Num país que, até onde se saiba, jamais promoveu algo que, de fato, possa ser caracterizado como “reforma agrária” – e que, talvez, jamais a levará à frente –, o
que muito ainda se encontra em terras de Pindorama são latifúndios sem
destinação à produção agropecuária, ao tempo que levas de sem-terra vagam pelo
continente à procura de algum assentamento.
Enquanto isso, não se pode afirmar que os latifundiários estejam em
condições financeiras dificultosas. E mais ainda: em torrões de difícil acesso,
inúmeras são as ocorrências de submissão de labutadores rurais a trabalho
escravo, do qual dificilmente conseguem se libertar, por razões espúrias de
duvidosos endividamentos ou contrapartidas não equânimes. Quanto
aos que buscam se organizar em sindicatos – bem –, costumam ser vítimas, aqui e
ali, de execuções sumárias.
J.A.R. – H.C.
Fernando Fortes
(1936-2016)
Latifúndio
E vi um homem de
cifras
contar as pilhas de
dinheiro
por cima das tripas dos
outros homens
Eu vi o homem somar
as costelas dos outros homens
para calcular quanto
dinheiro tinha
Eu assisti à contagem
sinistra
das costelas mortas
dos homens mortos
pelo homem vivo
O homem se enfurecia:
a cada costela morta
seu lucro diminuía
Latifúndio Andaluz
(Małgorzata
Kaczmarska: artista polonesa)
Referência:
FORTES, Fernando. Latifúndio. In:
FÉLIX, Moacyr (Dir.). Poesia Viva I.
Introdução de Antônio Houaiss. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira,
1968. p. 110. (Coleção ‘Poesia Hoje’, Direção Moacyr Félix, v. 18, Série ‘Novos
Poetas do Brasil’)
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário