Prévert nos leva até os mistérios que dizem respeito ao trabalho do
artista – seja ele poeta, músico, pintor ou devotado a quaisquer outras artes –,
de onde resultam combinações inesperadas e surpreendentes, que não se atrelam a
convenções, tendências ou programas fixados por movimentos artísticos.
De fato, estamos num mundo mágico, onde o inanimado animado se torna, e
onde a realidade bem pode ser substituída por uma visão de sonho. Sob tal
contexto, muito tem o artista a aprender com a natureza, para expressar com
talento os seus sentimentos e emoções e ser merecidamente reconhecido.
J.A.R. – H.C.
Jacques Prévert
(1900-1977)
Pour faire le portrait d’un oiseau
Peindre d’abord une
cage
avec une porte
ouverte
peindre ensuite
quelque chose de joli
quelque chose de
simple
quelque chose de beau
quelque chose d’utile
pour l’oiseau
placer ensuite la
toile contre un arbre
dans un jardin
dans un bois
ou dans une forêt
se cacher derrière l’arbre
sans rien dire
sans bouger...
Parfois l’oiseau
arrive vite
mais il peut aussi
bien mettre de longues années
avant de se décider
Ne pas se décourager
attendre
attendre s’il le faut
pendant des années
la vitesse ou la
lenteur de l’arrivée de l’oiseau
n’ayant aucun rapport
avec la réussite du
tableau
Quand l’oiseau arrive
s’il arrive
observer le plus
profond silence
attendre que l’oiseau
entre dans la cage
et quand il est entré
fermer doucement la
porte avec le pinceau
puis
effacer un à un tous
les barreaux
en ayant soin de ne
toucher aucune des plumes de
l’oiseau
Faire ensuite le
portrait de l’arbre
en choisissant la
plus belle de ses branches
pour l’oiseau
peindre aussi le vert
feuillage et la fraîcheur du vent
la poussière du
soleil
et le bruit des bêtes
de l’herbe dans la chaleur de l’été
et puis attendre que
l’oiseau se décide à chanter
Si l’oiseau ne chante
pas
c’est mauvais signe
signe que le tableau
est mauvais
mais s’il chante c’est
bon signe
signe que vous pouvez
signer
Alors vous arrachez
tout doucement
une des plumes de l’oiseau
et vous écrivez votre
nom dans un coin du tableau.
A Gaiola do Pássaro
(Jacob Maris: pintor
holandês)
Para pintar o retrato de um pássaro
Pintar primeiro uma
gaiola
Com a sua porta
aberta
Em seguida pintar
Alguma coisa bonita
Alguma coisa simples
Alguma coisa bela
Alguma coisa útil
Para o pássaro
Pendurar em seguida a
tela numa árvore
Num jardim
Num bosque
Ou numa floresta
Se esconder atrás da
árvore
Sem falar
Sem se mover...
Às vezes o pássaro
chega logo
Mas pode acontecer
também que ele demore anos
Para se decidir
Não há que desanimar
Esperar
Esperar durante anos
se for o caso
Já que a rapidez ou
lentidão da chegada
Do pássaro não tem
nenhuma relação
Com o resultado do
quadro
Quando o pássaro
chega
Se ele chega
Guardar o mais
profundo silêncio
Esperar que o pássaro
entre na gaiola
E quando estiver
dentro
Fechar devagarinho a
porta com o pincel
Depois
Apagar uma a uma
todas as grades
Tendo o cuidado de
não tocar em nenhuma pena do
pássaro
Pintar em seguida a
figura da árvore
Escolhendo o galho
mais bonito
Para o pássaro
Pintar também o verde
das folhas e o frescor do vento
A poeira do sol
E o rumor dos insetos
no capim sob o calor do verão
E depois esperar que
o pássaro se decida a cantar
Se o pássaro não
canta
É mau sinal
Sinal de que o quadro
é mau
Mas se ele canta é
bom sinal
Sinal de que você
pode assinar
Então você arranca
delicadamente
Uma pena do pássaro
E escreve seu nome
num canto do quadro.
Referências:
Em Francês
PRÉVERT, Jacques. Pour faire le portrait
d’un oiseau. BAKER, William E. Jacques
Prévert. New York, NY: Twayne Publishers Inc., 1967. p. 153-154.
Em Português
PRÉVERT, Jacques. Para pintar um
retrato de um pássaro. Tradução de Ferreira Gullar. In: GULLAR, Ferreira
(Org.). O prazer do poema: uma
antologia pessoal. Rio de Janeiro, RJ: Edições de Janeiro, 2014. p. 122-123.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário