Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 21 de outubro de 2023

Emilio Ballagas - Poema impaciente

Aqui, a impaciência é do falante, claro está – não do poema –, sôfrego à espera da amada (ou de uma relação afetiva que teima em não se avizinhar), inquieto ante a possibilidade de que possa ela chegar quando tudo já “tenha sabor seco de cinzas, de terras amargas”: com efeito, os versos evoluem num tom desalentado, revelando as fráguas pelo iminente acaso de um desencontro.

 

São os ofegos pela satisfação de desejos orientadores de uma vida, mas que podem ser obstados por circunstâncias inesperadas, como a morte – e é a esta que, no limite, a voz lírica se refere, quando emprega a locução “cinzas gélidas”, ou, menos extremadamente, a um estado de espírito cujo terreno, em seu desapego, expõe-se às chances de se tornar definitivamente estéril.

 

J.A.R. – H.C.

 

Emilio Ballagas

(1908-1954)

 

Poema impaciente

 

¿Y si llegaras tarde,

cuando mi boca tenga

sabor seco a cenizas,

a tierras amargas?

 

¿Y si llegaras cuando

la tierra removida y oscura (ciega, muerta)

llueva sobre mis ojos,

y desterrado de la luz del mundo

te busque en la luz mía,

en la luz interior que yo creyera

tener fluyendo en mí?

(Cuando tal vez descubra

que nunca tuve luz

y marche a tientas dentro de mí mismo,

como un ciego que tropieza a cada paso

con recuerdos que hieren como cardos.)

 

¿Y si llegaras cuando ya el hastío

ata y venda las manos;

cuando no pueda abrir los brazos

y cerrarlos después como las valvas

de una concha amorosa que defiende

su misterio, su carne, su secreto;

cuando no pueda oír abrirse

la rosa de tu beso ni tocarla

(tacto mío marchito entre la tierra yerta)

ni sentir que me nace otro perfume

que le responda al tuyo,

ni enseñar a tus rosas

el color de mis rosas?

 

¿Y si llegaras tarde

y encontraras (tan solo)

las cenizas heladas de la espera?

 

De: “Sabor eterno” (1939)

 

Homem à espera

(Frank Habbas: artista norte-americano)

 

Poema impaciente

 

E se você chegar tarde,

quando minha boca tiver

sabor seco de cinzas,

e de terras amargas?

 

E se chegar quando

a terra removida e escura (cega, morta)

chova sobre meus olhos,

e desterrado da luz do mundo

te busque em minha luz,

na luz interior que eu achava

que vinha fluindo em mim?

(Quando talvez descubra

que nunca tive luz

e ande tateando dentro de mim mesmo,

como um cego que tropeça a cada passo

com lembranças que ferem como cardos.)

 

E se chegar quando já o tédio

ate e tape as mãos;

quando não possa abrir os braços

e fechá-los depois como as valvas

de uma concha amorosa que defende

seu mistério, sua carne, seu segredo;

quando não possa ouvir abrir

a rosa de seu beijo nem tocar

meu tato murcho entre a erva hirta)

nem sentir que nasce em mim outro perfume

que lhe responda ao seu,

nem mostrar a suas rosas

a cor das minhas?

 

E se você chegasse tarde

e encontrasse (apenas)

as cinzas gélidas da espera?

 

De: “Sabor eterno” (1939)

 

Referência:

 

BALLAGAS, Emilio. Poema impaciente / Poema impaciente. Tradução de Alai Garcia Diniz e Luizete Guimarães Barros. In: LEMUS, Virgilio López (Seleção, prefácio e notas). Vinte poetas cubanos do século XX. Tradução de Alai Garcia Diniz e Luizete Guimarães Barros. Edição bilíngue. Florianópolis, SC: Ed. da UFSC, 1995. Em espanhol: p. 74; em português: p. 75.

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