Cheio de conotações simbólicas, este poema de Heine coloca frente a
frente a morte – o irmão severo e pálido – e o sono – seu terno irmão. Diz ele
que o sono é bom, mas o sono eterno – pós-morte – é melhor, embora o ideal fosse
nunca ter nascido!
Algo niilista o rapaz, não? Temos aí um sinal de fuga à realidade? Ou
será que Heine apenas estava passando por um circunstancial estado depressivo,
e o poema não passaria de um embate entre o espírito de sobrevivência e a dor
lancinante do mundo que o corrói?!
J.A.R. – H.C.
Heinrich Heine
Pintura de Moritz
Daniel Oppenheim
(1797-1856)
Morphine
Groß ist die
Ähnlichkeit der beiden schönen
Jünglingsgestalten,
ob der eine gleich
Viel blässer als der
andre, auch viel strenger,
Fast möcht’ ich sagen
viel vornehmer aussieht
Als jener andre,
welcher mich vertraulich
In seine Arme schloß –
Wie lieblich sanft
War dann sein Lächeln
und sein Blick wie selig!
Dann mocht’ es wohl
geschehn, daß seines Hauptes
Mohnblumenkranz auch
meine Stirn berührte
Und seltsam duftend
allen Schmerz verscheuchte
Aus meiner Seel’ –
Doch solche Linderung,
Sie dauert kurze
Zeit; genesen gänzlich
Kann ich nur dann,
wenn seine Fackel senkt
Der andre Bruder, der
so ernst und bleich. –
Gut ist der Schlaf,
der Tod ist besser – freilich
Das beste wäre, nie
geboren sein.
Duas Figuras
(Pablo Picasso:
pintor espanhol)
Morfina
É grande a semelhança
desses dois
jovens e belos
vultos, muito embora
um pareça mais pálido
e severo
ou, posso até dizer,
bem mais distinto
do que o outro, o
que, terno, me abraçava.
Havia em seu sorriso
tanto afeto,
carinho e, nos seus
olhos, tanta paz!
Ornada de papoulas,
sua fronte
tocava a minha, às
vezes – e seu raro
odor me dissipava a
dor do espírito.
Tal alívio, porém,
não dura. Eu só
hei de curar-me
inteiramente quando
o irmão severo e
pálido abaixar
a sua tocha. – O sono
é bom; o sono
eterno, ainda melhor;
mas certamente
o ideal seria nunca
ter nascido.
Referência:
HEINE, Henrich. Morphine / Morfina.
Tradução de Nelson Ascher. In: ASCHER, Nelson (Tradução e Organização). Poesia alheia: 124 poemas traduzidos. Edição
bilíngue. Rio de Janeiro, RJ: Imago, 1998. Em alemão: p. 276; em português: p.
277. (Coleção “Lazuli”)
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