Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 6 de março de 2020

Luiz Martins Rodrigues Filho - Poética

A poética, para Rodrigues Filho, leva – ou deveria levar – a versos que não estejam empapados de sentimentalidades ou de subjetividades: seca sem ser desumana, sem estar dissociada de tudo o que seja humano, a par de quase descarnada, porque seria essa parcimônia que engendraria o que urgente se reclama.

Embora não no mesmo tropo, a ideia aproxima-se às regiões lindeiras de outras tantas que advogam a desventura como motivo condutor não só para a poética, quanto para toda a literatura. Mas o fato é que há poemas meritórios oriundos de tudo quanto é tendência: o que releva é não estar morta a poesia!

J.A.R. – H.C.

Luiz Martins Rodrigues Filho
(1923-2001)

Poética

seco como uma paisagem sem bosques densos
seco como um osso a que não adira tecido enxundioso
seco como um rosto não lavrado pelas lágrimas
seco como uma lâmina de encontro a outra lâmina
seco como uma vida a que não chegue o apelo fácil
do sentimentalismo
seco como uma semente que, guardando em si todo
um mundo, aparenta ser oca
seco como um ser que, tendo em si tanta energia
latejando, parece descarnado
seco como o que é seco ou tem a aparência rude
do seco
mas apesar disso tudo não se divorcia do homem
seco sem ser desumano sem ser miserável e abjeto
seco do seco mais humano possível.

(1972)

À borda da floresta de Fontainebleau:
pôr do sol
(Théodore Rousseau: pintor francês)

Referência:

RODRIGUES FILHO, Luiz Martins. Poética. In: __________. Suor do tempo: 1946-1979. São Paulo, SP: Canton, [1979?]. p. 60.

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