Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 17 de janeiro de 2021

Lya Luft - Nunca tivemos filhos juntos

O casal não teve filhos, embora o esposo quisesse, mas não a esposa e, então, esta, investida no posto de voz lírica do poema, apresenta-nos reflexões sobre o tema, agora que falecido o consorte: o filho não havido transmutou-se na dor do sofrimento, nas memórias que perduram, tecidas e retecidas, e num quadro de insônias.

Um filho representa a continuidade da vida, como também a aspiração de que não sejamos olvidados com o correr do tempo. E é à luz dessa segunda perspectiva que a poetisa deixa gravados em versos, ao correr da pena – e para toda a eternidade –, o modo de ser do falecido amado, para que o mundo conheça da realização de seus “mais vastos desejos”.

J.A.R. – H.C.

 

Lya Luft

(n. 1938)

 

Nunca tivemos filhos juntos

 

Nunca tivemos filhos juntos, e ele reclamava:

“Nosso amor merecia um filho ao menos.”

 

Nosso filho é a minha dor de hoje,

é a fulguração que nos deixava tontos,

é o novelo da memória que teço e reteço

nas minhas insônias.

 

Nosso filho é o meu tempo de agora

para falar do meu amado:

da sua força e sua fragilidade,

da sua indignação e seus prantos,

de sua necessidade de ser amado e aceito

como finalmente deve estar sendo, por inteiro,

na realização de todos os seus vastos desejos.

 

Pai e Filho

(Andre Kohn: pintor russo)


Referência:

LUFT, Lya. Nunca tivemos filhos juntos. In: __________. O lado fatal. 5. ed. São Paulo, SP: Siciliano, 1993. p. 53.

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