Alpes Literários

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Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 14 de outubro de 2022

Rainer Maria Rilke - Tu, que montanha já eras...

O monge, autor imaginário dos poemas de “O Livro de Horas”, de Rilke, dedica-se aqui a solenizar o ideal franciscano de pobreza, vale dizer, o princípio da renúncia como forma de concretizar os seus anseios de proximidade com Deus – assumindo-se, claro está, uma interpretação magnânima para tais versos, menos que filosófica na extensão de seus exatos termos.

 

Com efeito, a abordagem mística assumida converte quaisquer traços de vontade e de orgulho em humildade, corolário das ilusões e das “contradições do ser”, expondo o falante a uma “hora estranha”, vivenciada angustiosamente nas grandes cidades, onde aspira libertar-se de toda dúvida e desespero pela via da reconciliação com o divino.

 

J.A.R. – H.C.

 

Rainer Maria Rilke

(1875-1926)

 

Du Berg, der blieb...

 

Du Berg, der blieb, da die Gebirge kamen, –

Hang ohne Hütten, Gipfel ohne Namen,

ewiger Schnee, in dem die Sterne lahmen,

und Träger jener Tale der Zyklamen,

aus denen aller Duft der Erde geht;

du, aller Berge Mund und Minaret

(von dem noch nie der Abendruf erschallte):

 

Geh ich in dir jetzt? Bin ich im Basalte

wie ein noch ungefundenes Metall?

Ehrfürchtig füll ich deine Felsenfalte,

und deine Härte fühl ich überall.

 

Oder ist das die Angst, in der ich bin?

die tiefe Angst der übergroßen Städte,

in die du mich gestellt hast bis ans Kinn?

 

O daß dir einer recht geredet hätte

von ihres Wesens Wahn und Abersinn.

Du stündest auf, du Sturm aus Anbeginn,

und triebest sie wie Hülsen vor dir hin...

 

Und willst du jetzt von mir: so rede recht, –

so bin ich nicht mehr Herr in meinem Munde,

der nichts als zugehn will wie eine Wunde;

und meine Hände halten sich wie Hunde

an meinen Seiten, jedem Ruf zu schlecht.

 

Du zwingst mich, Herr, zu einer fremden Stunde.

 

In: Drittes Buch – “Von der Armut und vom Tode” (1903)

 

Vale da Montanha Verde

(Steve Henderson: pintor norte-americano)

 

Tu, que montanha já eras...

 

Tu, que montanha já eras quando as montanhas chegaram

– ladeira sem cabanas, cumeadas sem nome,

neve eterna em que afogam-se todas as estrelas

e portador dos vales de ciclames

dos quais emanam uns cheiros de terra –

Tu, boca e minarete de todas as montanhas

(de onde jamais se ouviram no crepúsculo os sinos).

 

Por ti vou eu agora. Estarei no basalto

que nem um mineral ainda não descoberto?

Respeitoso preencho tuas rochosas fendas

e teu coração duro eu sinto em toda parte.

 

Ou será isto a angústia em que me encontro?

A funda angústia das grandes cidades

em que tu me enfiaste até o pescoço?

 

Ah, se alguém de bem te houvesse falado

das ilusões e das contradições do ser,

adiá-las-ias tu, procela dos começos,

e as jogarias diante de ti, recipiente imóvel.

 

E agora é de mim que queres saber?

Fala direito, pois já não sou senhor de minha boca

que nada mais quer ser senão ferida,

e minhas mãos aguardam como cães

a meu lado, mais bravos a cada chamado.

 

Tu me forças, Senhor, a uma hora estranha!

 

Em: Livro Terceiro – “Da Pobreza e da Morte” (1903)

 

Referências:

 

Em Alemão

 

RILKE, Rainer Maria. Du berg, der blieb... In: __________. Das Stunden-Buch. Leipzig, DE: Insel-Verlag, 1918. p. 83-84. Disponível neste endereço. Acesso em: 28 set. 2022.

 

Em Português

 

RILKE, Rainer Maria. Tu, que montanha já eras... Tradução de Geir Campos. In: __________. Livro das horas. Tradução de Geir Campos. 2. ed. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira, 1994. p. 148-149.

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