Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Múcio Teixeira - O Karma

A obra de onde extraí o poema de hoje talvez seja uma referência para os que acreditam em vivências sequentes sobre a terra, para purgar o espírito de todas as forças maléficas, assim como propugna, v.g., o Hinduísmo, o Budismo ou mesmo o Espiritismo.

Veja-se que o poema de Múcio torna manifesta a ideia de que a vivência presente é afetada pelas experiências de vidas passadas, numa relação de causa e efeito para as ações que sejam adotadas com boas ou más intenções, cenário esse que comporta iniludíveis especulações éticas.

J.A.R. – H.C.

Múcio Teixeira
(1857-1926)

O Karma

A Natureza não pode escravizar a Alma
que obtém o Poder por meio da Sabedoria,
e em ambos emprega a Lei do Karma, que
nos conduz à Verdade.
(Helena Blavatski)

O Deus da Teosofia
Não é esse das seitas religiosas,
Que dorme noite e dia
Nas áreas luminosas
Das antigas mesquitas maometanas,
Ou das modernas catedrais romanas.

Força motriz dos múltiplos sistemas
Que dirigem os vultos planetários,
É a vibração, que despedaça algemas
Na eterna irradiação dos Setenários.

Essência pura, primordial, divina,
Desce do Todo à simples unidade;
E, se a matéria anima,
Volta de novo à espiritualidade.

E tanto impele as simples criaturas
Como equilibra os astros no infinito,
Por leis evolutivas e seguras
Do seu poder universal prescrito.

Pois bem: nós somos parte desse Todo;
Não o verme do lodo,
Mas a faísca que partiu da chama
Que este Universo inflama,
Semeando na amplidão as nebulosas
Entre as constelações mais radiosas,
E os errantes cometas solitários
Que fogem sempre aos corpos planetários.

Mas no eterno vaivém das existências,
Restritas da matéria às contingências,
Desde que o livre arbítrio nos foi dado,
Temos em nossa mão o próprio fado.

A lei que determina a recompensa
Dos males e dos bens que praticamos,
A lei de causa e efeito, que aplicamos,
Por lógica permuta
De princípios inatos,
É também aplicada aos nossos atos,
Desde que o homem sente, e quer, e pensa,
E pode, e executa.

O homem é senhor do seu destino;
Mas já que tem tamanha liberdade,
Não deve se queixar do Ser Divino,
Nem recuar ante a Fatalidade.

Se o raciocínio é arma,
De que até nos servimos contra a crença,
Já foi lavrada Além nossa sentença,
Temos de obedecer à lei do Karma.

O que semeia o mal nesta existência,
Na seguinte existência há de expiá-lo;
Assim como o que nós hoje sofremos
É o castigo do mal que praticamos
Na vida já vivida
Neste mesmo planeta, onde ora estamos,
Ou em outra qualquer região perdida
Na multiplicidade das estrelas
Que povoam o azul do Firmamento,
Pois não foram criadas, todas elas,
Para estar em inútil movimento.

Os rápidos prazeres e alegrias
Que embalam nossos dias,
Já são as recompensas merecidas
Do bem que semeamos noutras vidas.

Quanto ao céu e o inferno, de que falam
As velhas escrituras,
São coisas que afinal já não abalam
As consciências seguras:
Por cinquenta ou noventa anos de vida
Na terra pervertida,
Lentas penas não há de
Penar a alma em toda a Eternidade.

A lei de causa e efeito
Sabiamente aplicada às nossas dores,
Como castigo ao mal que temos feito,
E às nossas alegrias
Premiando, com o bem, o bem perfeito,
É a corrente que enlaça os nossos dias
Desde a série das vidas anteriores
Até as mais remotas existências,
Nesses núcleos solares, onde as flores
Têm alma, e as almas – divinais essências.

Livro Primeiro: Contemplação e Crença
Rio, 1909.

Senhores do Karma
(Gisela Fabian: pintora germano-americana)

Referência:

TEIXEIRA, Múcio. O karma. In: __________. Terra incógnita: poema. São Paulo, SP: Casa Duprat Editora, 1916. p. 139-143.

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