Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 27 de agosto de 2020

Léon-Paul Fargue - Quiosques

As imagens que se expressam nos versos do poema levam-nos à beira-mar, onde um aparente contratempo na relação entre o falante e a sua musa pode ser identificado na amarga lágrima que um dia foi ele obrigado a “beber” − salgada como as águas do mar −, tudo porque ela não se deixa enredar pelo avanço das marés que lhe vêm bater nos pés.

E então surge uma oportuna medusa para desvendar as razões do choro da moça, a representar na areia os três casos de semelhança de triângulos, a saber, ângulo x ângulo; lado x lado x lado e lado x ângulo x lado. E o que haveria em conexão com o poema nessa referência matemática? Apesar de a musa pretender reforçar os padrões de sua parecença ao parceiro, encontra-se esta num equilíbrio instável, suscetível de ser passada a fio de espada pelas águas da vida...

J.A.R. – H.C.

Léon-Paul Fargue
(1876-1957)

Kiosques

En vain la mer fait le voyage
Du fond de l’horizon pour baiser tes pieds sages,
Tu les retires
Toujours à temps.

Tu te tais, je ne dis rien.
Nous n’en pensons pas plus, peut-être.
Mais les lucioles de proche en proche
Ont tiré leur lampe de poche
Tout exprès pour faire briller
Sur tes yeux calmes cette larme
Que je fus un jour obligé de boire.
La mer est bien assez salée.

Puis une méduse blonde et bleue
Qui veut s’instruire en s’attristant
Traverse les étages bondés de la mer,
Nette et claire comme un ascenseur,
Et décoiffe sa lampe à fleur d’eau
Pour te voir feindre sur le sable
Avec ton ombrelle, en pleurant,
Les trois cas d’égalité des triangles.

Vista do Parque Montsouris
(Henri Rousseau: pintor francês)

Quiosques

Em vão o mar faz a viagem
Do fundo do horizonte para beijar teus pés prudentes:
Tu os retiras
Sempre a tempo.

Calas-te, eu não digo nada.
Talvez nem pensemos mais nisso.
Mas os vagalumes, pouco a pouco,
Sacam suas lanternas de bolso
Expressamente para fazer brilhar
Em teus olhos calmos essa lágrima
Que fui um dia obrigado a beber.
E o mar se torna bem salgado.

Depois, certa medusa ouro e azul,
Que quer instruir-se entristecendo-se,
Corta as lojas abarrotadas do mar,
Clara e nítida como um elevador,
E destouca sua lâmpada à flor d’água,
Para te ver, com uma sombrinha,
Chorando, representar na areia
Os três casos de igualdade dos triângulos.

Referência:

FARGUE, Léon-Paul. Kiosques / Quiosques. Tradução de Carlos Drummond de Andrade. In: ANDRADE, Carlos Drummond de. Poesia traduzida. Organização e notas de Augusto Massi e Júlio Castañon Guimarães. Introdução de Júlio Castañon Guimarães. São Paulo, SP: Cosac Naify, 2011. Em francês: p. 146; em português: p. 147. (Coleção “Ás de colete”; 20)

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