Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

Czeslaw Milosz - Depois da penitência

Partindo da ideia de “apokatastasis”, elaborada pelo teólogo cristão Orígenes (185 d.C. – 254 d.C.) e fundamentada no conceito de salvação universal, Milosz busca, por intermédio deste poema, desvendar as conexões de tal abstração às mais recentes teorias da mecânica quântica, de modo a revelar possíveis conexões entre ciência e religião.

Nada obstante, observa-se que o poeta procura distanciar-se das querelas racionais meramente especulativas, bem assim do discurso pseudocientífico, isto porque, muito provavelmente, é cético quanto ao poder que temos para, um dia, virmos a quebrar o código do mistério do destino humano após a morte.

Entrementes, Milosz atém-se a repetir, não sem alguma ironia, a súplica por uma vida eterna – assim como o fazem os fiéis numa igreja de aldeia –, sem exatamente saber ou entender quem será, quando vier a acordar depois do estágio de penitência advogado pela escatologia cristã.

J.A.R. – H.C.

Czeslaw Milosz

(1911-2004)

 

Po odcierpieniu

 

Hipoteza zmartwychwstania,

Którą pewien uczony wywiódł z mechaniki kwantowej,

Przewiduje powrót do bliskich nam miejsc i ludzi

Za miliard albo dwa miliardy ziemskich lat

(Co w pozaczasie równa się jednej chwili).

Rad jestem, że dożyłem spełnienia się przepowiedni

O możliwym aliansie religii i nauki,

Którą przygotowali Einstein, Planck i Bohr.

Nie biorę zbyt poważnie naukowych fantazji,

Mimo że respektuję wzory i wykresy.

To samo ujął krócej Piotr Apostoł,

Mówiąc: A p o k a t a s t a s i s  p a n t o n ,

Odnowienie wszechrzeczy.

Jednakże to pomaga: móc sobie wyobrazić,

Że każda osoba ma kod zamiast życia

W przechowalni na wieczność, nadkomputerze

wszechświata.

Rozpadamy się w zgniliznę, proch, mikronawozy,

Ale zostaje já szyfr czyli esencja,

I czeka, aż nareszcie obleka się w ciało.

Jak również, skoro ta nowa cielesność

Powinna być obmyta ze zła i choroby,

Idea Czyśćca ma udział w równaniu.

Nie co innego wierni w wiejskim kościele

Chóralnie powtarzają, prosząc o żywot wieczny.

I já z nimi. Nie rozumiejący

Kim będę, kiedy zbudzę się po odcierpieniu.

 

(1994)

 

Vida e Morte

(Mark Moore: pintor norte-americano)

 

Depois da penitência

 

A hipótese da ressurreição,

Que um cientista deduziu da mecânica quântica,

Prevê o retorno aos lugares e pessoas de que gostamos

Em um ou dois bilhões de anos terrenos

(O que no além-do-tempo é igual a um instante).

Estou contente por estar vivo quando se cumpre a profecia

Sobre a possível aliança entre a ciência e a religião,

Preparada por Einstein, Planck e Bohr.

Não levo muito a sério as fantasias científicas,

Embora respeite as fórmulas e gráficos.

Pedro Apóstolo foi mais conciso

Dizendo: A p o k a t a s t a s i s  p a n t o n ,

A renovação de todas as coisas.

Porém isso ajuda: poder imaginar

Que cada um de nós, em vez da vida, tem um código

Guardado num depósito para a eternidade,

o supercomputador do universo.

Nos desmanchamos em podridão, cinzas, microadubo,

Mas aquela cifra, ou seja, a essência, permanece

E espera, até que por fim se reveste de corpo.

E se esta nova corporeidade

Precisa ser lavada do mal e da doença,

A ideia do Purgatório também entra na equação.

Não é outra coisa que os fiéis numa igreja de aldeia

Repetem em coro, pedindo a vida eterna.

E eu com eles. Sem entender

Quem serei, quando acordar depois da penitência.

 

(1994)


Referência:

MILOSZ, Czeslaw. Po odcierpieniu / Depois da penitência. Tradução de Henryk Siewierski e Marcelo Paiva de Souza. In: __________. Não mais. Seleção, tradução e introdução de Henryk Siewierski e Marcelo Paiva de Souza. Brasília, DF: Editora da UnB, 2003. Em polonês: p. 92 e 94; em português: p. 93 e 95. (Coletânea ‘Poetas do Mundo’)

Nenhum comentário:

Postar um comentário