O poeta descreve todo o seu processo criador ao elaborar o poema, um misto de influxos internos e externos, incitando-lhe desejos profundos de oferecer algo assemelhado ao sol a seus leitores, um luzeiro capaz de cingi-los silenciosamente, num autêntico “laboratório do abraço”.
Não há, nas imagens empregadas por Rosas, algo que se pareça, pronunciadamente, a um sopro esotérico de inspiração, “insight” ou iluminação pelas musas, senão – melhor se diria – uma espécie de conduta diária que, à força de repeti-la, converte-se em feitos reflexos, a exemplo do próprio poema, autêntico cadinho onde se recolhem, sob a foram de palavras, levas de intuições, sentimentos e emoções.
J.A.R. – H.C.
José Ruiz Rosas
(1928-2018)
Así escribo el poema
Así escribo el poema. Doy un paso,
duermo, sonrío, lloro en mis adentros,
mastico la ancha hiel de los instintos
puestos a galopar, protones lúdicos
flotando sus latentes emociones;
miro la luz, que es el mirar más último
antes de penetrar en cada arcano;
oigo no sé qué cosas en los cantos
de las aves por un momento libres
y se me empuña el corazón sabiendo
su final de cautivas o de víctimas;
aspiro el aire altísimo que baja
a decorar de oxígeno mis huesos;
llego, me voy, distante en todo tiempo
de la meta final que no he fijado;
pulso la hora intacta que ha parido
el otoño de un ramo, atrapo el claro
destello de unos ojos fraternales,
miro los flujos que soporta el mundo
por pasos con sus callos melancólicos,
torno, vuelvo a mirar y abro los ojos
como un insomne búho en medio día
y fijo las pupilas como el gato
que pretendiera caza de aeroplanos,
subo la cuesta, bajo, y subo, y bajo
y conservo el imán del pavimento;
llego, con mi codicia a manos llenas
a regalarle el sol a todo el mundo
y la sombra, la luna y los luceros
como si todo yo fuera raíces,
hojas y savia para estar callado
como un laboratorio del abrazo;
así escribo el poema. Doy un paso.
Garoto a empinar uma pipa
(Frederick McCubbin: pintor australiano)
Escrevo assim o poema
Escrevo assim o poema. Dou um passo,
durmo, sorrio, choro por dentro,
mastigo o amplo fel dos instintos
postos a galopar, prótons lúdicos
flutuando as suas latentes emoções;
miro a luz, que é o derradeiro olhar
antes de penetrar em cada arcano;
ouço não sei que coisas nos cantos
das aves livres por um momento
e se me aperta o coração sabendo
o seu final de cativas ou de vítimas;
inalo o altíssimo ar que desce
para adornar de oxigênio os meus ossos;
chego, parto, distante o tempo todo
da meta final por mim não fixada;
apalpo a hora intacta que pariu
o outono de um ramalho, capto o claro
fulgor de uns olhos fraternais,
contemplo os fluxos que o mundo suporta
por etapas, com seus melancólicos calos,
viro-me, volto a mirar e abro os olhos
como um mocho insone ao meio-dia
fixando as pupilas como um gato
que pretendesse caçar aviões,
subo a colina, desço, e subo, e desço
e mantenho o ímã do pavimento;
chego, com meu ardente desejo à mancheia,
a oferecer o sol a todo mundo
e a sombra, a lua e as estrelas
como se tudo em mim fossem raízes,
folhas e seiva para ficar em silêncio
como um laboratório do abraço;
escrevo assim o poema. Dou um passo.
Referência:
ROSAS, José Ruiz. Así escribo el poema.
In: PANTIGOSO, Manuel. José Ruiz Rosas: el brillo esencial detrás de la
oscuridad perfecta. Lima, Peru. Boletín de la Academia Peruana de la Lengua,
n. 64 (2018): jul.-dic., p. 47-71. Original em espanhol: p. 65-66. Disponível neste endereço. Acesso em: 23 fev.
2021.
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