Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 15 de agosto de 2020

Kabir - Nas cerimônias do templo... [66]

Kabir censura os hábitos equivocados dos iogues, capazes de os levar às portas da morte, de mãos e pés atados: eles tingem as suas roupas, quando deveriam matizar suas mentes com as cores do amor. Por igual, sentam-se nos templos e, em vez de entrar em sintonia com o espírito de Brahma, passam a adorar uma sua representação em pedra.

Ou ainda: raspam a cabeça pelos seus mortos e, muitos deles, tornam-se eunucos em regiões distantes, matando todos os seus desejos, ou, em outro padrão, perfuram os lóbulos das orelhas, deixando as barbas e as mechas dos cabelos crescerem livremente num emaranhado, mais parecendo bodes em estado natural. Por fim, transformam-se em desenvoltos comentadores falastrões, depois que leem o Gita.

Um detalhe: Kabir nasceu em Varanasi (Benares), na Índia, e não há que se duvidar de haver presenciado aquilo que aqui descreve, pois é nessa cidade que, ainda hoje, se levam à frente os tradicionais rituais aos mortos, às margens do Ganges, rio sagrado onde os hindus, ademais, costumam lavar suas vestes. Como em outras religiões, os rituais passam a valer mais do que a busca sincera de união com o espírito do Eterno, motivo condutor para a monitória de Kabir.

J.A.R. – H.C.

Kabir
(1440-1518)

[66]

Nas cerimônias do templo,
Entregue a seus rituais meticulosos,
O crente adora um ídolo de pedra.

Nas escadarias do Ganges,
Com cabelos e barbas desgrenhados,
O asceta assemelha-se a um bode.

Na solidão árida do deserto,
Depois de matar de sede seus desejos,
O eremita transforma-se em eunuco.

No denso burburinho da cidade,
Declamando em voz alta as Escrituras,
O erudito assume o tomo do falastrão.

Kabir diz: Ó tolos! Despertais!
Estais todos diante do portal da morte,
Com as mãos e os pés atados.

Bharatmata
(Subrata Ghosh: artista indiano)

Referência:

KABIR. Poema nº 66: Nas cerimônias do templo... Tradução de José Tadeu Arantes. In: KABIR. Cem poemas. Seleção e tradução ao inglês de R. Tagore. Tradução, ensaios e notas de José Tadeu Arantes. São Paulo: Attar, 2013.

Obs.: Não há, na obra acima, quaisquer referências aos números de suas páginas, senão apenas a indexação dos poemas aos números em colchetes, apostos imediatamente acima da tradução, assim como o fazemos no topo desta postagem.

Um comentário:

  1. Uma observação com respeito à paginação da obra de onde foram extraídos os poemas acima: verifiquei, com um certo atraso, que há numeração nas páginas do livro apenas nas partes que precede os poemas (até a página 26) e que os sucede (da página 131 até 135).
    Nesse sentido, pode-se obter a página onde inserto o aludido poema, a saber: Poema nº 66 - p. 94.
    João A. Rodrigues

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