Estes versos de Age
de Carvalho reportam-se, decerto, à forma característica como Carlos Drummond
de Andrade (1902-1987) enceta os seus poemas, sobretudo, parece-me, em “A Rosa
do Povo” (1945) e em “Claro Enigma” (1951), aliás, dois de seus poemário exordiais,
bem a contexto da linha introdutória do infratranscrito poema: “Chego as tuas
primeiras idades, Carlos”.
As notas de
desencanto e de uma ironia verbalizada transversalmente na sucessão dos versos,
a metalinguagem tantas vezes empregada, o tema incontornável do amor, as
digressões sobre a realidade sócio-política de momento, a transitoriedade de todo
o existir humano: eis o painel em que se mira o poeta paraense, em suas andanças
a mãos dadas com o mais ilustre dos itabiranos.
J.A.R. – H.C.
Age de Carvalho
(n. 1958)
Carlos
Chego as tuas
primeiras idades, Carlos,
e a dor que me
funciona
não é igual a que
carregaste,
tampouco semelhante
àquela que move
a fome do mundo.
Compreendo lutar com
palavras,
feita de
consistências diárias e azuis,
e, embora talvez ria
como em algum tempo
riste, tenha gestos,
atitudes,
dores palavras
amores;
embora mesmo que
chegue a tocar um poema
como tu, a beijá-Ia
com pudor
e desprezá-Ia usado
na boca errada,
nada será igual nem
parecido.
O mundo não é o
mesmo.
(Como não será
adiante e não foi no passado,
a minha infância e a
tua maturidade).
Contudo, Carlos,
caminhamos.
Em: “Arquitetura dos Ossos”
(1980)
Carlos Drummond de
Andrade
(Retratado por Cândido
Portinari)
Referência:
CARVALHO, Age de. Carlos. In: _________. In: __________. ROR: 1980-1990. São Paulo, SP: Duas Cidades; Secretaria de Estado de Cultura, 1990. p. 167. (Coleção ‘Claro Enigma’)
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