O poeta se pergunta sobre as razões pelas quais, no ensejo, busca
redigir algo, seguramente uma inquirição que sempre alguém há de se propor,
antes de vir a verter palavras sobre a página. E com um “pedido de desculpas”
aos eminentes leitores, fala-nos da beleza e da humanidade de pessoas que aos
outros parecem invisíveis, porque imersas na carência material – as mulheres de
cor, em especial –, com terríveis rostos e roupas desgastadas, retornando a
casa depois de um dia de árdua labuta.
Mas o falante vê beleza suficiente nesses rostos marcados pela opressão,
quando assemelha-os a velhos carvalhos florentinos. Em seguida, por confrontação,
gira a mirada para os semblantes dos “cidadãos de prol” – aqueles que estão no
comando da situação –, deles auferindo idêntico estímulo para o seu mister – “embora
não da mesma maneira” –, decerto porque, como afirma o cantor e compositor
Caetano Veloso em “Podres Poderes”, “lindos são os burgueses” – e, claro está,
são eles a principal audiência de WCW, daí a razão para o rogo de escusas no
título do poema.
J.A.R. – H.C.
William Carlos Williams
(1883-1963)
Apology
Why do I write today?
The beauty of
the terrible faces
of our nonentites
stirs me to it:
colored women
day workers –
old and experienced –
returning home at
dusk
in cast off clothing
faces like
old Florentine oak.
Also
the set pieces
of your faces stir me
–
leading citizens –
but not
in the same way.
In: “Al que quiere!” (1971)
Sem título
(Susanne Wenger:
artista austríaco-nigeriana)
Explicação
Por que eu hoje
escrevo?
A beleza das
caras terríveis
de gente nossa que
não é ninguém
me estimula a isso:
mulheres de cor
trabalhadoras
diaristas –
idosas e experientes
–
voltando à casa de
noitinha
com suas velhas
roupas
suas caras em velho
carvalho florentino.
Também
as peças bem
ajustadas
de vossas caras me
estimulam –
cidadãos de prol –
só que não
da mesma maneira.
Em: “O que quer!” (1917)
Referência:
WILLIAMS, William Carlos. Apology /
Explicação. Tradução de José Paulo Paes. In: __________. Poemas. Seleção, tradução e estudo crítico de José Paulo Paes.
Edição bilíngue. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 1987. Em inglês: p. 34;
em português: p. 35.
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