Um artista da palavra – o poeta mineiro Aricy Curvello –, nos propõe um poema
no qual veicula a negativa de uma expressão idiomática bastante comum entre os franceses para destacar
a fama de descortesia dos pintores, vale dizer, “bête comme un peintre”, ou em
português claro, “estúpido como um pintor”.
A referência está associada ao pintor francês Paul Cézanne (1839-1906),
que teria se recusado a “pintar como um animal”, propondo-se a recolocar a
inteligência, as ideias, as ciências, a perspectiva em contínuo contato com o
mundo natural, do qual, na noite dos tempos, partiram, mantendo, hoje ainda, a nítida missão de compreendê-lo, em especial as ciências (MARLEAU-PONTY, 1984, p. 116-117).
J.A.R. – H.C.
Aricy Curvello
(n. 1945)
Cézanne
Jamais quis pintar
como um animal
porém
na dimensão que nos
dá as coisas
repletas de reservas,
inesgotáveis:
a do mundo em sua
espessura
(não as só palavras em
discurso).
Massa sem lacuna:
um organismo de
cores.
A vibração das
aparências não é o berço das coisas.
Escrevia enquanto
pintor
o que não havia sido
pintado ainda.
(A criação do que
existe é uma tarefa infinita).
Natureza-morta com maçãs
e um vaso de prímulas
(Paul Cézanne: pintor
francês)
Referências:
CURVELLO, Aricy. Cézanne. In: GARCÍA, Xosé Lois. Antologia da poesia brasileira /
Antología de la poesía brasileña. Edición bilingüe. Santiago de
Compostela, Galiza, U.E.: Laiovento, 2001. p. 348.
MERLEAU-PONTY, Maurice. A dúvida de Cézanne (Tradução de Nélson Alfredo Aguilar). In: MERLEAU-PONTY.
São Paulo, Abril Cultural, 1984. (Col. Os Pensadores)
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