Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Edgar Allan Poe – Os Sinos

Os sinos dos campanários têm forte relação com o chamamento dominical para os rituais religiosos. E o “rei dos vampiros” se compraz em tocá-los nas torres, para fazer ribombar o seu som estridente por toda a região contígua, seja na cidade seja na aldeia.

O poema “Os Sinos”, de Poe, a que diz respeito esta postagem, não está relacionado diretamente com as festividades natalinas, mas, ainda assim, com elas encontram algum vínculo, quando se sabe que são exatamente os sinos que nos convocam, por exemplo, para a Missa do Galo, celebrada à meia-noite de 24 a 25 de dezembro.

Poe se aproveita muito bem de recursos literários como a aliteração e a onomatopeia para introduzir força elocutória à sua criação, que, partindo de imagens luminosas, avança paulatinamente a tons mais sombrios, como se procurasse reprisar o lento e irreversível avançar da vida em direção ao seu remate.

J.A.R. – H.C.

“Dois anos antes da sua morte, Poe conheceu o reverendo Cotesworth P. Bronson. Reverendo Bronson foi um elocucionista, alguém que lê poesia em voz alta de um modo bastante expressivo. Ele encorajou Poe a escrever poemas que poderiam ser declamados em voz alta para uma audiência. Poe anuiu em tentar, e ‘The Bells’ foi um dos poemas que surgiram a partir da sugestão do reverendo. Não deixe de ler este poema em voz alta para que você possa ouvir como o som e os significados do poema trabalham juntos.

‘Os Sinos’ está dividido em quatro partes, e cada parte diz respeito a um conjunto diferente de sinos. Na primeira parte, ouvimos o tilintar dos sinos de prata, e nós pensamos na alegria da infância. Quando ouvimos sinos nupciais da segunda parte, pensamos em amor e esperança. Os sinos da terceira parte são brônzeos sinos de alarme, cuja vibração alerta para o perigo de fogo durante a noite. Estes sinos nos fazem pensar sobre as tragédias que a vida pode fazer irromper à medida que envelhecemos. Na parte final, ouvimos os sinos de ferro. ‘Pois em cada som saído da garganta enferrujada há um gemido!’. Que tipo de sinos você julga que eles são?” (POE, 1995, p. 23). 

Edgar Allan Poe
(1809-1849)

The Bells

I

Hear the sledges with the bells −
             Silver bells!
What a world of merriment their melody foretells!
       How they tinkle, tinkle, tinkle,
           In the icy air of night!
       While the stars that oversprinkle
       All the heavens, seem to twinkle
           With a crystalline delight;
         Keeping time, time, time,
         In a sort of Runic rhyme,
To the tintinnabulation that so musically wells
    From the bells, bells, bells, bells,
               Bells, bells, bells −
  From the jingling and the tinkling of the bells.

II

Hear the mellow wedding bells
             Golden bells!
What a world of happiness their harmony foretells!
       Through the balmy air of night
       How they ring out their delight!
           From the molten-golden notes,
               And all in tune,
           What a liquid ditty floats
    To the turtle-dove that listens, while she gloats
               On the moon!
         Oh, from out the sounding cells,
What a gush of euphony voluminously wells!
               How it swells!
               How it dwells
           On the Future! how it tells
           Of the rapture that impels
         To the swinging and the ringing
           Of the bells, bells, bells,
    Of the bells, bells, bells, bells,
               Bells, bells, bells −
  To the rhyming and the chiming of the bells!

III

Hear the loud alarum bells −
                  Brazen bells!
What tale of terror, now, their turbulency tells!
       In the startled ear of night
       How they scream out their affright!
         Too much horrified to speak,
         They can only shriek, shriek,
                  Out of tune,
In a clamorous appealing to the mercy of the fire,
In a mad expostulation with the deaf and frantic fire,
            Leaping higher, higher, higher,
            With a desperate desire,
         And a resolute endeavor
         Now − now to sit or never,
       By the side of the pale-faced moon.
            Oh, the bells, bells, bells!
            What a tale their terror tells
                  Of Despair!
       How they clang, and clash, and roar!
       What a horror they outpour
On the bosom of the palpitating air!
       Yet the ear, it fully knows,
            By the twanging,
            And the clanging,
         How the danger ebbs and flows;
       Yet, the ear distinctly tells,
         In the jangling,
         And the wrangling,
       How the danger sinks and swells,
By the sinking or the swelling in the anger of the bells −
             Of the bells −
     Of the bells, bells, bells, bells,
         Bells, bells, bells −
  In the clamour and the clangour of the bells!

IV

Hear the tolling of the bells −
               Iron bells!
What a world of solemn thought their monody compels!
       In the silence of the night,
       How we shiver with affright
  At the melancholy meaning of their tone!
         For every sound that floats
         From the rust within their throats
              Is a groan.
         And the people − ah, the people −
         They that dwell up in the steeple,
              All alone,
         And who, tolling, tolling, tolling,
            In that muffled monotone,
         Feel a glory in so rolling
            On the human heart a stone −
       They are neither man nor woman −
       They are neither brute nor human −
              They are Ghouls: −
         And their king it is who tolls;
         And he rolls, rolls, rolls, rolls,
              Rolls
            A pæan from the bells!
         And his merry bosom swells
            With the pæan of the bells!
         And he dances, and he yells;
       Keeping time, time, time,
       In a sort of Runic rhyme,
            To the pæan of the bells −
               Of the bells:
       Keeping time, time, time,
       In a sort of Runic rhyme,
            To the throbbing of the bells −
            Of the bells, bells, bells −
            To the sobbing of the bells;
       Keeping time, time, time,
            As he knells, knells, knells,
       In a happy Runic rhyme,
            To the rolling of the bells −
         Of the bells, bells, bells −
            To the tolling of the bells,
      Of the bells, bells, bells, bells −
               Bells, bells, bells –
  To the moaning and the groaning of the bells.

