Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 11 de março de 2024

Roberto Juarroz - Décima Segunda Poesia Vertical (2) [1991]

O poeta prescreve a interrupção “de todos os discursos, todos os esqueletos verbais”, os quais nada mais servem que para fomentar o exercício do “poder e suas sequelas”. Há que, alternativamente, sobrepor-lhes um fogo incessante para tomar conta da floresta literária, fazendo-a, então, se regenerar em outros termos, porventura – imagino – pródiga em alocuções com menos dominâncias, mais compartilhadas, centradas no imprescindível, no necessário.

 

Diz o falante que “a palavra do homem não é uma ordem”, senão o “abismo”: nessa voragem, os escaninhos da mente devem ser esvaziados da jurisdição plenipotenciária do ego, para retomar as rédeas de um estado de consciência saudável, enquanto domínio fecundante para novos referenciais linguísticos e simbólicos.

 

J.A.R. – H.C.

 

Roberto Juarroz

(1925-1995)

 

Duodécima Poesía Vertical

 

2

 

Interrumpir todos los discursos,

todos los esqueletos verbales,

e infiltrar en el corte

la llama que no cesa.

 

Empezar el discurso del incendio,

un incendio que inflame

estas rastreras chispas malolientes

que saltan porque sí,

al compás de los vientos.

 

Y entretanto sellar la incontinencia

del verbo del poder y sus secuelas.

La palabra del hombre no es un orden:

la palabra del hombre es el abismo.

 

El abismo,

que arde como un bosque:

un bosque que al arder se regenera.

 

(1991)

 

Cena de Incêndio

(Theodore Gegoux: pintor franco-canadense)

 

Décima Segunda Poesia Vertical

 

2

 

Interromper todos os discursos,

todos os esqueletos verbais

e infiltrar no corte

a chama que não cessa.

 

Começar o discurso do incêndio,

um incêndio que inflame

estas perfumadas faíscas rasteiras (*)

que saltam porque querem,

ao ritmo dos ventos.

 

E entretanto selar a incontinência

do verbo do poder e suas sequelas.

A palavra do homem não é uma ordem:

a palavra do homem é um abismo.

 

O abismo,

que arde como um bosque:

um bosque que ao arder se regenera.

 

(1991)

 

Nota:

 

(*). Apenas por um recurso linguístico à ironia se poderia compreender a tradução ao português da palavra “malolientes”, em espanhol, como “perfumadas”; isso porque, de fato, o adjetivo “maloliente” significa “fétido”, “malcheiroso”.

 

Referência:

 

JUARROZ, Roberto. Duodécima poesía vertical (2) [1991] / Décima segunda poesia vertical (2) [1991]. Tradução de Danilo Bueno. In: MENDONÇA, Vanderley (Ed.). Lira argenta: poesia em tradução. Edição bilíngue. São Paulo, SP: Selo Demônio Negro, 2017. Em espanhol: p. 144; em português: p. 145.

Nenhum comentário:

Postar um comentário