Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 19 de março de 2021

Mario Benedetti - Subúrbia

O poeta uruguaio já contava quase seis décadas quando redigiu este poema: não estava, decerto, no “centro” de sua vida, mas já algo para mais, quando a morte encena os seus primeiros exercícios, em companhia das Parcas. Mas bem percebe o ente lírico os efeitos do avanço dos anos, num momento em que se combinam “convicções coloridas” a uma “dor” que se amplifica gradativamente.

Contudo, não quer ele nem pensar em morte, pois esta lhe parece estar muito distante do “centro”, do “núcleo capital” de sua vida, ainda bastante permeada por chuva e terra, ou, como se diria, teluricamente impregnada pelo chão calcado aos pés.

Ao fim, o poeta nos afirma – como se disse – jamais estar no “centro” de sua vida, e tudo quanto se atesta no poema teria sido enunciado por uma terceira mirada: heteronomia “poeta x ente lírico”?! Ou seria uma alusão ao fato de que, quer queira quer não, o poeta, à altura da redação do poema, já havia passado da meia-idade, caso a consideremos como o interregno que se protrai, estimativamente, entre os 35 e os 55 anos de idade?! Ou ainda, Benedetti se percebe como uma pessoa que não detém completo controle ou domínio sobre o que se passa em sua vida?! O que pensa você, internauta?...

J.A.R. – H.C.

 

Mario Benedetti

(1920-2009)

 

Suburbia

 

En el centro de mi vida

en el núcleo capital de mi vida

hay una fuente luminosa un surtidor

que alza convicciones de colores

y es lindo contemplarlas y seguirlas

 

en el centro de mi vida

en el núcleo capital de mi vida

hay un dolor que palmo a palmo

va ganando su tiempo

y es útil aprender su huella firme

 

en el centro de mi vida

en el núcleo capital de mi vida

la muerte queda lejos

la calma tiene olor a lluvia

la lluvia tiene olor a tierra

 

esto me lo contaron porque yo

nunca estoy en el centro de mi vida.

 

En: “Cotidianas” (1979)

 

Subúrbia

(Maja Đokić Mihajlović: pintora sérvia)

 

Subúrbia

 

No centro da minha vida

no núcleo capital da minha vida

há uma fonte luminosa um chafariz

que levanta convicções coloridas

e é lindo contemplá-las e segui-las

 

no centro da minha vida

no núcleo capital da minha vida

há uma dor que palmo a palmo

vai ganhando seu tempo

e é útil aprender sua marca firme

 

no centro da minha vida

no núcleo capital da minha vida

a morte fica longe

a calma tem cheiro de chuva

a chuva tem cheiro de terra

 

isto me contaram porque eu

nunca estou no centro da minha vida

 

Em: “Cotidianas” (1979)


Referência:

BENEDETTI, Mario. Suburbia / Subúrbia. Tradução de Julio Luís Gehlen. In: __________. Antologia poética. Edição bilíngue. Seleção, tradução e apresentação de Julio Luís Gehlen. Ilustrações de Luiz Trimano. Rio de Janeiro, RJ: Record, 1988. Em espanhol: p. 130; em português: p. 131.

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