Sobre o número π, detentor, sem dúvida, de um status de celebridade, o poeta ressalta, ademais, a sua natureza transcendental, a que acrescemos a “irracionalidade” matemática e os atributos esotéricos, neste caso – insuspeitavelmente –, pelo fato de que o perímetro de uma pirâmide, dividido por sua altura, equivale a, aproximadamente, duas vezes o número em comento. E, obviamente, não houve civilização no mundo – com exceção àquela concernente aos astecas mexicanos –, que tenha se dedicado tanto às pirâmides quanto a egípcia, claro está, em expressa conexão com o lado metafísico da existência!
O número π, tantas vezes aplicado a equações que buscam retratar o comportamento do mundo físico, acaba por servir de mote rutilante ao olhar do poeta, porque, em sua infinidade de dígitos, expressa, antiteticamente, uma racionalidade presente no centro do universo. Ou por outra: se o universo é um “locus” racional e bem disposto, então qual o móbil para a necessidade de um número irracional capaz de descrevê-lo?
É sobre esse dilema que, vez por outra, os vates se debruçam: a beleza do mundo é parte do mistério que o envolve – como diria Pascal, desde a sua escala infinita até a infinitesimal –, ainda que, desafortunadamente, derrapemos erradios pelas curvas e retas de suas estradas, enquanto continuamos em nossa vã persecução de reconciliar mente e matéria.
J.A.R. – H.C.
Robert Morgan
(n. 1944)
π
The secret relationship
of line and circle, progress
and return, is always known,
transcendental and yet
a commonplace. And though
the connection is written
it cannot be written out
in full, never perfect, but
is exact and constant, is
eternal and everyday
as orbits of electrons,
chemical rings, noted here
in one brief sign as gateway
to completed turns and
the distance inside circles,
both compact and infinite.
Ritmos Circulares nº 4
(Suzy Abrahams: artista inglesa)
π
A relação secreta
entre linha e círculo, avanço
e retrocesso, é sempre conhecida,
transcendental e, no entanto,
lugar-comum. Ainda que
a ligação seja escrita,
não pode ser escrita
na íntegra, nunca perfeita, mas
é exata e constante, é
eterna e cotidiana
como órbitas de elétrons,
anéis químicos, vistos aqui
num breve sinal como porta
para voltas completas e
distância dentro dos círculos,
ambos compactos e infinitos.
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