A compor a obra “Old
Possum’s Book of Practical Cats”, algo como “O Livro dos Gatos Práticos do
Velho Gambá”, de 1939 (um aparte: “Velho Gambá” era o cognome de Eliot), esta versão
ao português de Ivo Barroso para o poema “Mr. Mistoffelees” assume algumas
liberdades tradutórias em relação ao texto original, muito embora mantenha a
disposição gráfica dos versos sobre a página.
O bichano
“Mefisto-Félix”, um pequeno e furtivo gato preto, tem poderes de
prestidigitação, capaz de ilusionismos somente observáveis em peripécias de
grandes mágicos: se o seu nome nos leva a associá-lo a Mefistófeles – um
demônio na lenda de “Fausto” –, é melhor nos precavermos, porque ele sempre nos
faz acreditar que “passa a vida caçando ratos”.
Aliás, a combinação
“Mefisto-Félix” exibe uma solução feliz do tradutor para o nome do felino, pois
agrega ainda o designativo “Félix”, uma personagem de desenho animado, negro
com os olhos brancos, que em sua fase avançada foi dotado por seus animadores –
ora ora – com uma “bolsa mágica de truques”, tão em sintonia com a
caracterização original de Eliot para o figurante.
J.A.R. – H.C.
T. S. Eliot
(1888-1965)
Mr. Mistoffelees
You ought to know Mr.
Mistoffelees!
The Original
Conjuring Cat –
(There can be no
doubt about that).
Please listen to me
and don’t scoff. All his
Inventions are off
his own bat.
There’s no such Cat
in the metropolis;
He holds all the
patent monopolies
For performing
surprising illusions
And creating
eccentric confusions.
At prestidigitation
And at legerdemain
He’ll defy
examination
And deceive you
again.
The greatest
magicians have something to learn
From Mr.
Mistoffelees’ Conjuring Turn.
Presto!
Away we go!
And we all say: OH!
Well I never!
Was there ever
A Cat so clever
As Magical Mr.
Mistoffelees!
He is quiet and
small, he is black
From his ears to the
tip of his tail;
He can creep through
the tiniest crack
He can walk on the
narrowest rail.
He can pick any card
from a pack,
He is equally cunning
with dice;
He is always
deceiving you into believing
That he’s only
hunting for mice.
He can play any trick
with a cork
Or a spoon and a bit
of fish-paste;
If you look for a
knife or a fork
And you think it is
merely misplaced –
You have seen it one
moment, and then it is gawn!
But you’ll find it
next week lying out on the lawn.
And we all say: OH!
Well I never!
Was there ever
A Cat so clever
As Magical Mr.
Mistoffelees!
His manner is vague
and aloof,
You would think there
was nobody shyer –
But his voice has
been heard on the roof
When he was curled up
the fire.
And he’s sometimes
been heard by the fire
When he was about on
the roof –
(At least we all heard
somebody who purred)
Which is
incontestable proof
Of his singular
magical powers:
And I have known the
family to call
Him in from the
garden for hours,
While he was asleep
in the hall.
And not long ago this
phenomenal Cat
Produced seven
kittens right out of a hat!
And we all say: OH!
Well I never!
Was there ever
A Cat so clever
As Magical Mr.
Mistoffelees!
O gatinho cinzento
(Michael Gutkin: pintor
norte-americano)
Míster Mistófelis
Precisas conhecer Míster
Mistófelis!
Um misto de Felino e
de Mefisto –
(Dúvida alguma sobre
sobre isto!)
Que zombem, mas não
posso numa estrofe lhes
Dizer o que dele
tenho visto.
Informa-se em
alquímicos in-fólios,
Tem todas as
patentes, monopólios
Para exercer performances
e truques
Que herdou de condes,
dráculas e duques.
Na prestidigitação
E nos passes que realiza,
Ilude qualquer
pesquisa
E cria nova ilusão.
Os mágicos do mundo
inteiro estimam-no
Por ser de todos o
maior prestímano.
Um, dois e três!
E era uma vez!
Vejam vocês!
Digo e estou certo:
Ninguém decerto
Chegou nem perto
Do Gato Mago Mefisto-Félix!
Ele é pequeno e
quieto, a cor é preta
Desde a ponta da
orelha ao rabo esguio;
Esgueira-se na mais
estreita greta
E se equilibra no
mais frágil fio.
A carta que quiser,
fácil afana
E é destro em dados,
varas de adivinhos;
Ele sempre te engana
que tem gana
De andar à caça
apenas de “peixinhos”.
Tira tudo do estofo
da casaca,
Faz milagres com a
caixa-de-surpresa;
Se um garfo lá se foi
ou falta a faca,
E achas que te
enganaste ao pôr a mesa –
O talher que inda há
pouco evaporou-se
Surge num fosso como
se osso fosse!
Vejam vocês!
Pois estou certo
Que ele é decerto
O mais desperto
O gato mago Mefisto-Félix!
Mostra um ar
vagamente alienado
Quando a sua modéstia
está em jogo...
Mas sua voz ouviu-se
do telhado
Quando foi chamuscado
pelo fogo.
E ouvimo-lo também ao
pé do fogo
Quando ele faz das
suas no telhado...
(Pelo menos na
poltrona sabemos que só ronrona)
Eis aqui o atestado
detalhado
De seu poder de
mágico inconteste:
Certa vez a família
em peso abala
A buscar no jardim
inteiro o peste
Enquanto ele dormia em
plena sala.
E fez agora aparecer,
frajola,
Sete gatinhos dentro da cartola!
Vejam vocês!
Não estou certo?
Não há decerto
Um mais esperto
Que o Gato Mago Mefisto-Félix!
Referência:
ELIOT, T. S. Mr. Mistoffelees
/ Míster Mistófelis. Tradução de Ivo Barroso. In: BARROSO, Ivo (Seleção, Tradução
e Organização). O torso e o gato: o melhor da poesia universal. Prefácio
de Antonio Houaiss. Rio de Janeiro, RJ: Record, 1991. Em inglês: p. 152, 154 e
156; em português: p. 153, 155 e 157.
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