O desconsolo de um velho, com a cabeça a repousar sobre a mesa de um ruidoso café, depois que, transcorrido praticamente todo o tempo útil de sua vida, percebe que já pouco há por suceder: o tempo que ficou para trás, sem que se materializassem os seus anelos, sobressalta-o com mil inquietações existenciais.
“Não deixe para amanhã o que você pode fazer hoje”: é acerca desse adágio popular que o poema de hoje verte suas linhas. E mais que isso: a previdência da diligente formiga, em confronto à postura folgazã da cigarra, na fábula de Esopo. Afinal, o inverno da velhice descuidada assombra aquele que, no verão, pôs-se a rifar seus dias entre patuscadas e frivolidades.
J.A.R. – H.C.
Robert Pinsky
(n. 1940)
An Old Man
after Cavafy
Back in a corner, alone in the clatter and babble
An old man sits with his head bent over a table
And his newspaper in front of him, in the cafe.
Sour with old age, he ponders a dreary truth –
How little he enjoyed the years when he had youth,
Good looks and strength and clever things to say.
He knows he’s quite old now: he feels it, he sees
it,
And yet the time when was young seems – was it?
Yesterday. How quickly, how quickly it slipped
away.
Now he sees how Discretion has betrayed him,
And how stupidly he let the liar persuade him
With phrases: Tomorrow. There’s plenty of time.
Some day.
He recalls teh pull of impulses he suppressed,
The joy he sacrificed. Every chance he lost
Ridicules his brainless prudence a different way.
But all these thoughts and memories have made
The old man dizzy. He falls asleep, his head
Resting on the table in the noisy cafe.
Filósofo em Meditação
(Rembrandt van Rijn: pintor holandês)
Um Velho
segundo Cavafy
Ao fundo num canto, em meio ao burburinho,
Senta-se um velho, cabeça curva, sozinho,
jornal aberto à sua frente, no bar.
Acre velhice, dura verdade pondera –
Tão pouco desfrutou quando ’inda jovem era,
Boa aparência, vigor, esperto ao falar.
Sabe que agora está muito velho. Vê, sente,
Mesmo que a juventude pareça – foi? Ontem.
Como rápido, rápido foi escapar.
Vê agora como a Discrição o traiu,
Tolo, como a mentira o persuadiu
Com frases: Amanhã. Um dia. Há tempo a gastar.
Lembra-se do arroubo dos impulsos contidos,
Da alegria imolada. Chances perdidas
Da sua insana prudência põem-se a zombar.
Mas todos esses pensamentos e lembranças
O velho aturdem. Adormece, a cabeça
Pesa sobre a mesa no barulho do bar.
Referência:
PINSKY, Robert. An old man / Um velho. Tradução
de Maria Lúcia Milléo Martins. In: O’SHEA, José Roberto (Org.). Antologia de
poesia norte-americana contemporânea. Tradução de Maria Lúcia Milléo
Martins. Florianópolis, SC: Ed. da UFSC, 1997. Em inglês: p. 168; em português:
p. 169.
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