Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 21 de outubro de 2022

Alice Ruiz - Socorro

A voz poética grita por socorro, pois que perdeu a capacidade de sentir alguma coisa, de rir ou de chorar, de experimentar alguma emoção de amor ou de dor, corolário de uma sensação de impassibilidade ou de indiferença com o que ocorra ou deixe de ocorrer à sua volta, porque o coração ora se compraz na inércia, em vez de pulsar no peito de quem ainda vive.

 

Há tanta falta de sentido na existência daquela que nos versos se expressa, que ela admite emprestar até mesmo as “penas” de alguma “alma penada”. Afinal, ser humano(a) é ter sentimentos, é fazer arder a chama de um propósito maior, sem o qual os dias se sucedem num vale de despretensão, de abulia cromática, de imobilidade ao sol, semelhando-se à própria morte.

 

J.A.R. – H.C.

 

Alice Ruiz

(n. 1946)

 

Socorro

 

Socorro, eu não estou sentindo nada.

Nem medo, nem calor, nem fogo,

não vai dar mais pra chorar

nem pra rir.

 

Socorro, alguma alma, mesmo que penada,

me empreste suas penas.

Já não sinto amor nem dor,

já não sinto nada.

 

Socorro, alguém me dê um coração,

que esse já não bate nem apanha.

Por favor, uma emoção pequena,

qualquer coisa que se sinta,

tem tantos sentimentos,

deve ter algum que sirva.

 

Socorro, alguma rua que me dê sentido,

em qualquer cruzamento,

acostamento, encruzilhada,

socorro, eu já não sinto nada.

 

Indiferença

(Haley Beltran: artista norte-americana)

 

Referência:

 

RUIZ, Alice. Socorro. In: ANDRADE, Mário de et al. 50 poemas de revolta. 1. ed. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 2017. p. 26-27.

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