A voz poética de um
espelho reflete apenas a “verdade” corpórea daquela que, dia após dia, põe-se à
sua frente, melhor dizendo, a realidade de uma mulher exposta às contingências
do tempo, lembrando-a do indefectível processo de envelhecimento, em direção ao
fatal e intimidante momento, em que tudo há de findar.
Como muitas das
criações de Plath, este poema chega até o leitor pejado de emoções angustiosas:
o tom rosado da juventude vai perdendo o seu viço, o rosto envelhece e a “verdade”
que se reflete ao espelho muitas vezes entra em conflito com um mundo de
aparências enganosas (muitas vezes assumidas na tentativa de se ostentar um
estado feliz – deveras presente no espírito).
J.A.R. – H.C.
Sylvia Plath
(1932-1963)
Mirror
I am silver and
exact. I have no preconceptions.
Whatever I see I
swallow immediately
Just as it is,
unmisted by love or dislike.
I am not cruel, only
truthful –
The eye of a little
god, four-cornered.
Most of the time I
meditate on the opposite wall.
It is pink, with
speckles. I have looked at it so long
I think it is a part
of my heart. But it flickers.
Faces and darkness
separate us over and over.
Now I am a lake. A
woman bends over me,
Searching my reaches
for what she really is.
Then she turns to
those liars, the candles or the moon.
I see her back, and
reflect it faithfully.
She rewards me with
tears and an agitation of hands.
I am important to
her. She comes and goes.
Each morning it is
her face that replaces the darkness.
In me she has drowned
a young girl, and in me an old woman
Rises toward her day
after day, like a terrible fish.
23 October 1961
Mulher à beira de um
lago
(James Smetham:
pintor inglês)
Espelho
Sou prateado e exato.
Não tenho preconceitos.
O que quer que veja, assimilo
de imediato
Tal como é, sem névoas
de amor ou aversão.
Não sou cruel, apenas
veraz –
O olho quadrangular
de um pequeno deus.
Na maior parte do
tempo medito sobre a parede oposta.
É rosada, com
manchas. Tanto tempo levo a observá-la
Que penso já fazer
parte de meu coração. Mas ela meneia.
Rostos e escuridão
nos separam vezes sem conta.
Agora sou um lago.
Uma mulher se inclina sobre mim,
Procurando em meus
domínios pelo que ela realmente é.
Então se volta para aquelas
mentirosas, as velas ou a lua.
Vejo suas costas, e
as reflito com fidelidade.
Ela me recompensa com
lágrimas e um agitar de mãos.
Sou importante para
ela. Ela vem e vai.
A cada manhã, é o seu
rosto que substitui a escuridão.
Em mim ela afogou uma
jovem, e em mim uma velha
Se ergue até ela, dia
após dia, como um terrível peixe.
23 de outubro de 1961
Referência:
PLATH, Sylvia.
Mirror. In: __________. The collected poems. Edited by Ted Hughes. New
York, NY: Harper & Row Publishers, 1981. p. 173-174.
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