O ente lírico põe-se a lembrar da época em que, adolescente, contemplava a sua aldeia numa ampla mirada, acomodável nas palmas de suas mãos: sente mágoas pelo espinho afigurado pela torre da igreja, pois que lhe evoca nostálgicos momentos. Com efeito, os versos espelham o idílio vivenciado pelo poeta, moldado em versos que humanizam estados ou eventos da natureza.
“Adolescente” não é propriamente o sol, senão a conjuntura sob a qual se manifestam os elementos contingentes memorados pelo falante. Afinal, sempre temos uma história feliz – ou, desafortunadamente, nem tanto – de quando éramos adolescentes ou ainda crianças, instantes nos quais nossas personalidades ainda estavam sendo moldadas pelos encontros e desencontros da vida.
J.A.R. – H.C.
Sérgio Milliet
(1898-1966)
O Sol Adolescente
O sol adolescente
banha os campos retangulares.
Sopra o vento cuidadoso
para que as folhas não caiam.
E brinca o riacho leviano
brinca de sela com as pedras redondas.
Os galhos dos pinheiros
abanam-se mutuamente
e nos flancos das colinas
as cerejeiras brotam de vasos negros.
Essa aldeia cabe nas minhas mãos abertas.
Mas a torre da igreja
fere-me as palmas
como um espinho de nostalgia.
Em: “Alguns Poemas Entre Muitos” (1957)
A velha torre nos campos
(Vincent van Gogh: pinto holandês)
Referência:
MILLIET, Sérgio. O sol adolescente. In:
PONTIERO, Giovanni (Notes and Introduction). An anthology of brazilian modernist
poetry. 1st. ed. Oxford, EN: Pergamon Press, 1969. p. 59.
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