Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Heinrich Heine - Morfina

Cheio de conotações simbólicas, este poema de Heine coloca frente a frente a morte – o irmão severo e pálido – e o sono – seu terno irmão. Diz ele que o sono é bom, mas o sono eterno – pós-morte – é melhor, embora o ideal fosse nunca ter nascido!

Algo niilista o rapaz, não? Temos aí um sinal de fuga à realidade? Ou será que Heine apenas estava passando por um circunstancial estado depressivo, e o poema não passaria de um embate entre o espírito de sobrevivência e a dor lancinante do mundo que o corrói?!

J.A.R. – H.C.

Heinrich Heine
Pintura de Moritz Daniel Oppenheim
(1797-1856)

Morphine

Groß ist die Ähnlichkeit der beiden schönen
Jünglingsgestalten, ob der eine gleich
Viel blässer als der andre, auch viel strenger,
Fast möcht’ ich sagen viel vornehmer aussieht
Als jener andre, welcher mich vertraulich
In seine Arme schloß – Wie lieblich sanft
War dann sein Lächeln und sein Blick wie selig!
Dann mocht’ es wohl geschehn, daß seines Hauptes
Mohnblumenkranz auch meine Stirn berührte
Und seltsam duftend allen Schmerz verscheuchte
Aus meiner Seel’ – Doch solche Linderung,
Sie dauert kurze Zeit; genesen gänzlich
Kann ich nur dann, wenn seine Fackel senkt
Der andre Bruder, der so ernst und bleich. –
Gut ist der Schlaf, der Tod ist besser – freilich
Das beste wäre, nie geboren sein.

Duas Figuras
(Pablo Picasso: pintor espanhol)

Morfina

É grande a semelhança desses dois
jovens e belos vultos, muito embora
um pareça mais pálido e severo
ou, posso até dizer, bem mais distinto
do que o outro, o que, terno, me abraçava.
Havia em seu sorriso tanto afeto,
carinho e, nos seus olhos, tanta paz!
Ornada de papoulas, sua fronte
tocava a minha, às vezes – e seu raro
odor me dissipava a dor do espírito.
Tal alívio, porém, não dura. Eu só
hei de curar-me inteiramente quando
o irmão severo e pálido abaixar
a sua tocha. – O sono é bom; o sono
eterno, ainda melhor; mas certamente
o ideal seria nunca ter nascido.

Referência:

HEINE, Henrich. Morphine / Morfina. Tradução de Nelson Ascher. In: ASCHER, Nelson (Tradução e Organização). Poesia alheia: 124 poemas traduzidos. Edição bilíngue. Rio de Janeiro, RJ: Imago, 1998. Em alemão: p. 276; em português: p. 277. (Coleção “Lazuli”)

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