Na origem, o símbolo,
prenhe de significados. Ou seria: na origem, o “Big Bang”, que leva a mais indagações
do que elucida, de uma vez por todas, o “ponto zero” do universo? Daí a
perplexidade do poeta: “É impossível fazer estilhaços de estilhaços sem uma
coerência primeira, agora ausente”.
Para se perceber a
complexidade do tema, um pensamento de Jung contido em “Problèmes de L’Ame
Moderne” (“Problemas da Alma Moderna”): “Um símbolo nada encerra, nada explica;
remete para além de si mesmo, em direção a um significado – e ainda nesse além,
inapreensível, obscuramente pressentido, tal que nenhuma palavra da linguagem
que falamos poderia expressá-lo de modo satisfatório”. (JUNG, 1960, p. 92)
Mexia reporta-se à
“infância”. Quero crer que se refira, propriamente, menos ao estágio inicial da
vida de uma criança do que à uma metáfora para o início das coisas, lá onde
tudo encontraria as suas explicações e significados, recolhidos a um “caderno”.
E eis-nos aqui à volta de mais uma insígnia do orto – os “primeiros cadernos” –,
designativo para muitas das obras verdoengas de poetas e escritores.
J.A.R. – H.C.
Pedro Mexia
(n. 1972)
Os Significados
Não sei como tudo
começou: suponho
que havia uma figura
que depois
se estilhaçou para
formar um puzzle.
Mas se juntarem todas
as peças
talvez não haja
nenhuma figura, e então
de que origem intacta
partiu tudo
o que depois se
quebrou? É impossível
fazer estilhaços de
estilhaços sem uma
coerência primeira,
agora ausente.
Quando todas as peças
se juntam
estaremos reduzidos
ainda a uma peça
de uma figura maior,
ou essa figura
é uma utopia
pragmática, instrumental,
que permite algum
sentido?
Ó significados, para
vós, na infância,
tinha um caderno.
Em: “Duplo Império”
(1999)
Forma Livre
(Jackson Pollock:
pintor norte-americano)
Referências:
JUNG, Carl Gustav. Problêmes
de l’âme moderne. Préface de Roland Cahen. Traduction par Yves le Lay. Paris,
FR: Buchet/Chastel-Corrêa, 1960.
MEXIA, Pedro. Os
significados. In: __________. Menos por menos: poemas escolhidos.
Lisboa, PT: Publicações Dom Quixote, 2011. p. 13.
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