Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 6 de outubro de 2022

Hermann Hesse - Lamento

Somos fluxo, correnteza, mutação – nunca estabilidade ou segura constância –, numa jornada irreversível do nascimento à morte, pouco importando o anseio que manifestemos de permanência, de sofreguidão por tornarmo-nos um ser no sentido autêntico da palavra: pairamos nos imperscrutáveis, nos insondáveis desígnios do Criador.

 

O afã de se transformar em pedra, relatado pela voz lírica, tem por escopo o atingimento da eternidade. Mas mesmo a pedra se submete ao transitório, ainda que possa perdurar como tal por centúrias e centúrias: repouso não é verbete que sintetize as voltas e reviravoltas de nossas sendas. Como Heráclito: “Nada é permanente, exceto a mudança”.

 

J.A.R. – H.C.

 

Hermann Hesse

(1877-1962)

 

Klage

 

Uns ist kein Sein vergönnt. Wir sind nur Strom,

Wir fließen willig allen Formen ein:

Dem Tag, der Nacht, der Höhle und dem Dom,

Wir gehn hindurch, uns treibt der Durst nach Sein.

 

So füllen Form um Form wir ohne Rast,

Und keine wird zur Heimat uns, zum Glück, zur Not,

Stets sind wir unterwegs, stets sind wir Gast,

Uns ruft nicht Feld noch Pflug, uns wächst kein Brot.

 

Wir wissen nicht, wie Gott es mit uns meint,

Er spielt mit uns, dem Ton in seiner Hand,

Der stumm und bildsam ist, nicht lacht noch weint,

Der wohl geknetet wird, doch nie gebrannt.

 

Einmal zu Stein erstarren! Einmal dauern!

Danach ist unsre Sehnsucht ewig rege,

Und bleibt doch ewig nur ein banges Schauern,

Und wird doch nie zur Rast auf unsrem Wege.

 

(Januar 1934)

 

O Lamento

(Alina Suleyman: artista cazaquistanesa)

 

Lamento

 

A nós não foi doado um ser. Somos apenas correnteza,

Fluímos de bom grado pelas formas:

Pelo dia e a noite, a gruta e a catedral.

Por elas penetramos, incitados pela sede de ser.

 

Assim nós vamos sem repouso, enchendo as formas uma a uma,

Sem que nenhuma delas seja para nós a pátria, a ventura ou a dor.

Estamos sempre a caminhar, somos sempre visitantes,

Não ouvimos o apelo do campo nem do arado, para nós

não cresce o pão.

 

Os desígnios de Deus sobre nós não sabemos,

Ele brinca conosco, barro em sua mão,

O barro que é mudo e tem plasticidade, que não sabe nem

rir nem chorar:

Barro amassado, porém jamais queimado.

 

Ah! Quem me dera transformar-me em dura pedra!

Permanecer enfim!

É que nós aspiramos à eternidade,

Mas nossa aspiração é apenas, eternamente, um medroso tremor,

E não virá jamais a ser repouso em nossa via.

 

(Janeiro de 1934)

 

Referências:

 

Em Alemão

 

HESSE, Hermann. Klage. In: __________. Die gedichte: 1892-1962. 19. auflage. Frankfurt am Main, DE: Suhrkamp, 1977. s. 628.

 

Em Português

 

HESSE, Hermann. Lamento. Tradução de Lavinia Abranches Viotti e Flávio Vieira de Souza. In: __________. O jogo das contas de vidro. 7. ed. Tradução de Lavinia Abranches Viotti e Flávio Vieira de Souza. Rio de Janeiro, RJ: BestBolso, 2017. p. 517-518.

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