Tendo por argamassa o sedimento recolhido aos sofridos e, ao mesmo
tempo, felizes momentos de sua infância, Giovanni Pascoli, reconhecido poeta
italiano, arquiteta um lírico e sensível poema sobre as gaitas de foles, que em
sua memória, ficaram associadas à proximidade das festas natalinas.
A poesia de Pascoli navega por sentimentos nostálgicos, nos quais se
relaciona o pranto dos dias presentes à catarse mental daquelas lágrimas de
criança, lágrimas por ele adjetivadas como boas, num momento inicial da jornada
da vida, em que ainda se desconhecem as vicissitudes daquilo que chamamos ‘realidade’
ou ‘verdade’.
J.A.R. – H.C.
Giovanni Pascoli
(1855-1912)
Le Ciaramelle
Udii tra il sonno le
ciaramelle,
ho udito un suono di ninne nanne.
Ci sono in cielo tutte le stelle,
ci sono i lumi nelle
capanne.
Sono venute dai monti
oscuri
le ciaramelle senza
dir niente;
hanno destata ne’
suoi tuguri
tutta la buona povera
gente.
Ognuno è sorto dal
suo giaciglio;
accende il lume sotto
la trave;
sanno quei lumi
d’ombra e sbadiglio,
di cauti passi, di
voce grave.
Le pie luceme
brillano intorno,
là nella casa, qua su
la siepe:
sembra la terra,
prima di giomo,
un piccoletto grande presepe.
Nel cielo azzurro tutte le stelle
paion restare come in attesa;
ed ecco alzare le
ciaramelle
il loro dolce suono
di chiesa;
suono di chiesa,
suono di chiostro,
suono di casa, suono
di culla,
suono di mamma, suono
dei nostro
dolce e passato
pianger di nulla.
O ciaramelle degli
anni primi,
d’avanti il giorno,
d’avanti il vero,
or che le stelle son là sublimi,
conscie dei nostro
breve mistero;
che non ancora si
pensa ai pane,
che non ancora
sfaccende il fuoco;
prima dei grido delle
campane
fateci dunque piangere un poço.
Non piú di nulla, si
di qualcosa,
di tante cose! Ma il
cuor lo vuole,
quel pianto grande
che poi riposa,
quel gran dolore che poi non duole;
sopra le nuove pene
sue vere
vuol quei singulti
senza ragione:
sul suo martòro, sul
suo piacere,
vuol quelle antiche lagrime buone!
(Da: Canti di
Castelvecchio)
As Gaitas de Foles
Ouvi em meio ao sono
as gaitas de foles,
Escutei um som de
canções de ninar.
Lá no céu estão todas
as estrelas,
e por aqui há luzes
nas cabanas.
Estão vindo das
montanhas escuras
as gaitas de foles,
ainda silentes;
e têm despertado em
seus casebres
toda a gente boa e
pobre.
Cada qual é levantado
de seu leito;
acende o lampião sob
o barrote;
todos conhecem esses
clarões de sombra e bocejo,
de cautelosos passos,
de voz grave.
As piedosas lâmpadas
brilham à volta,
na casa acolá, aqui
sobre a sebe:
a terra se assemelha,
antes do dia,
a um pequenino grande
presépio.
No céu azul todas as
estrelas
parecem manter-se à
espera;
e aqui elevam as
gaitas de foles
o seu doce som de
igreja;
som de igreja, som de
claustro,
som de casa, som de
berço,
som de mãe, som de
nosso
suave e transato
choro por nada.
Ó gaitas de foles dos
anos primeiros,
à frente da jornada,
à frente da realidade,
agora que as estrelas
estão lá sublimes,
conscientes de nosso
breve mistério;
que ainda não se
pensa no pão,
que ainda não se
acendeu o fogo;
antes do clamor dos
sinos
deixai-nos, pois,
chorar um pouco.
Não mais por nada,
mas sim por alguma coisa,
por tantas coisas!
Mas o coração ainda anseia,
por aquele grande
pranto que depois acalma,
por aquela grande dor
que depois arrefece;
Findo o seu novo e
verdadeiro pesar
almeja ainda aqueles
soluços sem razão:
em sua aflição, em
seu prazer,
suspira por aquelas
antigas e boas lágrimas!
(De: Cantos do Castelo Velho)
Referência:
PASCOLI, Giovanni. Le ciaramelle. In: __________. Pianto di stelle: messaggi in poesia. 4. ristampa. Firenze (IT):
Giunti Gruppo Editoriale, 2005. p. 30-31.
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