The Bells, Bells, Bells
(Brenda Ferguson: 2012)

Os Sinos

I

Escuta: nos renós tilintam sinos
argentinos!
Ah! que mundo de alegria o som cantante prenuncia!
Como tinem, lindo, lindo,
no ar da noite fria e bela!
Vão tinindo e o céu inteiro se constela,
florescente, refulgindo
com deleites cristalinos!
Dão ao Tempo uma cadência tão constante
como um rúnico descante,
com os tintinabulares, pequeninos sons, bem finos,
que nascendo vão dos sinos,
sim, dos sinos, sim, dos sinos,
saltitantes, bimbalhantes, dentre os sinos.

II

Escuta: em núpcias vão cantando os sinos,
áureos sinos!
Quantos mundos de ventura seu tanger nos prefigura!
No ar da noite, embalsamado,
como entoam seu enlevo abençoado!
Tons dourados, lentas notas
concordantes...
E tão límpido poema aí flutua
para as rolas que o escutam, divagantes,
vendo a lua!
Volumoso, vem das celas retumbantes
todo um jorro de eufonia
que se amplia,
“O futuro é belo e bom!”
– clama o som,
que arrebata, como em êxtases divinos,
no balanço repicante que lá soa,
que tão bem, tão bem ecoa
na vibrante voz dos sinos, sinos, sinos,
carrilhões e sinos, sinos,
no rimado, consonante som dos sinos.

III

Escuta: em longo alarma bradam sinos,
brônzeos sinos!
Ah! que história de agonia, turbulenta, se anuncia!
Treme a noite, com pavor,
quando os ouve em seu bramido assustador.
Tanto é o medo que, incapazes de falar,
se limitam a gritar,
em tons frouxos, desiguais,
clamorosos, apelando por clemência ao surdo fogo,
contendendo loucamente com o frenesi do fogo,
que se lança bem mais alto,
que em desejo audaz estua
de, no empenho resoluto de algum salto
(sim! agora ou nunca mais!),
alcançar a fronte pálida da lua!
Oh! os sinos, sinos, sinos!
De que lenda pavorosa, de alarmar,
falam tanto?
Clangorantes, ululantes, graves, finos,
quanto espanto vertem, quanto,
no fremente seio do ar!
E por eles bem a gente sabe – ouvindo
seu tinido,
seu bramido –
se o perigo é vindo ou findo.
Bem distintamente o ouvido reconhece
pela luta,
na disputa,
se o perigo morre ou cresce,
pela ampliante ou decrescente voz colérica dos sinos,
badalante voz dos sinos,
sim, dos sinos, sim, dos sinos,
do clamor e do clangor que vêm dos sinos!

IV

Escuta: dobram, lentamente, os sinos,
férreos sinos!
Ah! que mundo de pensares tão solenes põem nos ares!
Na silente noite fria,
quando a alma se arrepia
à ameaça desse canto melancólico de espanto!
Pois em cada som saído
da garganta enferrujada
há um gemido!
E os sineiros (ah! essa gente
que, habitando o campanário
solitário,
vai dobrando, badalando a redobrada
voz monótona e envolvente...),
quão ufanos ficam eles, quando vão
tombar pedras sobre o humano coração!
Nem mulher nem homem são,
nem são feras: nada mais
do que seres fantasmais.
E é seu Rei quem assim tange,
é quem tange, e dobra, e tange.
E reboa
triunfal, do sino, a loa!
E seu peito de ventura se intumesce
com os hinos funerários lá dos sinos;
dança, ulula, e bem parece
ter o Tempo num compasso tão constante
qual de rúnico descante,
pelos hinos lá dos sinos!
Ah! dos sinos!
Leva o Tempo num compasso tão constante
como em rúnico descante,
pela pulsação dos sinos,
a plangente voz dos sinos,
pelo soluçar dos sinos!
Leva o Tempo em tal compasso, tão constante,
que a dobrar se sente, ovante,
bem feliz esse rúnico descante,
com o reboar que vem dos sinos,
a gemente voz dos sinos,
o clamor que sai dos sinos,
a alucinação dos sinos,
o angustioso,
lamentoso, lutuoso som dos sinos!

Performance de Phil Ochs
para o poema de Poe
Referências:

POE, Edgar Allan. The bells. In: __________. Poetry for young people. Edited by Brod Bagert & Illustrated by Carolynn Cobleigh. New York (USA): Magnolia Editions, 1995. p. 23-26.

POE, Edgar Allan. Os sinos. In: __________. Poemas e Ensaios. Tradução de Osmar Mendes e Milton Amado. 3. ed. São Paulo: Globo, 1999. p. 64-67.

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