria presenciado em decorrência de ordens superiores, tendo a força armada –
privada ou estatal – como agente de coação: os efeitos delas resultantes, obviamente,
não são conformes aos mínimos imperativos éticos e de justiça social.
O discurso flui em
tom de expectação (a tradução literal para “hope” é “esperança”), dirigindo-se
a voz lírica a um interlocutor a quem se alvitra não incorrer em tais iniquidades
(grife-se, por oportuno: uma expressão eufêmica para aquilo que Walker
qualifica como “roubo), a pretexto de se pautar pelos valores espelhados no pendão
pátrio.
J.A.R. – H.C.
Alice Walker
(n. 1944)
Hope
Hope never
to covet
the neighbors’ house
with the fragrant
garden
from which a family
has been
driven by your
soldiers;
mother, father,
grandparents,
the toddler and
the dog
now homeless:
huddled, holding on
to each other,
stunned
and friendless
beneath you
in the street:
sitting on
cobblestones
as if on the sofas
inside
that you have decided
to clean, recover and
keep.
Hope never
to say yes
to their misery.
Hope never to gaze
down into their faces
from what used to be
their rooftop.
Hope never to believe
this robbery
will make you a
better
citizen of your new
country
as you unfurl and
wave
its recent
flag
that has been given
to assure you
of this
impossibility.
Caridade de Santo
Eládio de Toledo
(Francisco Bayeu y
Subías: pintor espanhol)
Não queiras
Não queiras jamais
cobiçar
a casa dos vizinhos
com o seu recendente
jardim,
da qual uma família
foi
escorraçada por teus
soldados;
mãe, pai,
avós,
a criança que mal
anda
e o cão,
agora sem abrigo:
amontoados, agarrados
uns aos outros,
atordoados
e sem amigos,
sob os teus olhos
na rua;
sentados sobre
paralelepípedos
como se estes fossem
os sofás,
porta adentro,
os quais decidiste
limpar, recuperar e
guardar.
Não queiras jamais
dizer “sim”
à miséria que os
assola.
Não queiras jamais voltar
a deitar-lhes o olhar
a partir do que
costumava ser
o teto deles.
Não queiras jamais
acreditar
que tal roubo
te fará um melhor
cidadão de teu novo
país,
enquanto desfraldas e
agitas
a sua recente
bandeira
que foi legada
para te assegurar
esta impossibilidade.
Referência:
WALKER, Alice. Hope.
In: __________. The world will follow joy: turning madness into flowers
(new poems). New York, NY: The New Press, 2013. p. 114-115.
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