Longe das agruras vivenciadas pelas levas de pessoas – muitas crianças entre elas – que foram arrastadas pelos alemães ao campo de concentração de Auschwitz (PL), o poeta usufruiu de uma infância aparentemente feliz, junto à natureza, ainda que exposto a algumas limitações, em razão da pouquidade de recursos financeiros.
Ele o revela neste poema-narrativa, julgando-se um privilegiado de seu tempo, haja vista que a precitada infância foi, em grande parte, contemporânea a um período da História considerado como um dos mais destrutores, vale dizer, o da quadra referente à 2GM, que provocou perdas de 60 a 70 milhões de vidas.
J.A.R. – H.C.
Fayad Jamís
(1930-1988)
Auschwitz no fue el jardin de mi
infancia
A Otto Fernández
Auschwitz no fue el jardín de mi infancia. Yo crecí
entre bestias y yerbas, y en mi casa
la pobreza encendía su candil en las noches.
Los árboles se cargaban de nidos y de estrellas,
por los caminos pasaba asustándose una yegua muy
blanca.
Auschwitz no fue el jardín de mi infancia. Sólo
puedo
recordar el sacrificio de las lagartijas,
el fuego oscuro del hogar en las noches de viento,
las muchachas bañando sus risas en el río,
la camisa sudada de mi padre, y el miedo
ante el brutal aullido de las aguas.
Auschwitz no fue el jardín de mi infancia, comí caramelos
y lágrimas, en mi avión de madera conquisté
nubes de hierba y no de piel humana.
Soy un privilegiado de este tiempo, crecí bajo la
luz
violenta de mi tierra, nadie me obligó a andar
a cuatro patas, y cuando me preguntan mi nombre
un rayo parte la sombra de una guásima.
De: “La pedrada” (1981)
Crianças em um restolho
(Antonio López Torres: pintor espanhol)
Auschwitz não foi o jardim de minha
infância
A Otto Fernández
Auschwitz não foi o jardim de minha infância. Eu
cresci
entre bestas e ervas, e em minha casa
a pobreza acendia seu candeeiro de noite.
As árvores se enchiam de ninhos e de estrelas,
pelos caminhos, assustando-se, passava uma égua
muito branca.
Auschwitz não foi o jardim de minha infância. Só
posso
recordar o sacrifício das lagartixas,
o fogo escuro do lar nas noites de vento,
as mocinhas banhando seus risos no rio,
a camisa suada de meu pai, e o medo
diante do brutal uivo das águas.
Auschwitz não foi o jardim de minha infância,
chupei balas
e lágrimas, em meu avião de madeira conquistei
nuvens de capim e não de pele humana.
Sou um privilegiado deste tempo, cresci sob a
luz violenta de minha terra, ninguém me obrigou a
andar
de quatro, e quando me perguntam meu nome
um raio parte a sombra de uma guásima. (*)
De: “A pedrada” (1981)
Nota dos tradutores:
(*) Guásima - árvore típica do campo cubano.
Referência:
JAMÍS, Fayad. Auschwitz no fue el jardin de mi infância / Auschwitz
não foi o jardim de minha infância. Tradução de Ali Garcia Diniz e Luizete
Guimarães Barros. In: LEMUS, Virgilio López (Seleção, prefácio e notas). Vinte
poetas cubanos do século XX. Edição bilíngue. Tradução de Ali Garcia Diniz
e Luizete Guimarães Barros. Florianópolis (SC): Ed. da UFSC, 1994. Em espanhol:
p. 246; em português: p. 247.
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