Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Zbigniew Herbert - A Marco Aurélio

Herbert, certamente, foi bastante inspirado pela filosofia estoica do imperador romano Marco Aurélio (121 d.C. – 180 d.C.), a ponto de dialogar imaginariamente com ele nos versos deste poema (original em polonês neste endereço), impregnados por uma linguagem que avança à crítica da situação moral e filosófica de uma nação como a sua Polônia natal, oprimida àquela altura por um regime totalitário que tentava, a todo custo, cooptar artistas e intelectuais, como o próprio poeta.

Destaque: a dedicatória do poema ao Prof. Henryk Elzenberg (1887-1967), especialista em filosofia greco-romana, deve-se à publicação de seu trabalho “Marco Aurélio: da história e da psicologia da ética”, em 1921, no qual são resgatadas as ideias do imperador para se combater o sofrimento e se valorizar a liberdade, independentemente de fatores externos adversos – àquela época muito associados às lutas dos domínios ditos “civilizados” contra os “bárbaros”, contingência decisiva para o desmoronamento “das quatro paredes do mundo”, ou melhor, do Império Romano.

J.A.R. – H.C.

Zbigniew Herbert
(1924-1998)

To Marcus Aurelius

for professor Henryk Elzenberg

Good night Marcus put out the light
and shut the book For overhead
is raised a gold alarm of stars
heaven is talking some foreign tongue
this the barbarian cry of fear
your Latin cannot understand
Terror continuous dark terror
against the fragile human land

begins to beat It’s winning Hear
its roar The unrelenting stream
of elements will drown your prose
until the world’s four walls go down
As for us? – to tremble in the air
blow in the ashes stir the ether
gnaw our fingers seek vain words
drag off the fallen shades behind us

well Marcus better hang up your peace
give me your hand across the dark
Let it tremble when the blind world beats
on senses five like a failing lyre
Traitors – universe and astronomy
reckoning of stars wisdom of grass
and your greatness too immense
and Marcus my defenceless tears

(Translated from the Polish to English
by Czeslaw Milosz and Peter Dale Scott)

Marco Aurélio
(121 d.C. – 180 d.C.)

A Marco Aurélio

para o professor Henryk Elzenberg

Boa noite Marco apaga a lâmpada
e fecha o livro Já sobre a cabeça
ergue-se o alarma argênteo das estrelas
este céu fala uma língua estrangeira
é o grito bárbaro de terror
que o teu latim desconhece
é o medo eterno o escuro medo
que contra a frágil terra humana começa

a bater E vencerá Escutas o marulho
é a preamar Demolirá tuas letras
a corrente inestancável dos elementos
até ruírem as quatro paredes do mundo
e quanto a nós – tremer ao vento
e de novo bafejar nas cinzas turvar o éter
morder os dedos buscar palavras vãs
e arrastar atrás de si a sombra dos que tombaram

então Marco melhor te despir da calma
e estender a mão pela escuridão
que trema quando percutir nos cinco sentidos
como numa lira tênue o universo cego
nos trairá o universo a astronomia
o cálculo das estrelas e a sabedoria do capim
e sua grandeza demasiadamente imensa
e meu impotente Marco choro

Referências:

Em Inglês:

HERBERT, Zbigniew. To Marcus Aurelius. Translated from the Polish to English by Czeslaw Milosz and Peter Dale Scott. In: McCLATCHY, J. D. (Ed.). The vintage book of contemporary world poetry. 1st. ed. New York, NY: Vintage Books (A Division of Random House Inc.), june 1996. p. 147.

Em Português

HERBERT, Zbigniew. A Marco Aurélio. Tradução de Piotr Kilanowski. In: KILANOWSKI, Piotr. “Queria permanecer fiel à clareza incerta...”: sobre a poesia de Zbigniew Herbert. Tese submetida ao Programa de Pós-graduação em Literatura da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC. Florianópolis, SC: Edição do autor, 2018. p. 140-141. Disponível neste endereço. Acesso em: 24 mai. 2020.

Nenhum comentário:

Postar um comentário