Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 7 de março de 2021

Lao-Tzu - Tao-Te King: XI

Este aforismo do Tao-Te King faz-me lembrar das primeiras lições de Física Quântica, alusivas à composição do átomo, muito mais preenchido pelo vazio do que pelas partículas de nêutrons, prótons e elétrons. Outra associação possível é a que se atribui à menor ou maior extensão de silêncio entre as notas musicais, permitindo distintos efeitos sobre a composição como um todo.

Não deixa de ser desconcertante perceber que tantas coisas úteis somente se habilitam a produzir resultados em virtude da existência de algum espaço, do vazio, do hiato, da pausa, do descano: seria uma ilusão imputar valor somente ao que seja continuamente visível ou palpável. Dance e se revigore, mas descanse um bocado para manter o equilíbrio!

J.A.R. – H.C.
 

Lao-Tzu

(~601 a.C. – 531 a.C.)

 

XI

 

Trinta raios cercam o eixo:

a utilidade do carro consiste no seu nada.

Escava-se a argila para modelar vasos:

a utilidade dos vasos está no seu nada.

Abrem-se portas e janelas para que haja um quarto:

a utilidade do quarto está no seu nada.

 

Por isso, o que existe serve para ser possuído

e o que não existe, para ser útil.

 

(LAO-TZU, 2006, p. 47)

 

Natureza-morta com maçãs, copo e jarra

(Paul Cézanne: pintor francês)

 

XI: A atuação do invisível no visível

 

Trinta raios convergentes no centro

Tem uma roda,

Mas somente os vácuos entre os raios

É que facultam seu movimento. (*)

O oleiro faz um vaso, manipulando a argila,

Mas é o oco do vaso que lhe dá utilidade.

Paredes são massas com portas e janelas,

Mas somente o vácuo entre as massas

Lhes dá utilidade –

Assim são as coisas físicas,

Que parecem ser o principal,

Mas o seu valor está no metafísico.

 

(LAO-TSÉ, 2009, p. 47)


Nota:

(*) Lao-Tsé se refere, provavelmente, à roda de um moinho de vento, que não funcionaria se não houvesse interstícios entre as palhetas, por onde passa o vento. (LAO-TSÉ, 2009, p. 47)

Explicação Filosófica:

O invisível age pelo visível. A metafísica do Uno se revela na física do Verso. A aparente passividade da alma se manifesta pela atividade do corpo. A causa subjaz a todos os efeitos temporários. A essência se revela em todas as existências. Quando o Todo, que é, age pelo Nada, que não é – então Algo começa a existir. Os fatos não criam valores, mas o valor produz os fatos. (LAO-TSÉ, 2009, p. 47-48)

Referências:

LAO-TSÉ. XI: A atuação do visível no invisível. Tradução de Huberto Rohden. In: __________. Tao Te Ching: o livro que revela Deus. Tradução e notas de Huberto Rohden. 4. ed. 1. reimp. São Paulo, SP: Martin Claret, 2009. (Coleção ‘A Obra-Prima de Cada Autor’; v. 136)

LAO-TZU. LXIV. Tradução de Margit Martincic. In: __________. Tao-Te King: texto e comentário de Richard Wilhelm. Tradução de Margit Martincic. São Paulo, SP: Pensamento, 2006.

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