Uma palavra de
agradecimento opera milagres no relacionamento humano, podendo derreter “neve
ou ferro”, segundo Neruda: basta ver o quanto o entorno de uma pessoa sempre
disposta a reconhecer a providência de um favor impregna-se dos melhores fluídos,
tornando o convívio com os seus pares muito mais ameno.
Vejam-se as figuras
empregadas pelo poeta para enfatizar a positividade que o vocábulo é capaz de sugerir:
uma “pétala de açúcar”, uma “pílula contra os óxidos cortantes do desprezo”, um
“tapete entre os mais distantes homens”, “pétala” diante da qual se escondem os
“punhais do orgulho”, fazendo aparecer “um centavo de sorriso”. Grato pela
palavra “gratidão”!
J.A.R. – H.C.
Pablo Neruda
(1904-1973)
Oda a las Gracias
Gracias a la palabra
que agradece.
Gracias a gracias
por
cuanto esta palabra
derrite nieve o
hierro.
El mundo paecía amenazante
hasta que suave
como pluma
clara,
o dulce como pétalo
de azúcar,
de labio en labio
pasa
gracias,
grandes a plena boca
o susurrantes,
apenas murmulladas,
y el ser volvió a ser
hombre
y no ventana,
alguna claridad
entró en el bosque:
fue posible cantar
bajo las hojas.
Gracias, eres la píldora
contra
los óxidos cortantes
del desprecio,
la luz contra el
altar de la dureza.
Tal vez
también tapiz
entre los más
distantes hombres
fuiste.
Los pasajeros
se diseminaron
en la naturaleza
y entonces
en la selva
de los desconocidos,
merci, mientras el tren
frénetico
cambia de patria,
borra las fronteras,
spasivo,
junto a los
puntiagudos
volcanes, frío y
fuego,
thanks, sí, gracias,
y entonces
se transforma la
tierra en una mesa:
um palabra la limió,
brillan platos y
copas,
suenan los tenedores
y parecen manteles
las llanuras.
Gracias, gracias,
que viajes y que
vuelvas,
que subas
y que bajes.
Está entendido, no
lo llenas todo,
palabra gracias,
pero
donde aparece
tu pétalo pequeño
se esconden los
puñales del orgullo,
y aparece um centavo
de sonrisa.
En: “Navegaciones y
regresos” (1959)
Gratidão
(Tamara Phillips:
artista canadense)
Ode à Gratidão
Grato pela palavra
que agradece.
Grato a grato
pelo
quanto essa palavra
derrete neve ou
ferro.
O mundo parecia ameaçador
até que suave
como uma pluma
clara,
ou doce como pétala
de açúcar,
de lábio em lábio
passa,
grato,
grandes a boca plena
ou sussurrantes,
apenas murmuradas,
e o ser voltou a ser
homem
e não janela,
alguma claridade
entrou no bosque:
foi possível cantar
embaixo das folhas.
Grato, és a pílula
contra
os óxidos cortantes
do desprezo,
a luz contra o altar
da dureza.
Talvez
também tapete
entre os mais
distantes homens
foste.
Os passageiros
se disseminaram
na natureza
e então
na selva
dos desconhecidos,
merci, enquanto o trem
frenético
muda de pátria,
borra as fronteiras,
spasivo,
junto aos pontiagudos
vulcões, frio e fogo,
thanks, sim, gracias,
e então
a terra se transforma
em uma mesa:
uma palavra a limpou,
brilham os pratos e
copos,
ressoam os talheres
e parecem toalhas as
planuras.
Grato, gracias,
que viajes e que
voltes,
que subas
ou que desças.
Está entendido, não
preenches tudo,
palavra grato,
mas
onde aparece
tua pequena pétala
escondem-se os
punhais do orgulho
e aparece um centavo
de sorriso.
Em: “Navegações e
Regressos” (1959)
Referências:
Em Espanhol
NERUDA, Pablo. Oda a
las gracias. In: __________. Poesías. Selección y prólogo de Roberto
Fernández Retamar. La Habana, CU: Casa de las Américas, 1972. p. 317-318.
(Colección Literatura Latinoamericana)
Em Português
NERUDA, Pablo. Ode à
gratidão. Tradução de José Rubens Siqueira. In: __________. Navegações e
regressos. Tradução de José Rubens Siqueira. 1. ed. São Paulo, SP: MEDIAfashion,
2012. p. 87-89. (Coleção Folha. Literatura ibero-americana; v. 9)
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